sexta-feira, 2 de outubro de 2009

SEMANÁRIO CÍVICO, UM JORNAL PORTUGUÊS NA BAHIA.

FONTE: Ivan de Carvalho (TRIBUNA DA BAHIA).

Quando ainda dirigia o Centro de Estudos Baianos da Ufba, tive oportunidade de revelar à historiadora luso-brasileira Maria Beatriz Nizza da Silva a existência de dois jornais editados na Cidade do Salvador: Semanário Cívico e Sentinela Bahiense, que se encontravam na Biblioteca Frederico Edelweiss.
Sobre um deles, Sentinela Bahiense, escrevi um amplo texto, publicado em A Tarde e depois, na Série Centro de Estudos Baianos, sob o número 100.
Agora, tantos anos decorridos, recebo da Edufba um exemplar do livro "Semanário Cívico" - Bahia, 1821-1823, mais um presente para a historiografia brasileira. Especialmente voltado para as notícias da campanha da Independência do Brasil na Bahia, escrito por um redator português, é uma obra que mereser consultada pelos que se debruçam sobre o palpitante tema.
Coube à Profa. Dra. Isabel Lustosa, da Fundação Casa de Rui Barbosa, a apresentação do livro. Autora de obras de grande interesse para os brasileiros, dentre os quais: "Insultos Impressos: A guerra dos jornalistas na Independência (1821-1823), a historiadora é uma referência na apreciação de trabalhos históricos.
Por sua vez, o trabalho que circulava em Salvador pertence a historiadora competente e dedicada à pesquisa, Maria Beatriz Nizza da Silva. Além de produtiva, tem tratado de vários temas brasileiros, a exemplo de "Cultura e Sociedade no Rio de Janeiro" (1808-1821), lançado em 1977, obra marcante para os estudos de história da cultura e do cotidiano.
Portuguesa de nascimento, mas com longa vivência brasileira, Maria Beatriz é autora também da Gazeta do Rio de Janeiro, Primeira Gazeta da Bahia: Idade d´Ouro, editado em 1978 e reeditado em 2005, por meio de cujos estudos é possível conhecer a vida no Rio e na Bahia, no período joanino.
Quanto ao Semanário Cívico, retrata a sociedade e a política de Salvador de 1821 a 1823. Como patriota português, Silva Maia se interessava em defender a permanência das tropas do seu país em nossa capital, menosprezando o movimento da Independência do País. Como não poderia deixar de ser, seus argumentos eram os mesmos utilizados pelos periódicos portugueses, que se posicionaram a favor das cortes de Lisboa. Trocando em miúdos, tal postura era adepta da união do Brasil a Portugal, no pressuposto de que, sem Portugal, o Brasil teria destino sombrio.
Silva Maia era natural do Porto (Portugal) e chegou à Bahia em 1796, estabelecendo-se em Cachoeira: "vila muito populosa e considerável".
Constituiu família, advindo-lhe os filhos. Somente a 9 de julho de 1811, matriculou-se na Real Junta de Comércio do Rio de Janeiro. É sabido que se dedicava ao comércio de escravos.
Fundou os periódicos acima nomeados para defender os interesses pátrios. Segundo suas palavras: "O dever de um redator nas atuais circunstâncias deve ser não só instruir o povo e dirigir-lhe a opinião para os verdadeiros princípios constitucionais, como desmascarar a impostura, fazer a calúnia quando ouse levantar a voz para manchar a conduta de cidadãos honrados, que têm dado provas sobejas de sua probidade e de adesão à causa constitucional".
Somente a 12 de julho de 1821, José Joaquim da Maia faz referências expressas às correntes separatistas existentes na Bahia. Assim, o redator escreve que várias tendências surgiram, quebrando a harmonia anterior a 10 de fevereiro, na verdade várias seitas políticas, assemelhando-se às religiosas: realistas puros, realistas constitucionais, aristocratas, democratas, jacobinos ou anarquistas.
O levante de 3 de novembro de 1821 foi por ele comentado nos seguintes termos: "seriam pouco menos de 11 horas quando ouvimos grande alvoroço na ladeira da praça. Chegamos a uma das janelas laterais e vimos um grupo de homens, militares e paisanos, que não chegavam a 30, gritando em altas vozes: Viva a Constituição! Vivam as Cortes! Viva o novo governo, abaixo o atual".
Tema interessante é noticiado pelo redator, analisando o que se observava nas três vilas do Recôncavo, no início de agosto de 1822, a que denominou de "contradança" entre o Recôncavo e a cidade.
Em determinado momento, Silva Maia faz alusão aos moradores do Recôncavo, que haviam aderido a dom Pedro.
E num crescendo, vai informando, de acordo com seu ponto de vista, os fatos ocorridos na Cidade da Bahia. Alude ao fato de que, a 5 de dezembro de 1822, a guerra civil se instalara na Bahia, com o cerco da cidade. Alude aos inimigos internos e ocultos, no seu entender - mais perigosos do que os outros.
O jornal continuava noticiando todos os acontecimentos que se sucederam a essa data, relatando-os Silva Maia com elevado ardor lusitano e, consequentemente, em oposição aos nossos ideais de liberdade.
Recomendo aos interessados a leitura do Semanário Cívico – Bahia, 1821-1823. Versão apaixonada dos acontecimentos ocorridos nos anos: 1821, 1822 e 1823, narradas por um patriota português, serve de contraponto às versões brasileiras, repletas de heroísmo, que tanto nos engrandecem e valorizam.

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