FONTE: GINA KOLATA, DO "THE NEW YORK TIMES" (www1.folha.uol.com.br).
Cientistas finalmente encontraram uma resposta para um dos grandes mistérios sobre uma das mais mortais bactérias, o Staphylococcus aureus. Ela ataca principalmente humanos, e não animais, e responde pela morte de cem mil norte-americanos anulamente.
Pesquisadores da Universidade Vanderbilt (em Tenessee, nos EUA) relatam que o estafilococo evoluiu para se focar em áreas específicas da hemoglobina humana, de forma a estourar a molécula e se alimentar do ferro em seu interior. As pessoas resistentes ao estafilococo, suspeitam, podem ter leves variações genéticas que ajustam as regiões da hemoglobina procurada pela bactéria, tornando-as impenetráveis ao ataque.
O estudo é parte de uma visão mais geral sobre genes e doenças. Com novas ferramentas para examinar em detalhes as leves variações genéticas, pesquisadores estão se perguntando por que algumas pessoas contraem certas doenças e outras não, e por que algumas morrem de doenças que outros simplesmente ignoram. Com o estafilococo, por exemplo, 30% da população carrega a bactéria em seus narizes, sem mostrar sinais de infecção.
Especialistas em estafilococos dizem que a descoberta, publicada na edição de 16 de dezembro da "Cell Host & Microbe", responde a muitas perguntas sobre a bactéria e indica novas direções para pesquisas. "É um trabalho impressionante", diz Frank DeLeo, chefe de patogênese bacteriana humana no Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas. "Isso está movendo toda a área para frente."
O trabalho começou em 2002, quando Eric P. Skaar era estudante de pós-doutorado e fascinado pelo estafilococo. "Essa bactéria é a pior ameaça à saúde pública", afirma ele. "Ela é a principal causa de infecções cardíacas e de pele, a principal causa de infecções em tecidos moles. É uma grande causa da pneumonia. É a causa número um das infecções hospitalares."
A bactéria pode estabelecer residência em qualquer tecido do corpo. Porém, como todos os organismos, precisa de ferro, e Skaar imaginava como ela o obtinha. A resposta, descobriu, é que a bactéria "estoura glóbulos vermelhos e agarra o ferro". Mais recentemente, como professor-associado na Vanderbilt, Skaar fez uma pergunta que ninguém jamais havia pensado em fazer: "Será que a bactéria gosta de algumas hemoglobinas mais do que outras?"
Ele criou estafilococos em laboratórios, dando-lhes sangue de diferentes animais --de camundongos a babuínos a seres humanos. Eles definitivamente preferiam sangue humano, relatou Skaar no novo artigo, mas havia também uma clara tendência: quanto mais alto o animal estava na escala evolutiva, mais a bactéria gostava de seu sangue.
Skaar e seus colegas encontraram a proteína do estafilococo que se prende à hemoglobina e descobriram que ela se agarra a segmentos da proteína sanguínea que existem especificamente em humanos. Ela pode se prender a segmentos similares em hemoglobinas animais, mas com menos avidez.
CAMUNDONGOS.
Finalmente, os pesquisadores infectaram dois grupos de camundongos. Um continha espécies comuns de laboratório, com hemoglobina normal. O outro possuía hemoglobina metade humana e metade camundongo. O resultado é que a classe com hemoglobina de humanos e camundongos teve dez vezes mais bactérias crescendo em seus órgãos.
Finalmente, os pesquisadores infectaram dois grupos de camundongos. Um continha espécies comuns de laboratório, com hemoglobina normal. O outro possuía hemoglobina metade humana e metade camundongo. O resultado é que a classe com hemoglobina de humanos e camundongos teve dez vezes mais bactérias crescendo em seus órgãos.
Isso explica por que é tão frustrante estudar infecções por estafilococos em cobaias, disse Mark S. Smeltzer, da Universidade do Arkansas. Pesquisadores usam os roedores, que são baratos e prontamente disponíveis, para desenvolver tratamentos e vacinas contra a bactéria, mas sempre foi muito difícil infectá-los --os cientistas precisam injetar neles uma quantidade tão grande de bactéria que, segundo Smeltzer, "tudo acaba ficando irreal".
A quantidade era imensamente maior do que o necessário para muitas, se não a maioria, das infecções em humanos, explica ele. O novo estudo sugere, porém, uma maneira de contornar o problema: usar cobaias com hemoglobina humana.
Para Skaar, o resultado também indica uma resposta a uma das questões mais prementes sobre infecções por estafilococos em humanos: por que um terço da população tem a bactéria no nariz e não fica doente, enquanto para os outros, uma infecção por estafilococo pode ser fatal?
"Na minha opinião, essa é a pergunta mais importante sobre a bactéria atualmente", diz Skaar. Seu trabalho, segundo ele, indica a existência de fatores genéticos que determinam a suscetibilidade a infecções entre espécies. Existiriam também fatores genéticos que determinam a suscetibilidade dentro de uma espécie, a espécie humana?
O cientista está tentando descobrir: existem pequenas diferenças genéticas bem caracterizadas em hemoglobinas em meio a diferentes pessoas, e o Centro de Medicina Vanderbilt possui um banco de genes com o DNA de milhares de seus pacientes. Skaar está usando esse banco para examinar os genes da hemoglobina de todos os pacientes que tiveram infecções por estafilococos, e compará-los às sequências de genes de pacientes que não foram infectados.
Ele espera que, caso haja variações entre hemoglobinas humanas que determinem a suscetibilidade à bactéria, ele provavelmente as encontrará. Sua esperança, disse ele, é que no futuro um paciente entre num hospital e, como parte de um pré-atendimento de rotina, os médicos determinem, pela hemoglobina da pessoa, se devem se preocupar com o estafilococo ou não.
Aqueles que fossem suscetíveis receberiam antibióticos intravenosos antes de procedimentos de risco, como cirurgias. "Essa é a possibilidade mais instigante", afirmou Skaar. "Simplesmente saber que você é mais suscetível seria de grande valor."
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