Nos países mais desenvolvidos do mundo, há uma grande variedade de medicamentos que só podem ser vendidos com apresentação da receita médica. Isto ocorre para evitar ou reduzir ao mínimo a automedicação, declarada uma praga pelos médicos e que realmente pode acarretar efeitos perigosos para a saúde das pessoas.
No Brasil, há vários medicamentos que, de há muito, só podem ser vendidos sob receita médica. Muitos deles, os conhecidos como de “tarja preta”, exigem das farmácias a retenção da receita. Outros exigem apenas a apresentação, sem retenção. E muitos outros não exigem receita nenhuma – são totalmente liberados.
A grande novidade é que, diante de um antigo e ativo lobby da poderosa categoria médica e tendo como fundamento o fato de que micro-organismos, especialmente as bactérias, tendem a adaptar-se aos antibióticos por meio de mutações que lhes aumentam a resistência, o governo federal, por intermédio do órgão próprio, determinou que todo e qualquer antibiótico, sob qualquer apresentação, só pode ser vendido nas farmácias quando o comprador tiver a respectiva receita médica.
As farmácias certamente não estão felizes com a nova norma, pois a demanda por antibióticos terá sido severamente reduzida. E muitas pessoas que, ainda inocentemente, tentam comprar algum antibiótico que já haviam usado antes para o mesmo tipo de problema que enfrentam no momento, vão à farmácia sem receita e saem de lá sem o remédio.
Felizes estarão, ao menos neste particular, os médicos clínicos e os de especialidades que dão receitas que incluem antibióticos. Seus consultórios devem estar um pouco ou muito mais frequentados e as filas de espera – com clientes segurados por planos de saúde que não pagam um valor condigno pelas consultas – com elevado incremento na espera. Mas vamos agora ao núcleo do problema.
O Brasil tem mais de 190 milhões de habitantes e apenas 42 milhões deles têm a cobertura de algum plano ou seguro de saúde. Os que têm plano se saúde que pagam valores reduzidos costumam não encontrar vagas na rede credenciada ou referenciada para uma consulta sem terem que entrar numa longa fila de espera.
Uma consulta médica particular varia de preço, de acordo com o médico, a especialidade, a oferta e a procura, além de vários outros fatores, e há, pelo menos na Bahia, a carteira do Sinam, fornecida pela Associação Bahiana de Medicina, com a qual é possível, não com todos, mas com uma parte dos médicos, obter-se uma consulta por valores acima dos que paga a grande maioria dos planos de saúde, mas, ainda assim, módicos.
Há, no entanto, alguns grandes problemas.É reduzido o percentual de pessoas que, não tendo plano de saúde, não tem também a carteira do Sinam (aliás, parece que cada vez mais malvista pela categoria médica). Esses teriam que pagar o preço de uma consulta particular, coisa que geralmente anda aí pelos R$ 200,00, podendo ser bem mais ou um pouco menos. Essas pessoas não podem pagar isso, sequer podem pagar pela tabela do Sinam.
Elas ficam na dependência de consulta no Sistema Único de Saúde. Isso leva uma vida (pode levar a delas). Enquanto a infecção, que o antibiótico deveria combater desenvolve-se, multiplica danos e pode até atingir o estágio de uma septicemia (infecção generalizada), muito frequentemente mortal.
Enquanto o Brasil for um país de tantos pobres e o Sistema Público de Saúde for a nulidade que é (ressalvados, às vezes, certos procedimentos de alta complexidade), a exigência de receita para a compra dos antibióticos mais rotineiros é, para não dizer um crime, uma besteira que vai continuar matando muita gente.
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