quinta-feira, 15 de outubro de 2009

PROJETO TORNA OBRIGATÓRIO EXAME PARA CONCEDER BENEFÍCIOS A PRESOS...

FONTE: *** Mariana Rios (CORREIO DA BAHIA).

Hoje, basta que um preso cumpra um sexto da pena e apresente bom comportamento carcerário, atestado pelo diretor da unidade prisional, para ser beneficiado com progressão de regime, livramento condicional, indulto ou atenuação da pena. Mas se depender do projeto de lei aprovado na quarta-feira (14) pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ), quem praticar crime hediondo, com violência ou grave ameaça e também no caso de reincidência, será submetido obrigatoriamente a um exame criminológico, além de receber acompanhamento de uma equipe multidisciplinar - psiquiatra, psicólogo e assistente social.
Desde 2003, este tipo de avaliação deixou de ser obrigatória para a concessão de benefícios - embora alguns juízes solicitem o exame para subsidiar decisões. O exame criminológico é feito para avaliar a personalidade do criminoso, sua suposta periculosidade, eventual arrependimento e a possibilidade de voltar a cometer crimes.
“O projeto de lei torna obrigatório o exame criminológico nos casos de crimes hediondos e assemelhados. Pelo projeto, bom comportamento não é razão suficiente para progressão da pena”, explicou o relator da matéria, o senador Antonio Carlos Junior (DEM-BA). Agora, o projeto de lei, de autoria da senadora Maria do Carmo Alves (DEM-SE), segue para apreciação da Câmara, já que teve decisão terminativa na comissão - ou seja, vale como decisão final do Senado.
TRAGÉDIA.
Em 2007, Gilvan Cléucio de Assis, o maníaco do shopping, foi submetido a uma avaliação psiquiátrica, para que cumprisse a condenação por estupro em regime semiaberto. A medida não evitou que ele voltasse a atacar, e apenas um dia após a saída provisória para o Dia dos Pais, matou a médica Rita de Cássia Martinez. O advogado e cunhado da médica, Carlos Martinez, comemorou a aprovação do uso do exame criminológico na CCJ. “Existia uma lacuna. A partir de 2003 aconteceu um desmonte do sistema penitenciário, para reduzir custos”, declarou.
A matéria é polêmica e divide especialistas. Para Ivete Oliveira, perita forense que assinou a avaliação psiquiátrica de Gilvan Clécio em 2007, é necessário uma avaliação criteriosa, mas não se pode garantir que o detento não vai cometer crimes novamente. “Além da avaliação, é preciso um acompanhamento integral do preso, também no pós-pena”, afirmou. Outra dificuldade apontada pela perita é a carência de pessoal qualificado e interessado em trabalhar em penitenciárias.
Já o secretário de Justiça e Direitos Humanos, Nelson Pellegrino, acha que o exame criminológico é uma “segurança a mais, mas não se pode dar garantia zero de reincidência”. O promotor da Vara de Execuções Penais, Edmundo Reis, vê com bons olhos a aprovação. “O exame é uma peça importante no processo de individualização da pena. Como acompanhamento efetivo dá para traçar o perfil”.
PSICÓLOGOS SÃO CONTRA O EXAME.
Além do Conselho Federal de Psicologia, que recolheu assinaturas para uma moção de repúdio contra o exame criminológico, profissionais da área de execução penal também se colocam contrários à obrigatoriedade do exame. “A medida agride os direitos fundamentais do preso. É reflexo do sensacionalismo e da cultura de repressão a todo custo. Se presume que ele é culpado. A única consequência é o atraso dos processos”, rebateu o defensor público Rafson Ximenes.
Para quem trabalha com o detento, a situação também é desconfortável. Para a conselheira da comissão de ética do Conselho Regional de Psicologia não cabe ao psicólogo avaliar possibilidade de um preso voltar a cometer crimes. “Este não é o lugar do psicólogo. Nossa proposta é mais ampla, com assistência psicossocial”.
JUÍZA DE EXECUÇÕES PENAIS DEFENDE AVALIAÇÃO COMPLETA.
A juíza da Vara de Execuções Penais, Andreamara dos Santos, explicou que desde 2003, quando foi suprimido da legislação, já existia dificuldades para a elaboração de exames criminológicos. “Não havia estrutura nos estabelecimentos prisionais para realizar a avaliação, o que acaba implicando na não concretização da medida”, explicou.
Para a juíza, além da realização de exames, o Estado precisa oferecer estrutura e ter profissionais capacitados para uma avaliação completa, com visita, além da garantia da elaboração de um plano individualizado de execução penal. “Não é só com lei que se resolve. O que pode acontecer é que a obrigatoriedade pode ser um artifício para suspender a concessão dos benefícios para todos. Ou seja, criar obstáculo para um direito”, defendeu.

*** Notícia publicada na edição impressa do dia 15/10/2009 do CORREIO.

Nenhum comentário:

Postar um comentário