sábado, 3 de abril de 2010

CRIMES SEM SOLUÇÃO CONFIRMAM DEFICIÊNCIAS DA POLÍCIA BAIANA...

FONTE: *** Bruno Wendel e Bruno Villa, CORREIO DA BAHIA.

Depois da dor de perder o marido na chacina do Pero Vaz, supostamente cometida por policiais militares, a dona de casa Elisângela Araújo, 25 anos, ainda teve de encontrar forças para lutar contra o descaso do Departamento de Polícia Técnica (DPT) para sepultar o corpo de Luís Alberto Pereira dos Santos, 33. Funcionários do Instituto Médico-Legal (IML), órgão ligado ao DPT, não sabiam que desde o dia 26 de março o laudo cadavérico de Luís Alberto estava pronto, o que impedia a liberação do corpo.
- O laudo de Luís Alberto Santos tá pronto?
- Ainda não. Não se preocupe. Não precisa ficar ligando. Quando sair nós vamos avisar.
O diálogo por telefone se repetiu várias vezes. Na terça- feira, Elisângela, que desde o dia 14 de março liga para o IML, resolveu falar diretamente com o laboratório. Ao ser informada que o resultado saiu desde o dia 26, procurou novamente o IML.
- O resultado já saiu. Quero saber o que faço.
-Tem certeza? Quem disse?
- O pessoal do laboratório.
- Ok. Me ligue daqui a dez minutos.
Elisângela ligou e, quatro dias após o laudo estar pronto, pôde sepultar o corpo do marido. O drama da dona de casa ilustra a precariedade do trabalho das polícias Civil e Técnica na Bahia. Faltam profissionais, qualificação e equipamentos para realizar as investigações. O resultado desta equação de escassez é a impunidade dos criminosos.
Com as dificuldades para realizar as investigações, poucos inquéritos são enviados ao Ministério Público para que o processo seja aberto e o réu julgado.
Entre janeiro e outubro de 2009, apenas 25% dos 1.404 inquéritos para investigar homicídios viraram processos na Justiça. Em 2008, o percentual foi de apenas 18%.
Uma delegada da Delegacia de Homicídios criticou a falta de estrutura da instituição. Disse que não há sequer integração entre os sistemas de informação da delegacia com o IML, o que atrapalha o inquérito. A DH, que tem dez delegados, precisa de 50.
Diversos casos sem solução simbolizam o problema,como o assassinato do ambientalista Antônio Conceição Reis, 44 anos, o Nativo, morto em julho de 2007, e do apresentador Jorge Pedra, assassinado em novembro do ano passado.
MUITAS PERGUNTAS.
O exemplo mais recente é a morte da bancária Ananda Lima Barreto Assunção, 30. O crime ocorreu há 32 dias e a polícia ainda não respondeu a muitas perguntas sobre as circunstâncias da morte. Tesoureira da agência da Caixa Econômica Federal de Lauro de Freitas e mulher do capitão da PM Roberto de Melo Assunção, ajudante de ordens do governador Jaques Wagner, Ananda foi morta por asfixia nas dunas da praia de Ipitanga. Desapareceu após deixar mais cedo a agência para ver o filho doente. No dia seguinte, foi encontrada a poucos metros do Fiat Palio que conduzia. O caso sequer foi encaminhado à Justiça, de acordo com consulta processual no site do Tribunal de Justiça.
Durante o lançamento do Programa Ronda nos Bairros, em Pau da Lima, na quarta- feira, o secretário da Segurança Pública, César Nunes, voltou a falar sobre o crime, mas manteve a posição de que não há suspeito. “O laudo mostrou que ela teve o rosto empurrado no areia”. O documento não constatou sinais de violência no corpo de Ananda. Outro detalhe importante divulgado é que, embora o celular e a carteira da vítima com dinheiro não tenham sido levados, a chave do Palio não foi encontrada na cena do crime pelos peritos do DPT.
Depois de falar com a empregada para saber o estado de saúde do filho, a bancária deixou o trabalho. “Ela sacou dinheiro na agência e saiu”. Também quebrando o jejum, a delegada Andréa Ribeiro, titular da Homicídios, disse na segunda-feira que vai pedir ao Ministério Público Estadual (MPE) mais 30 dias para concluir o caso, já que o crime ainda não tem motivação e autoria definidas.

