FONTE: MARCO VARELLA, COLABORAÇÃO PARA A FOLHA (www1.folha.uol.com.br).
Uma pesquisa feita na África descobriu que a composição do leite materno humano pode variar de acordo com o sexo do filho e as condições financeiras da mãe.
A quantidade de gordura presente no leite é maior para filhas do que para filhos quando as mães dos bebês têm baixo status socioeconômico. Já mães de classe alta apresentam maior quantidade de gordura no leite para filhos do que para filhas.
A composição do leite materno está adaptada às necessidades do bebê humano. É por isso que o aleitamento previne mortes infantis e promove a saúde física e mental da criança e da mãe.
Mas o líquido também pode ser visto como uma espécie de investimento evolutivo que as mães fazem no sucesso de sua prole --o que pode exigir diferentes estratégias dependendo do contexto.
Publicado na revista "American Journal of Physical Antropology", o novo estudo fortalece uma hipótese evolucionista de 1973 sobre os fatores que fariam mães de várias espécies investirem em filhas ou em filhos.
Segundo a hipótese Trivers-Willard, a seleção natural favorece maior investimento em filhas quando as condições de vida não são favoráveis e maior investimento em filhos quando as condições são boas, em especial entre bichos poligâmicos.
Isso porque as fêmeas de mamíferos, por conta da gravidez, têm menos filhos ao longo da vida do que os machos. Por outro lado, nem todo macho consegue se reproduzir, por conta da competição por parceiras. Já a maioria das fêmeas se reproduz alguma vez em sua vida.
Essa diferença faz com que o foco em filhas seja um investimento seguro para situações de vida mais difíceis, e o gasto com filhos algo para quando se pode esbanjar.
O ESTUDO.
A equipe do estudo, liderada por Masako Fujita, antropóloga da Universidade de Michigan, estudou o investimento materno de 83 mães em aleitamento exclusivo, residentes em comunidades rurais do norte do Quênia.
Nessa cultura, os homens podem se casar com várias mulheres. Em tais condições, são maiores as pressões seletivas para o investimento diferencial em filhos ou em filhas, de acordo com a hipótese Trivers-Willard.
Os pesquisadores levaram em conta o status socioeconômico das mães, mediram a frequência de amamentação de meninos e meninas e analisaram os níveis de gordura do leite materno.
Eles verificaram que mães ricas que tinham filhos apresentaram leite com 2,8 mg/dL de gordura, enquanto as mães ricas de meninas tinham 0,6 mg/dL de gordura em seu leite. Já as mães mais pobres tinham leite com 2,6 mg/dL de gordura para filhas e 2,3 mg/dL para filhos. Não houve diferença na frequência das mamadas.
Resultados semelhantes já foram encontrados em espécies como as focas-cinzentas e os cervos-nobres.
Robert Trivers, biólogo que ajudou a criar a hipótese, não previa que até a composição do leite poderia variar conforme sua proposta. Para ele, "as evidências em apoio à teoria são boas para mamíferos em geral e estão crescendo para humanos".
Ele lembra que os conceitos por trás da teoria são usados, por exemplo, para aumentar o nascimento de fêmeas de espécies ameaçadas.
Para a nutricionista Emanuele Marques, que faz doutorado na Uerj pesquisando mitos sobre o aleitamento, os resultados ajudam a derrubar a lenda de que o leite materno humano seria fraco.
"Esse mito surgiu no final do século 19 e até hoje é utilizado por muitas mulheres como justificativa para a introdução do leite de vaca precocemente na alimentação."
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