Medir o grau de confiança nas instituições estatais, sobretudo nas que visam a tutelar a segurança, é de extrema importância em um Estado democrático, vez que legitima a atuação de seus agentes no cotidiano da população.
Dentre os levantamentos divulgados pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2011 (disponibilizado no Fórum Brasileiro de Segurança Pública), há o que aferiu a Percepção dos Brasileiros sobre Polícia e Segurança Pública, do Sistema de Indicadores de Percepção Social 2010 do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), cujo resultado foi de que 27% da população com mais de 18 anos não confia na Polícia Militar.
Considerados os que confiam na PM, apenas 4,2% confiam muito, 25,1% confiam e 43% confiam pouco. O interessante é que o grau de desconfiança diminui à medida que a idade do cidadão aumenta. Nesse sentido, 34,4% dos jovens entre 18 e 24 anos não confiam na PM, enquanto que apenas 19,7% dos respondentes com 55 anos ou mais não confiam.
Uma das razões para que os jovens não confiem na Polícia, segundo o Anuário, é que eles representam a maior parcela de autores e vítimas de crimes violentos, o que altera sua percepção. Conforme dados do Datasus (Ministério da Saúde), os jovens entre 15 e 29 anos representaram 54,1% das vítimas de homicídio em 2009 (Veja: O extermínio diário da adolescência brasileira: 11 assassinatos por dia e Homens e jovens: principais vítimas de homicídio no país).
Parte dessa desconfiança surge da insegurança (e não segurança) causada pela atuação policial violenta e agressiva no combate aos delitos, onde há enfrentamentos e trocas de tiros, que por vezes envolvem até inocentes, resultando em mortes por todos os lados.
De acordo com a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo, nos últimos cinco anos (2007/2011), houve um aumento de 13,65% no número de resistências seguidas de morte envolvendo a Polícia Militar. Só na atuação da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) houve um aumento de 63% no mesmo período (O Estado de São Paulo).
Dessa forma, se justifica que a credibilidade da Polícia junto à população seja atingida. Contudo, a falta de confiança da sociedade em seus órgãos e instituições evidencia o equívoco na forma como o Estado lida com suas mazelas, requerendo formas de atuação mais eficazes e menos desastrosas.
A violenta e sangrenta polícia militar programada pelo Estado brasileiro, para fazer à nossa guerra civil (não declarada), ignora completamente uma realidade cruel que é a seguinte: o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo e esse é um dos maiores combustíveis na nossa “fábrica” de violência. O Gini, índice que mede a desigualdade social, varia de 0 – 1: quanto mais próximo de 0 mais igualitária é a sociedade. Assim, os índices considerados altos são os que estão a partir de 0,45. O Gini do Brasil é de 0,56, ou seja, a desigualdade no país é muito alta.
Desigualdade alta significa não só a existência de muita gente que é só corpo (sem conhecimento útil incorporado), como a sua desconsideração, chegando ao extremo da sua fácil eliminação, por se tratar de um descartável (economicamente, por não ser consumidor, e fisicamente por não ter conhecimento incorporado). Some-se a isso o nosso ancestral autoritarismo, assim como o controle social militarizado violento. Tudo isso explica porque o Brasil é o campeão mundial em homicídios, em números absolutos (51 mil mortes em 2009).
*** Luiz Flávio Gomes é jurista e cientista criminal. Fundador e presidente da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Acompanhe meu Blog. Siga-me no Twitter. Encontre-me no Facebook.
*** Mariana Cury Bunduky é advogada e Pesquisadora do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes.
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