FONTE: CÁREN NAKASHIMA, Colaboração para o UOL (estilo.uol.com.br).
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Marina*, 32 anos, arquiteta, é casada com Júlio*, 36 anos, engenheiro, há cinco anos. "Namoramos três anos, antes do casamento. A primeira vez que ele me bateu foi depois de um churrasco, onde bebemos muito. Ele disse que eu estava trocando olhares com o marido de uma prima", conta. Segundo Marina, "foi apenas um tapa” e ela relevou, devido às circunstâncias. Porém aquela não foi a última vez.
De acordo com ela, os episódios de violência se repetem com certa frequência. Por que ela não se separa? "Porque temos um filho de dois anos, nos damos muito bem e porque eu o amo. Não tenho dúvidas de que ele é o homem da minha vida", explica.
Histórias como essa engrossam os números da pesquisa realizada no início deste ano pela Fundação Perseu Abramo em parceria com o SESC. Eles ouviram mais de 2.300 mulheres e 1.100 homens, em 25 estados brasileiros. Ficou constatado que, a cada dois minutos, cinco mulheres são agredidas violentamente no Brasil.
A pergunta é: por que muitas sofrem caladas? Segundo Flávio Gikovate, psicoterapeuta, o argumento da maioria é similar ao de Marina: "Apesar de tudo, elas amam os agressores e são governadas pela ideia de que o amor deve tolerar tudo", diz. "É uma relação de custo benefício: o custo é a agressão e o benefício é o amor pelo companheiro. Quando a agressão passa, o custo é esquecido... É constrangedor”, afirma o psiquiatra e psicanalista Luiz Alberto Py.
Embora o amor seja o fator principal que prenda tantas mulheres a seus agressores, há, ainda, o medo. "Tanto de reações mais violentas, em caso de abandono, como de enfrentar a vida sozinha, por não ter meios próprios de sobrevivência, de se afastar quando têm filhos pequenos e a dúvida sobre as atitudes como pai após a separação", afirma Gikovate. Movidas pela esperança, estas mulheres esperam que o outro mude e usam a desculpa clássica: "Ele é ótimo quando está bem".
RELAÇÃO DELICADA.
Para Ana Cristina Belizia Schlithler, assistente social do Programa de Atendimento e Pesquisa em Violência (Prove), da UNIFESP, as motivações destas mulheres estão diretamente ligadas ao comportamento do agressor. "Eles fazem promessas e mobilizam sentimentos.
E muitas vezes necessitam de tratamento, porque agridem por causa do abuso de álcool ou drogas. Elas sabem disso e sentem pena", diz. Além disso, a mulher pode ter dificuldade em sair do papel de vítima que a dinâmica do casal estabeleceu.
Questões relativas ao seu funcionamento psíquico também são determinantes, portanto, procurar terapia é fundamental em casos assim.
Embora muita gente pense que ficar com quem agride é uma escolha diretamente ligada à baixa autoestima, isso não é uma regra. "Pode ser, simplesmente, pela esperança de não ter mais que pagar o custo que estava sendo pago [ser agredida], o que não tem, necessariamente, a ver com pouco amor próprio", diz Py.
Mesmo assim, as consequências são sérias. Gikovate afirma que, dependendo da violência que sofreram, estas mulheres podem se tornar avessas a novas possibilidades sentimentais por um longo tempo.
"Às vezes, elas não querem mais saber de envolvimento amoroso com homem algum, em nenhuma fase posterior da vida."Sob a tensão de uma ameaça, muita coisa acontece com o corpo: a chamada reação de luta e fuga –parecida com a dos animais em perigo que se preparam para um embate.
"Essa reação aumenta certas substâncias no sangue, produzidas pela cortisona, cortisol e adrenalina, que criam a síndrome do estresse –pode aumentar o batimento cardíaco e prepara a pessoa para reagir a machucados", explica Py.
Sendo assim, se a mulher não corre, nem luta, há uma consequência terrível para o organismo, como se você acelerasse um carro e freasse repentinamente. "Para isso, a mulher agredida tem duas possíveis respostas: enfrentar ou fugir do perigo. Medo é o sentimento do perigo, que é o contrário do destemor, quando a pessoa não percebe o perigo e, sim, o nega", afirma Py.
* Os nomes foram alterados a pedido da entrevistada.
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