FONTE: iG São Paulo, TRIBUNA DA BAHIA.
É tudo uma questão de como a pessoa se vê. O
tempo passa, a idade avança, o corpo muda e as rugas aparecem. A noção de
ancião com muita experiência passa longe do contexto e logo aquele jovem
independente se torna um idoso que morre de medo de dar trabalho para os
outros. Não se trata apenas de vaidade, estudos mostram que quanto pior a
percepção da autoimagem, pior é o cuidado do idoso com saúde, alimentação,
socialização e atividade física. Basicamente, menos longeva a pessoa será.
Um estudo realizado nos Estados Unidos com
338 homens e 322 mulheres mostrou que aqueles que tinham autopercepção mais
positiva do envelhecimento, sem ligar a velhice à decadência física, por
exemplo, tiveram maior sobrevida ao longo de 23 anos de observação.
No Brasil, a geriatra
Laura Mariano da Rocha analisou a autoimagem e a autoestima de pessoas com mais
de 60 anos em Porto Alegre e constatou que 70% dos pesquisados tinham alguma
insatisfação corporal. Os homens queriam estar mais fortes e as mulheres, mais
magras. Mais do que isso, ela concluiu que aqueles que se compreendiam como
envelhecendo mal, tinham uma percepção ruim da saúde e da imagem corporal.
“A questão é que, quanto pior esta
percepção, pior é o cuidado com a saúde, com o uso das medicações, com a
atividade física. Pior é o envelhecimento”, diz. Para a geriatra, é preciso que
os próprios idosos entendam que envelhecer é um processo que faz parte da vida.
“Você sabia que a maioria dos idosos de Porto Alegre faz apenas uma refeição
por dia? Seja porque não tem companhia, seja porque não tem autonomia para
cozinhar.”
Essa autoimagem ruim não é por acaso. Os
estereótipos negativos relacionados ao envelhecimento são criados pela
sociedade e assimilados ao longo da vida. “Eles são aceitos e incorporados
pelos jovens sem muito questionamento. Ao envelhecer, estes conceitos prévios
fazem parte da personalidade dos indivíduos e podem produzir efeitos negativos
de incapacidade e inutilidade”, afirma Laura em sua dissertação de mestrado
defendida na PUC-RS.
Qualidade de vida pra
quem?
Envelhecer com qualidade é o
grande desafio, principalmente para um país como o Brasil, que terá um rápido envelhecimento
da população nos próximos 20 anos. No entanto, qualidade de vida é um valor
subjetivo. Acesso a bons médicos, exames com bons resultados e conta bancária
podem dizer que tudo está bem, mas o idoso pode não sentir que tem qualidade de
vida. O contrário também acontece. “Mesmo a pessoa numa condição objetivamente
ruim, pode nas piores condições achar a vida boa”, disse Sérgio Paschoal,
médico geriatra do Hospital das Clínicas de São Paulo.
Sem voz numa sociedade que não respeita a
opinião dos mais velhos e com uma autoimagem ruim, a depressão em idosos se
torna mais corriqueira. Um dado que mostra isso é a taxa de suicídio para
homens brancos com mais de 65 anos ser cinco vezes mais alta do que a da
população em geral.
De acordo com dados de estudo liderado por
Maria Cecília Minayo, da Fiocruz, a taxa de suicídios de pessoas com mais de 65
anos passou de 12 a cada cem mil pessoas para 15,8 a cada cem mil, entre 1980 a
2006. A situação é considerada de média gravidade quando passa de dez suicídios
a cada cem mil.
“Não é por achar que a vida econômica está
ruim, mas achar que perdeu o sentido de viver. Eu posso até ser pobre, mas o
que importa é a vida fazer sentido”, disse Sérgio Paschoal.
O sentido da vida para João
Antônio Ramos, de 91 anos, é beber seu vinhozinho diário, receber a família para
jantar e planejar suas viagens anuais para Portugal. Muita coisa aconteceu
desde o dia que o engenheiro eletricista português chegou ao Brasil, em 1954.
Era para permanecer apenas seis meses. O tempo passou e ele foi ficando. Logo
se casou, teve seis filhos, 14 netos e agora uma bisneta. “Ainda”, brinca.
A aposentadoria há 30 anos não o deixou
deprimido, como é comum acontecer. “É uma mudança, mas a gente supera com
outras coisas. Em vez de trabalhar, lê um livro. Querendo, não falta coisa para
fazer”, diz com a serenidade típica de quem pode se tornar um centenário.
Até lá, segue sua rotina. Acorda
às 9 horas, lê o jornal, faz exercícios como “saltitar, baixar e levantar”,
depois dá uma volta, vai ao banco ou encontra um parente. Em julho pretende ir
a Portugal encontrar os
primos. “Pois meus pais já morreram”, brinca.
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