terça-feira, 6 de outubro de 2009

UM SONHO MEDONHO...

FONTE: Janio Lopo (TRIBUNA DA BAHIA).

Tinha cá pra mim que agora sim eu vivia enfim um grande... Pesadelo! Foi um sonho medonho desses que às vezes a gente sonha e baba na fronha e se urina todo e quer sufocar. Sonhei com a realização da Copa do Mundo no Brasil em 2014 e agora com as Olimpíadas no Rio de Janeiro, dois anos depois. Só faltei sonhar que tinha ganhado o milhar e gritado: Etelvina, não vou mais trabalhar! Dias de azar esses meus. No sonho, amigos, inclusive jornalistas, falavam das maravilhas da Copa de 2014. O País seria outro. Salvador, em particular, passaria por transformações jamais vistas. Teríamos um trânsito desafogado, pistas livres, um centro esportivo de primeiro mundo e uma Fonte Nova novíssima. Os pedintes e pivetes seriam mandados para bem longe. Talvez para a Estrada Velha do Aeroporto, onde os visitantes sequer saberão que existe ou para algum município vizinho.
O governo fala em gastar bilhões. Vai ter dinheiro saindo pelo ladrão – essa parte eu gostei, embora de tanto realismo quase acabasse despertando. Até o metrô estará nos trilhos. Funcionando a vento em popa. Adeus buracos, adeus pobreza. Vai ter mais emprego do que gente disposta a trabalhar. Entretanto, só o pessoal qualificado terá vez. Vão sobrar algumas centenas de pé rapados para servirem o cafezinho e varrer o chão e essas coisas menores. No sonho, até a seleção brasileira de Dunga dava o prazer de sua graça em solo baiano. Vinha disputar a final aqui com Honduras (o sonho é meu e por isso tenho o direito de conceber a final que bem entender). Isso para compensar as trapalhadas brasileiras de hoje no minúsculo país da América Central. Aqui se faz aqui se paga, lembram?
Havia algo errado no meu sonho. Lula já estava no seu terceiro mandato consecutivo. Mas sonho é assim mesmo. Nunca tem nexo. Daí não ter ligado nem um pouco ao saber, também no sonho, que persistiam as brigas pelo governo baiano entre Jaques Wagner, Geddel Vieira Lima e Paulo Souto. Tinha uns fantasmas a rondar a cabeça deles. E a minha. Dava para ver até o seu formato humano. Como morro de medo de espectros, prefiro não comentar. Contudo, mais vibrantes e fascinantes que a Copa de 2014, que acabou sendo conquistada pelos irmãos hondurenhos, foi o aparecimento, em segundos, na minha mente, dos preparativos para as Olimpíadas. Saímos de 2014 e entramos em 2016 de uma hora para a outra. Lula lá gastou inclusive do próprio bolso para fazer bonito.
Quase R$ 30 bilhões em modernos equipamentos viários, segurança, habitação. Finalmente até o morro teve vez e todo o Rio de Janeiro cantou. Houve algumas trapalhadas na abertura dos jogos, mas o brasileiro imediatamente soube dar seu jeitinho. Nada que nos envergonhasse perante o mundo. Os marginais ficaram quietos, apesar de elevar o preço do pedágio para as visitas dos gringos aos bolsões de miséria cariocas, com direito, até mesmo, de rajadas de festim, muita maconha, cocaína e orgias sexuais, tudo sob o olhar indiferente dos homens da lei.O sonho era tão real que pedi a Deus para permanecer indefinidamente deixado só mirando as cenas inusitadas. Mas, assim como a Banda, meu sonho também passou. E aí, pude observar cada qual no seu canto e em cada canto uma dor, depois da banda e das olimpíadas passarem. A favela voltou ao normal, os assassinatos de inocentes voltaram à sua regularidade, o ensino público que nunca foi dos melhores afundou-se completamente e os hospitais, por falta de médicos e de equipamentos, acumulavam cadáveres nas macas imundas (quando havia macas). Restou um tremendo elefante branco e a leve recordação que todos partiram para seus países e já foram tarde. Tivemos 30 dias de glória (60 dias contando com a Copa). Talvez daqui a 300 anos possam bater no peito e dizer em alto e bom som que este país um dia vai ter jeito. Acordei alucinado. O estrago já estava feito.

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