segunda-feira, 26 de outubro de 2009

DOCUMENTÁRIO RECRIA TRAJETÓRIA FESTIVA DO COMUNICADOR CHACRINHA...

FONTE: Doris Miranda (CORREIO DA BAHIA).
Da cartola brilhante à roupa de palhaço. Do enorme disco de telefone pendurado no pescoço ao troféu abacaxi empurrado na mão dos calouros que recebiam a estrondosa buzinada no pé do ouvido. Tudo era espalhafatoso em Chacrinha, personagem lendário do apresentador pernambucano Abelardo Barbosa (1917-1988), considerado por muitos o maior comunicador da tevê brasileira.
Era tão original que nunca mais se viu coisa parecida - mesmo ele tendo propagado o bordão de que na tevê“ nada se cria, tudo se copia”. Os saudosos de seu estilo ou os que não tiveram oportunidade de assistir à irreverência do Velho Guerreiro em programas antológicos como O cassino do Chacrinha podem agora viajar no seu mundo surreal através do documentário Alô, alô Terezinha, de Nelson Hoineff, que estreia sexta nos cinemas de Salvador.
Não se trata de uma biografia convencional. O diretor não se preocupa em contar quem era ou como o velho Abelardo se transformou no Chacrinha. A obra, que recebeu quatro prêmios no Cine PE 2009 (incluindo melhor filme), gira em torno do palhaço iconoclasta. “Fiz um filme sobre a transgressão, sobre a postura politicamente incorreta e acho que isso oxigenou a televisão brasileira”, diz Hoineff, 58, cujo próximo trabalho será o documentário Caro Francis, sobre seu amigo, jornalista e crítico Paulo Francis (1930-1997), com lançamento previsto para janeiro.
CARNAVAL DO EU SOZINHO.
Em cena, o Velho Guerreiro era uma apoteose. Gritava maluquices, inventava bordões jocosos, perseguia os assistentes de palco, exibia as chacretes em shows de dança, jogava farinha de trigo e bacalhau no público e interagia de forma muito pessoal com os artistas.
Fábio Jr. conta que diversas vezes Chacrinha o fez entrar novamente no auditório só porque o público não tinha reagido de forma calorosa o suficiente. “Achava engraçado, mas ia na onda dele. Eu o amava muito”, relembra. Roberto Carlos, quem diria, se apresentou disfarçado dentro do quadro O cantor mascarado. “Chacrinha era único. Nós fazíamos tudo o que ele pedia”, diz o Rei.
Fafá de Belém confirma que bastava o artista cantar no programa para a fama vir instantaneamente: “Ele era a maior parada de sucesso de sua época. Na semana seguinte, estava em primeiro lugar e com música em novela”.
Além do depoimento de artistas como Elba Ramalho, Jerry Adriani, Wanderley Cardoso, The Fevers, Ney Matogrosso e até a banda baiana Chiclete com Banana, o filme situa o público sobre a dinâmica dos programas (Chacrinha passou pela Bandeirantes, pela Tupy e pela Globo), que tinha show de calouros e bizarrices como o concurso para eleger o homem mais feio do Brasil. Deste saiu vencedor o contrarregra Russo, que hoje trabalha com Luciano Huck.
O mais legal, no entanto, no documentário de ritmo irregular é rever as chacretes, algumas das mulheres mais desejadas da tevê brasileira na época. Tirando Rita Cadillac, que estrelou um filme pornô e continua fazendo seus shows pelo país, hoje ninguém mais sabe quem é Loira Sinistra, Fátima Boa-Viagem, Lúcia Apache, Cléo Toda-Pura, Vera Furacão ou Índia Potira, que protagoniza uma das cenas mais comoventes do filme (cinquentona, ela se veste de índia novamente e fica nua no chafariz de sua cidade).
Já muito longe do antigo vigor, as meninas relembram o sucesso e fazem questão de dizer que não eram garotas de programa, como muita gente pensava. O que não significa dizer que não cedessem, vez ou outra, ao encanto de determinado artista. Um a um, elas vão dando nome aos bois: Pelé, Wilson Simonal, Jerry Adriani, Edson Celulari, Wanderley Cardoso, Gonzaguinha, Wagner Montes...
Alô, alô Terezinha é uma obra linear. Ainda assim, faz jus à grande importância de Chacrinha para a construção do imaginário televisivo brasileiro. Mas periga se perder justamente por tangenciar o saudosismo. “Não acho que seja um filme nostálgico. Estou falando de um fenômeno de comunicação”, opina Hoineff, que, embora acalente esse projeto há muitos anos, não conheceu o apresentador profundamente. “É uma pena, só tive a oportunidade de encontrá- lo uma vez só”, diz.
ENTREVISTA - RITA CADILLAC.
De todas as chacretes que povoaram o imaginário masculino, Rita Cadillac foi a única que ultrapassou a etapa de dançarina dos programas do Velho Guerreiro, com quem trabalhou de 1974 a 1983. Desde então, gravou músicas, virou madrinha dos presidiários, foi musa inspiradora do documentário Rita Cadillac, a lady do povo (Tony Venturi / 2007) e protagonizou o filme pornô Sedução (J.Gaspar/ 2004). À personagem que lhe trouxe fama, Rita de Cássia Coutinho, 55, planeja uma última homenagem: quer ser enterrada de bruços. Em conversa por telefone, ela fala de sua relação com Chacrinha.

QUAL A IMPORTÂNCIA DE CHACRINHA DA SUA VIDA?
A Rita Cadillac só existe por causa do Chacrinha. Ele foi importante em todos os aspectos de minha vida. Não só do profissional, mas do pessoal também. Era um paizão, cuidava de mim.
ELE TINHA MESMO ESSA RELAÇÃO PROTETORA COM AS CHACRETES?
Ele queria saber tudo sobre nós, como estávamos, com quem a gente namorava, se o cara prestava...Nossos namorados ou maridos não podiam buscar a gente na porta do estúdio porque ele tinha medo que as pessoas confundissem as coisas e pensassem alguma coisa errada da gente.
COMO CHACRINHA ERA NOS BASTIDORES?
Muito bacana, conversava de tudo. Mas, na hora da palavra final, era sempre a dele.
VOCÊ ACHA QUE ELE FAZIA AQUELAS PALHAÇADAS DE FORMA CONSCIENTE?
Sim, claro. Ele tinha consciência do efeito de tudo. Mas também tinha um processo intuitivo forte.
POR QUE VOCÊ ACHA QUE FOI A ÚNICA CHACRETE A CONTINURA NA MÍDIA?
Acho que talvez ele tenha me dado mais projeção porque soubesse que eu tinha alguma coisa diferente...
VAI FAZER MAIS CINEMA PORNÔ?
Não, de jeito nenhum. Não é minha praia. Fiz somente por dinheiro e disse a todo mundo na época. Foi bacana mas foi só aquilo. Percebi que Rita Cadillac não precisava daquilo. Ela continua trabalhando bem.

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