sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

A COMPLICADA QUEDA DE UM DITADOR...

FONTE: Ivan de Carvalho, TRIBUNA DA BAHIA.
Em política, poucas coisas são tão gratificantes quanto a queda de um ditador. Isto não elimina o fato de que política é uma coisa muito complicada nem a possibilidade do que, intrinsecamente, é um acontecimento desejável, resultar, logo dobrada a esquina, em uma situação mais tormentosa ainda que a eliminada.
Pouco depois de iniciados os protestos populares no Egito contra o governo de 30 anos (mandatos sucessivos obtidos em eleições controladas) do presidente-ditador Hosni Mubarak, escrevi sobre o assunto neste espaço, assinalando que uma das hipóteses que se abriam com a possibilidade do fim da Era Mubarak seria a de que a mudança política no Egito – a mais populosa nação árabe e limítrofe de Israel, o que a torna um elemento crítico para a paz na região e no planeta – poderia resultar numa instabilidade político-militar e diplomática de grande amplitude.
E de agravamento progressivo, mas acelerado, vale a pena acrescentar agora.
No momento, o que era, quando fiz a mencionada abordagem do tema, uma possibilidade, já se tornou uma certeza – logo chegará ao fim a Era Mubarak, iniciada em seguida ao assassinato do ex-presidente egípcio Anwar Sadat, que deflagrou uma guerra contra Israel e não a venceu, mas ganhou posição na opinião pública árabe para ser capaz de assinar um acordo de paz com este país, atraindo para acordo semelhante a Jordânia (outro país essencial no conflito regional por ser também limítrofe de Israel).
A questão urgente neste momento não é quantos e quais erros (foram muitos) cometeu Mubarak no poder. Ele vai sair e a história resolverá isso algum dia, bem como julgará a importância que teve no processo de manutenção do que, tenho certeza, é um estado de paz provisória na região. Uma paz destinada a ser profunda e totalmente quebrada em futuro talvez não distante. É o resultado da rebelião, é se ela levará ao fim da paz.
Entre as muitas questões envolvidas nos acontecimentos que se desdobram agora no Egito (com os gigantescos protestos de rua e os não menos intensos conflitos entre contestadores e simpatizantes de Mubarak), duas me parecem as mais importantes. Uma, a questão dos direitos humanos, uma ferida profunda na sociedade egípcia e, aliás, não raro com muito mais intensidade, em todos os países árabes e na quase totalidade dos países, incluindo não árabes, nos quais prevalece a religião islâmica.
No Egito, as instituições islâmicas não têm responsabilidade por isto, como não tinham no Iraque e não têm na Turquia, no Cazaquistão ou mesmo no Paquistão. Mas têm tudo a ver – não a doutrina do Corão, mas as instituições que orbitam em torno dele e o interpretam à sua própria maneira e à dos seus interesses – com regimes absurdos como o que domina o Irã ou o que dominou o Afeganistão no tempo dos talibãs. E muito a ver com o que acontece na Líbia, no Sudão e em dezenas de outros países asiáticos e africanos.
A outra questão: o grande perigo que há no Egito de agora é que, depois do anúncio de Mubarak de que terminará seu mandato em setembro e não buscará outro e das garantias de seu governo de que o filho dele, Gamal, não será candidato à sucessão do pai e de que de setembro poderá até haver uma antecipação da mudança para agosto, a mobilização de oposição sinta-se forte o suficiente (já vem dando sinal dessa crença) para transformar em realidade o grito de “Mubarak, saia já”.
Então, não haveria clima para preparar uma “transição ordenada”, mas para uma revolução talvez incontrolável, na qual os manifestantes insatisfeitos com a falta de empregos, a desigualdade social e a economia decadente podem ser instrumentalizados por facções políticas e religiosas que, no poder, cuidariam de pôr em prática o que têm na cabeça – incendiar o mundo árabe e mais algumas nações islâmicas contra Israel, que, suspeita-se, tem cerca de 200 bombas nucleares.
Então...

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