CASOS SEM SOLUÇÃO:
NOME: ANANDA BARRETO ASSUNÇÃO, 30 ANOS
DATA DO CRIME: 1º DE MARÇO DE 2010
FATO: MORTA POR ASFIXIA NA PRAIA DE IPITANGA
PERGUNTAS SEM RESPOSTAS: Qual é a linha de investigação? O assassino só levou a chave do carro. Deixou dinheiro e celular de Ananda, asfixiada na areia, morte incomum em casos de roubo seguido de morte. Ananda, esposa de segurança do governador Jaques Wagner, que foi ao enterro, deixou a agência mais cedo para ver o filho. A agência não tem câmeras, mas era dia. Será que ninguém a viu sair? As imagens do sistema de segurança de prédios vizinhos foram recolhidas, mas não se sabe das análises. O secretário de Segurança Pública diz que não há suspeito. Mas por que, dias após o crime, uma equipe da Delegacia de Homicídios passou a trabalhar exclusivamente nas investigações em Itapuã, região onde a vítima não costumava passar depois do trabalho?

NOME:
JORGE LUIZ LOPES PEDRA, 52 ANOS
DATA DO CRIME: 1º DE NOVEMBRO DE 2009
FATO: ESFAQUEADO ATÉ A MORTE
SITUAÇÃO DO CASO: Sem autoria definida. Provas colhidas na cena do crime, exames de DNA em suspeitos, mais de 30 pessoas interrogadas e até divulgação do retrato falado do suposto algoz não foram suficientes para a polícia chegar ao assassino.
PERGUNTAS SEM RESPOSTAS: Funcionários do hotel afirmam que não se lembram do rosto do assassino, mas disseram no dia do crime que o apresentador entrou acompanhado de um rapaz moreno, com o corte do tipo rabo-de-cavalo e que se chamava Rogério. Qual das duas informações é a verídica? De acordo com as primeiras investigações, horas antes do crime, Pedra bebia com dois rapazes num bar próximo ao hotel. Mas quem são eles?

NOME: ANDERSON JORGE DOS SANTOS, 31 ANOS
DATA DO CRIME: 17 DE OUTUBRO DE 2009
FATO: A MOTO SUZUKI PILOTADA PELO EMPRESÁRIO FOI ATINGIDA POR UMA PICAPE HILLUX CONDUZIDA PELO JUIZ BENEDITO DA CONCEIÇÃO DOS ANJOS EM FRENTE À SEDE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA BAHIA (TJ-BA). O MAGISTRADO TERIA INVADIDO A MÃO DO MOTOQUEIRO DURANTE UMA MANOBRA
SITUAÇÃO DO CASO: Nenhuma audiência realizada
PERGUNTAS SEM RESPOSTAS: Na ocasião, um dos advogados do juiz disse que aguardava o laudo do Departamento da Polícia Técnica para apresentar seu cliente à Justiça. No entanto, segundo Ramires Cravo, 27, mulher da vítima, o documento está pronto desde meados de fevereiro e aponta que o juiz provocou o acidente. Então, por que o caso não segue adiante?

NOME: ANTÔNIO CONCEIÇÃO REIS, 44 ANOS
DATA DO CRIME: 9 DE JULHO DE 2007
FATO: ASSASSINADO A TIROS NA PORTA DE CASA POR QUATRO HOMENS E EM SEGUIDA JOGADO NO PORTA-MALAS DE UM VEÍCULO. DIAS DEPOIS, FOI ENCONTRADO NUM VEÍCULO MODELO ECOSPORT, INCENDIADO, NO MUNICÍPIO DE CAMAÇARI
SITUAÇÃO DO CASO: Mofando entre as pastas amontoadas nos armários da Delegacia de Homicídios, o inquérito que apura a morte do ambientalistas Antônio Conceição Reis, 44, o “Nativo”, está longe de ser solucionado. O Ministério Público passou a investigar o caso, já que a apuração da Polícia Civil pouco avançou. A promotora Isabel Adelaide Moura chegou a dizer na época que já tinha pistas dos autores, mas não poderia fornecer “maiores detalhes”. No entanto, já se passaram mais de dois anos e ninguém foi indiciado.

*** Notícia publicada na edição impressa do dia 3/04/2010 do CORREIO.

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