Ao menos 31 crianças
morreram na Índia nos últimos 10 dias, supostamente por uma doença causada pelo
consumo excessivo de lichia, de acordo com informações da AFP. As mortes
aconteceram em hospitais do distrito de Muzaffarpur, no estado de Bihar, que
lidera a produção da fruta no país asiático.
As vítimas relataram
sintomas de encefalopatia (qualquer doença que afeta o encéfalo, ou seja, toda
estrutura dentro do crânio, como cérebro e cerebelo), como confusão mental,
fraqueza e convulsões. Outras 40 crianças, que reclamam dos mesmos sintomas,
recebem tratamento em Unidades de Terapia Intensiva. "Estamos fazendo todo
o possível para salvá-las", afirmou S.P. Singh, diretor do Hospital Sri
Krishna, à AFP.
O caso não é uma
novidade na região. Anualmente, problemas como esse são registrados durante o
verão em Muzaffarpur desde 1995 e em 2014 chegou a provocar 150 mortes. Épocas
quentes são conhecidas como justamente a temporada da lichia --por isso
encontramos mais a fruta no Brasil nas festas de fim de ano, quando é verão.
A
culpa é da lichia?
Com o grande número de
casos em 2014, pesquisadores investigaram
as possíveis causas. "Os sintomas relatados batem com
os de uma encefalopatia, geralmente causada por infecções virais, bacterianas
ou por contaminação por agrotóxicos ou metais pesados. Mas os exames não
apontavam qualquer um desses problemas", diz Andressa Heimbecher Soares,
endocrinologista e colaboradora do Grupo de Obesidade e Síndrome Metabólica do
HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo).
Os cientistas então
perceberam que a única possível causa seria a hipoglicemia, que dava positiva
em todos os casos. Entre as substâncias encontradas no organismo das vítimas,
as únicas prováveis causadoras de hipoglicemia estava as presentes na lichia:
hipoglicina A e MCPG.
"Essas substâncias
presentes na lichia, entretanto, só baixam a glicemia em quantidades muito
grandes e em situações específicas", explica Soares. Segundo ela, não foi
a lichia em si que causou a encefalopatia nas crianças e sim um conjunto de
fatores.
"Elas eram de uma
comunidade muito pobre, estavam desnutridas e a única coisa que comiam exageradamente
eram as lichias. Tudo desencadeou a baixa da glicemia e o mau funcionamento do
cérebro", diz. "E não foi porque comeram 10 ou 20 lichias, como
fazemos nas festas de fim de ano aqui, mas provavelmente 100 ou mais."
Glicose
e encefalopatia.
De acordo com Gustavo
Wruck Kuster, neurologista do Hospital Sino-Brasileiro, da Rede D'Or, quando a
encefalopatia não é causada por agentes externos, as causas geralmente são
metabólicas, como alterações no sódio e na glicose, como foi o caso das
crianças indianas. "A glicose e o oxigênio são o que a célula precisa para
se manter viva. Quando se tira um dos dois, causa um problema em todas as
células do corpo, inclusive no cérebro", explica ele.
Kuster afirma que, se
não tratada rapidamente, o que era confusão mental e fraqueza evolui para
convulsões, coma e até morte. A falta de tratamento adequado pode ter inclusive
agravado o quadro dos pacientes, já que havia limitações do suporte clínico na
região.
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