FONTE: Vitor Abdala/Agência Brasil, TRIBUNA DA BAHIA.
Favela Danon, município de Nova Iguaçu, 20
de junho de 2011, Baixada Fluminense. O menino Juan Moraes voltava para casa
sem imaginar que aqueles seriam os últimos momentos de sua vida. O que
aconteceu no instante em que foi morto é nebuloso e ainda não foi totalmente
esclarecido, pois o caso ainda será julgado pelo Tribunal do Júri.
Denúncia do Ministério Público (MP), no
entanto, relata que Juan, um menino negro, de 11 anos de idade, foi morto por
policiais militares, que faziam uma operação na favela. De acordo com o MP, os
policiais atiraram na criança, pensando que ele era um traficante de drogas. Ao
perceber que tinham matado um menino desarmado, os policiais tentaram ocultar o
crime escondendo o corpo.
O crime, talvez, nunca tivesse a autoria
identificada se um irmão de Juan, ferido na ação, não sobrevivesse. Foi ele
quem relatou o desaparecimento do irmão e a tentativa dos policiais em sumir com
o corpo. Juan foi um dos 35.207 cidadãos negros assassinados no país em 2011,
segundo levantamento feito pela Agência Brasilcom base em dados do Sistema
de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde
Cruzando as informações do ministério com
dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), verifica-se
que, em 2011, a taxa de homicídios dessa população foi 35,2 por 100 mil
habitantes, taxa 9% acima do que a observada cinco anos antes, quando foram
registrados 29.925 casos, ou seja, 32,4 por 100 mil habitantes.
Ao mesmo tempo em que negros ficaram mais
vulneráveis à violência nesses cinco anos, a taxa de homicídios da população
branca caiu 13%, ao passar de 17,1 por 100 mil habitantes em 2006 (15.753 em
número absoluto) para 14,9 por mil em 2011 (13.895 casos).
O dado reflete a grande disparidade racial
que existe no Brasil, quando se trata de vítimas de assassinatos. Com o aumento
dos homicídios entre a população negra, a probabilidade de um preto ou pardo
ser vítima de assassinato no país passou a ser 2,4 vezes maior do que a de um
branco. Em 2006, a proporção era 1,9.
Mãe de um jovem negro executado em 2006 por
um grupo de extermínio, na Baixada Santista, em São Paulo, Débora Maria da
Silva não vê uma melhora na situação no país. O gari Edson Rogério Silva dos
Santos foi morto a tiros em maio de 2006, durante uma onda de ataques no estado
de São Paulo, quando saía para comprar remédio.
Para a mãe de Edson, os negros são as
maiores vítimas, porque moram nas áreas mais pobres da cidade. Segundo ela, o
Estado ainda mantém uma postura racista, mesmo 125 anos após a abolição da
escravatura no país.
“Temos que acabar com isso. Não vivemos mais
no tempo da escravatura, que se tem coronéis, capitães-do-mato e sinhozinhos.
Apesar de permanecerem as senzalas, que são as periferias, e os porões dos
navios negreiros, que são os presídios”, disse Débora, que lidera um movimento
por justiça para os assassinatos de maio de 2006.
Para o coordenador da organização não
governamental (ONG) Observatório das Favelas, Jaílson de Souza, o aumento da
taxa de homicídios de negros tem relação com a mudança geográfica dos
assassinatos no país. Nos últimos anos, enquanto o Sul e o Sudeste têm
vivenciado a redução das taxas de homicídios, o Norte e Nordeste têm visto um
aumento da violência.
Esses estados, segundo Souza, são os que
concentram as maiores populações de pretos e pardos. “Quando essa geografia da
morte muda, e há mais violência no Norte e Nordeste, essa mudança acaba por
gerar mais morte de negros, sejam pardos ou pretos. Em Alagoas, por exemplo, há
um branco para cada 20 negros”, disse.
Dos cinco estados onde o assassinato de
negros mais cresceu, quatro são do Nordeste e um no Norte. O Rio Grande do
Norte teve um crescimento de 2,7 vezes na taxa de homicídios, ao passar de 16,1
por 100 mil habitantes, em 2006, para 43,6 por 100 mil, em 2011. Na Paraíba, a
taxa dobrou, de 30,1 para 60,3 por 100 mil.
Entre os outros estados onde o crescimento
foi grande entre 2006 e 2011, estão Alagoas (de 53,9 para 90,5 por 100 mil
habitantes), o Amazonas (de 22,3 para 42 por 100 mil) e Ceará (de 17,8 para 29
por 100 mil).
Para Jaílson de Souza, o crescimento
econômico do país, sem uma mudança da estrutura social, também contribui para o
incremento da violência entre as populações mais vulneráveis. “Nosso desafio é
reconhecer que não basta o crescimento econômico, tem que ter uma política que
leve em conta o racismo, que é um elemento estrutural da desigualdade
brasileira.”
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