FONTE: *** UOL, TRIBUNA DA BAHIA.
Um sistema de Justiça marcado por investigações policiais “bastante críticas” e por critérios como rapidez, imparcialidade e honestidade abaixo de níveis médios em uma escala que vai de zero a quatro pontos. É esse o panorama revelado pela Sips (Sistema de Indicadores de Percepção Social) Justiça, pesquisa divulgada na terça-feira (31) pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), em Brasília, e que trata da percepção social do brasileiro sobre as instituições nacionais.
Atualmente na segunda edição, a Sips Justiça segmentou o sistema de justiça por magistratura, Ministério Público, defensoria pública, advocacia e polícia judiciária --a qual, apontou o estudo do instituto, aparece com a pior avaliação entre o grupo.
Em uma escala onde zero equivale à avaliação “muito mal” e quatro a “muito bem” --um é “mal”; dois é “regular”, três é “bem” --, os pesquisados deram nota 1,81 à Polícia Civil, responsável pela investigação que, em tese, origina os inquéritos que subsidiarão a análise da promotoria, a qual, por sua vez, remete os casos, já como denúncias, ao poder judiciário para abertura ou não de processos.
Na sequência dos avaliados do sistema judicial, a segunda pior nota, para os pesquisados, foi destinada aos advogados --1,96 --, seguidos pela defensoria pública --2,04-- e pelas figuras do juiz --2,14 -- e do promotor: este último, junto com a Polícia Federal, dono da nota mais alta, 2,20.
Para os pesquisadores do Ipea, o fato de a PF surgir pouco acima da nota média, ainda que também não bem avaliada, pode ser explicado pelo alto grau de exposição, “geralmente com conotação positiva”, das operações da PF na mídia “no passado recente”.
Na reta oposta, consideraram, a única média rigorosamente abaixo de 2,00 (considerada a margem de erro de 0,04), conferida à Polícia Civil, pode indicar, entre os cidadãos, “especial desconfiança em relação à efetividade da investigação de crimes”.
ATRIBUTOS AVALIADOS.
Na avaliação específica do sistema judicial por meio de atributos como rapidez, acesso, custo, honestidade, imparcialidade e ainda “decisões justas”, o Ipea encontrou um panorama pouco animador: em absolutamente nenhum deles --seja por região do país ou ainda por renda, raça/etnia, sexo, escolaridade e idade dos entrevistados --a nota chegou nem mesmo a dois, na escala de zero a quatro pontos.
Na média nacional, por exemplo, rapidez da Justiça não passou de 1,19 --a pior avaliação, 1,05, feita pela região Sudeste, assim como em relação ao acesso, com nota de 1,38, quando a média nacional ficou em 1,48.
O custo judicial obteve nota média de 1,45 --com a nota mais alta, neste caso, concedida pelos entrevistados do Sul: 1,55. Já o atributo “decisões justas”, com média nacional de 1,60, teve a melhor avaliação no Nordeste --1,69 --e, a pior, no Sudeste --1,53.
O atributo honestidade, avaliado na média com 1,18, foi o critério com as notas mais baixas conferidas em todas as regiões. O mesmo se verificou com o atributo imparcialidade, com nota média nacional também de 1,18.
Entre as causas pelas quais a Justiça é mais buscada pelos brasileiros, apontou a pesquisa do Ipea, figuram as de natureza criminal (10,1%) --ainda que, em outra parte do questionário, os entrevistados tenham qualificado como problema “mais sério” assuntos de natureza familiar (24,86%), de relações de trabalho (15,43%) e mesmo questões com vizinhos (11,71%), para os quais nem sempre, no entanto --definiram os pesquisadores --, a Justiça é procurada, e também por desconfiança.
PERCEPÇÃO x CONHECIMENTO.
Para o professor de filosofia política na UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) Newton Bignotto, a pequisa de percepção não reflete, necessariamente, a atuação das instituições. “Se ela [a instituição] está mal avaliada não quer dizer que nada funcione, mas que o cidadão não se sente atendido.
Mas esse é um aspecto que deve ser considerado, pois, se a pessoa não se sente contemplada, algo está errado. É como se as instituições públicas não pudessem se guiar só pela percepção do público -- mas não podem desconhecê-la, pois se trata de um dos aspectos dessa relação”, avaliou.
Bignotto é um dos coordenadores do do Crip (Centro de Referência do Interesse Público), projeto interdisciplinar criado na UFMG, em 2006, para discutir valores, cultura e história das instituições políticas em sociedades democráticas.
O estudioso alerta, no entanto, que não basta medir a percepção do brasileiro sobre as frentes que trabalham --ou deveriam trabalhar --por ele: ele defende que a população precisa, antes, ter acesso às funções que cada segmento exerce dentro das instituições, até para usufruí-las e cobrá-las adequadamente.
“É o caso do papel de um promotor, por exemplo; muitos não sabem que o sistema judicial é amplo e compreende também a figura do MP, ou tem uma noção equivocada do que deve fazer um promotor”, disse.
*** Reportagem de Janaina Garcia.
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