RIO
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Cientistas brasileiros conseguiram demonstrar que o coronavírus pode
infectar e se multiplicar nos neurônios humanos. A Covid-19 tem
sido associada a uma série de distúrbios neurológicos,
que vão desde de desorientação a encefalites, indicadores de comprometimento do
cérebro.
Estima-se que 30% dos
pacientes com Covid-19 apresentem algum tipo de sintoma no sistema nervoso. Porém, não se
sabe ainda se esses distúrbios são causados pelo ataque direto do Sars-CoV-2,
pela reação descontrolada do sistema imunológico em
resposta a ele ou às duas coisas.
O estudo com neurônios
infectados pode ajudar a responder a essa questão e a melhorar o diagnóstico e
o tratamento da Covid-19.
O grupo de Daniel
Martins-de-Souza, do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp), trabalhou com linhagens de neurônios humanos comumente
cultivadas em laboratório e também com aqueles derivados de células-tronco
pluripotentes (IPS). Esses últimos são resultado de uma colaboração com o grupo
do neurocientista Stevens Rehen, da UFRJ e do Instituto D’Or de Ensino e
Pesquisa.
O trabalho foi
realizado em apenas um mês, resultado de um projeto da força-tarefa da Unicamp,
financiada pela Fapesp, e continua em andamento.
- Estamos no início.
Mas vimos que o coronavírus não só entra como se multiplica com
facilidade nos neurônios em cultura. Nosso próximo passo será investigar as
alterações que ele provoca dentro dos neurônios. Não sabemos como ele impacta o
funcionamento dessas células e, por conseguinte, do sistema nervoso - afirma
Martins-de-Souza.
O grupo também
investigará a ação do coronavírus nas células da glia, os astrócitos.
Essenciais para o funcionamento dos neurônios, eles são as células mais
abundantes do sistema nervoso central.
A porta de entrada do
coronavírus nos neurônios é a mesma usada para invadir as do sistema
respiratório. São proteínas chamadas ECA-2 (enzima conversora de angiostensina
2). A proteína espícula (ou spike) do Sars-CoV-2 funciona como chave para
entrar na célula humana. A ECA-2 é a fechadura.
Já se imaginava que o
coronavírus pudesse invadir qualquer célula que tenha ECA-2 na superfície. E
essas moléculas são abundantes não apenas em células dos pulmões, mas também
nas de coração, fígado, rins, vasos sanguíneos e do cérebro.
- Ao que tudo indica, o
coronavírus pode invadir qualquer célula que tenha ECA-2, mas precisamos
entender como ele faz isso nos neurônios e por que só algumas pessoas
manifestam sintomas neurológicos. Isso pode estar relacionado, por exemplo, à
forma como ele entra no organismo humano - diz o pesquisador.
Porta de entrada para o
vírus.
Uma das hipóteses para
a perda de olfato, agora considerada um dos sintomas mais característicos da
Covid-19, é que o vírus entre pelo nariz, se multiplique no nervo olfatório e o
use para chegar ao cérebro.
Uma das coisas que o
grupo da Unicamp quer descobrir é se o Sars-CoV-2 infecta qualquer neurônio ou
se tem preferência a se multiplicar dentro de algum tipo específico. O sistema
nervoso tem uma multidão de neurônios com funções específicas, alguns estão
ligados aos sentidos, outros à cognição e há aqueles relacionados a funções
básicas do organismo, como respiração e batimentos cardíacos. A concentração de
ECA-2 também varia entre eles.
Essa proteína está
ligada ao controle da pressão sanguínea. Mas os pesquisadores suspeitam que ela
possa desempenhar outras funções. Como o coronavírus impacta cada uma delas e o
que isso representa para o desenvolvimento da Covid-19 são questões ainda sem
resposta.
Outro desafio é que a
ECA-2 pode não ser a única porta de entrada para as células.
- Há evidências que ele
entra por outras portas em nossas células. Estamos no início - diz o
neurocientista.
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