quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

DIREITOS x HUMANOS: SÓ DESRESPEITO...

FONTE: Nelson Rocha (TRIBUNA DA BAHIA).

Cena nº 1 de consideração dos Direitos Humanos: Pequena cidade de Maiquinique, localizada a 660 km de Salvador, final da tarde. O servidor público Odair José de Oliveira Santos, 36, mata a ex-mulher, Débora Santos Filho, 19 anos, e o filho do casal, de apenas 6 meses, batendo com as cabeças das vítimas no banheiro de um imóvel. Depois tenta o suicídio ingerindo chumbinho. O criminoso vai parar na emergência onde confessa o crime para uma funcionária da unidade de saúde. A revelação rapidamente ganha as ruas e provoca a fúria da população, que invade o hospital e arrasta Odair para a rua, onde ele é apedrejado, espancado e queimado vivo.
Cena de nº 2: É noite e Hércules Santos Silva, 22 anos, está num bar em Simões Filho, município da Região Metropolitana de Salvador. Homens armados adentram o recinto e atiram contra Hércules que morre na hora. Ele não tinha passagens pela polícia, mas, provavelmente, dívidas por consumo de drogas. Cena de nº 3: A menor L.L.C.A., de 13 anos, filha de um professor de educação física, é mantida em cárcere privado por dois policiais militares, suspeitos de abuso sexual.
Diariamente os jornais estampam nas páginas policiais, inúmeros casos de violência que ferem literalmente os princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Organização das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. Mas, apesar de completar hoje 61 anos, a carta magna das relações sociais é diariamente desrespeitada. Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo, as três cenas narradas à cima, como tantas outras de violência, são atos de desrespeito aos artigos III (Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal) e V, (Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento cruel, desumano ou degradante), da Declaração. Para a juíza Andremara dos Santos, da Vara de Execuções Penais de Salvador, as cenas descritas na abertura desta matéria caracterizam violação aos Direitos Humanos e a passagem 61º aniversário da Declaração Universal é importante porque “esse consenso das nações, que ao menos haja uma plataforma mínima de direitos, tem de ser preservada e defendida”. Ela identifica a realidade de hoje, do ponto de vista do estado, com sinais de melhoras graças ao comprometimento e o trabalho desenvolvido pelos órgãos envolvidos com a segurança pública, entretanto observa ser “uma excrescência que o próprio estado tenha cárceres que não desejaríamos nem para animais. Do ponto de vista humano é sempre bom celebrar os avanços, ainda que tímidos”, declarou.
NADA PODE SER MAIS AMPLO E UNIVERSAL.
Augusto de Paula considera que “não existe nada mais amplo e universal do que os próprios Direitos Humanos, que implica desde o direito à saúde, educação e habitação, às preferências sexuais e religiosas e ao direito mais simples que o do cidadão poder ir e vir. Hoje, infelizmente, a discussão está restringida à violência praticada pelo Estado através da polícia. Do simples cidadão à determinados países, inclusive grandes potências, não há um respeito à declaração universal. Mas a luta é pra que acabe-se com violência e nesse sentido a carta é legítima”, concluiu. A Assembleia Geral da ONU proclamou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, comprometidas em promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional. Segundo o Guinness Book, o livro dos recordes, a Declaração Universal dos Direitos Humanos é o documento traduzido no maior número de línguas, 337 em 2008. Entretanto, em Maio deste ano, o site oficial da Declaração dava conta da existência de 360 traduções disponíveis.
DELEGACIAS ABARROTADAS.
O delegado de polícia Adailton Adan, titular da 11ª delegacia, também concorda que são registrados parcos progressos com relação aos Direitos Humanos. “ Temos avanços, mas ainda bem aquém do aceitável. As delegacias estão abarrotadas de presos. Numa cela pra cinco têm 15 que necessitariam estar em local adequado, com garantia do mínimo de dignidade. Falta a assistência do Estado”, ressaltou. Ele concorda que os atos de violência destacados à cima vão de encontro à Declaração dos Direitos Humanos e enfatiza que “existem muitos outros” e cita o lixo, esgoto à céu aberto e a fome como exemplos.
“O enfoque social é muito mais abrangente, se formos verificar os aspectos não só pelo lado da criminalidade, mas também com relação às necessidades básicas. Porém, acho que, no plano pessoal, a tendência é haver um respeito maior de cidadão pra cidadão”, comentou. “O fato de a declaração existir é um norte que dá pra todas as pessoas. Houve um avanço, mas falta prática. Sem a carta seria bem pior”, opina a experiente jornalista Jaciara Santos. Ela participou recentemente de uma mesa redonda sobre o tema “Mídia, Violência Urbana e Direitos Humanos – Todos os Humanos Têm Direito?.” Existe uma retórica muito grande. É bonito falar sobre Direitos Humanos, mas no dia-a-dia não vemos o respeito. Os direitos humanos estão ligados à cidadania, mas a carta continua no papel. De qualquer forma, o fato de se discutir circunstancialmente é um avanço."
Jaciara observa que os jornalistas também cometem garfes com relação aos Direitos Humanos, quando expõem presos e policiais à opinião pública, sem que estes tenham sido condenados.

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