FONTE: IVAN DE CARVALHO, TRIBUNA DA BAHIA.
Estava eu emergindo à força das exigências carnavalescas, para mim já bem pesadas, com o objetivo de procurar um assunto que pudesse reiniciar a rotina de um repórter de política. Mas para ser lido numa quarta-feira de Cinzas, dia em que os leitores foliões – e são eles uma alta percentagem do total – dividem suas atenções entre a ressaca, as saudades da festa e até, em casos que creio sejam bem mais raros, o arrependimento pelos excessos que podem prejudicar o corpo ou a alma.
Buscava, assim, assuntos leves, que não acrescentassem severidade ao já severo por natureza início da Quaresma. Li em algum lugar, por exemplo, que a linha 4 do metrô carioca – que, em função das Olimpíadas de 2016, ligará Ipanema, bairro da zona Sul do Rio à Barra, na zona Norte, complicou: a altura dos trens, já comprados, impedirá que passem pelos três túneis do trajeto. O Clube de Engenharia do Rio de Janeiro, que critica o projeto e seu alto custo, estuda o problema. Não é um “assunto leve”, pelo peso que terá no bolso dos contribuintes, mas é uma curtição.
Senti uma forte impressão de déjà vu. Já pudemos curtir algo semelhante aqui em Salvador. Lembrei da impressionante capacidade de observação do ex-governador baiano Octávio Mangabeira. Ele garantia: “Pense um absurdo qualquer. Na Bahia tem precedente”. Pois é, ele morreu faz tempo, sua constatação continua atual. Talvez seja imortal.
Outra pessoa de quem me lembrei, não tão importante quanto Octávio Mangabeira, mas que em compensação ainda não morreu, pelo contrário, está vivíssima, foi o líder do governo na Câmara dos Deputados, Cândido Vaccareza, do PT paulista. Se aquela história de Rei Momo estivesse ainda dando ibope, o Vaccareza certamente poderia reivindicar, com absoluto êxito, o título e o trono.
Afinal, ele sugeriu que estará bem empregado o dinheiro da Bolsa Família se o chefe da família beneficiária pegar a grana que sai do bolso de quase todos os brasileiros para ajudar os mais pobres entre eles (e são tantos, esses mais pobres do que os numerosíssimos pobres) se for empregado na compra de cachaça. Sustenta o líder do governo que isso ajudaria a economia brasileira, mas, como notou o blog Gama Livre, o potencial do conselho era bem mais o de resultar numa “bebedeira geral neste carnaval”.
Talvez, ao contrário do que na semana passada acreditei haver demonstrado neste espaço, o mal não seja tanto a cachaça, apesar dos seus “efeitos colaterais” pessoais, sociais e econômicos. Afinal, Jesus ensinou que “o mal não é o que entra pela boca do homem, mas o que sai da boca do homem”. Se Ele quisesse individualizar a crítica – o que não era do seu estilo nem da sua natureza – poderia ter dito “da boca do Vaccareza”.
É verdade que o Vaccareza ainda não estava disponível, mas Jesus sabia de coisas futuras, sabia que ele nasceria um dia, seria eleito deputado no Brasil e se tornaria líder do governo Dilma Rousseff, quando daria ao povo “abaixo da linha da pobreza” conselhos sobre como gastar o dinheiro do Bolsa Família comprando cachaça e “ajudar a economia”.
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