FONTE: Erisson Rosati, especial para o iG Delas, TRIBUNA DA BAHIA.
O coração não escolhe por quem nos apaixonamos e,
se por um acaso da vida, aquela pessoa incrível que você está conhecendo for
portadora do vírus HIV, o que fazer?
O que
você faria se descobrisse que a pessoa com quem você se relaciona e que
você ama tem o vírus HIV? Qual seria sua reação se ele lhe
contasse que está infectado e que, mesmo assim, deseja ficar ao seu lado?
Esse é
um dilema comum entre casais que se descobrem sorodiscordantes. O coração
não escolhe por quem nos apaixonamos. E, se por um acaso da vida, aquela
pessoa incrível que você está conhecendo for portadora do vírus, o que
fazer?
Foi
exatamente este o caso da recepcionista Eliane*, de 39 anos. Ela conheceu o
atual companheiro, Jorge*, de 42 anos, em um barzinho, por meio de amigos em
comum.
“Ele
trabalhava no escritório de um conhecido. Começamos a conversar e a
química foi imediata”. Antes, ela foi casada por 6 anos e ele teve um filho de
18 anos, fruto de um relacionamento aos 24 anos.
"Ele evitava contatos íntimos".
“Começamos
a sair. Primeiro, um cinema, depois, um restaurante. Nos
primeiros encontros, não rolou sexo, mas a coisa estava caminhando rápido.
Ficamos saindo por mais de um mês e ele sempre evitando contatos mais
íntimos. Um dia, ele veio em casa e resolveu conversar comigo. Ele me
disse que descobriu ser portador do vírus HIV há 4 anos e que fazia o tratamento
desde então”.
No
começo, Eliane ficou obviamente surpresa, mas resolveu continuar se
encontrando com Jorge. Depois de conversar com um médico, ela decidiu que
iria ficar com ele. “Não queria me afastar dele e achei que seria bobagem
deixar passar a oportunidade por puro preconceito. Por isso, procurei o
médico que disse que, se eu usasse camisinha, não teria problemas”.
"Há muita desinformação".
“O
casal sorodiscordante deve ter uma vida normal. Se o soropositivo faz o
tratamento corretamente, toma os remédios e eles usam camisinha, não há
motivos para preocupações. A vida sexual e amorosa segue adiante, como de
qualquer casal”, explica a médica infectologista Paula Daher, do Hospital
Bandeirantes.
É
exatamente assim que Eliane e Jorge fazem. Eles estão juntos há dois anos
e pretendem alugar uma casa em breve. “Eu e ele somos muito parecidos. Nos
damos muito bem e não há motivos para não seguir adiante. As pessoas ainda
têm muito preconceito com a doença. Há muita desinformação. Por isso, ele
optou por não contar para a família, amigos ou no trabalho”, completa
Eliane.
Ética da verdade e camisinha.
Para o
psicólogo Leonardo Barros, da ASBH, o preconceito aumenta a
insegurança quando o portador pensa se deve contar ou não sobre a doença.
Isso gera um medo de que, quando os outros venham a saber, rejeitem o
infectado. Isso é pior do que o próprio tratamento, pois causa uma pressão
muito grande sobre a pessoa, que acaba optando por esconder sua condição”.
De
qualquer forma, é preciso manter uma ética da verdade com o novo parceiro.
“Em um relacionamento, primeiro destacamos as qualidades para depois nos
abrirmos sobre nossos problemas e defeitos. Se evoluir para algo sério,
deve-se abrir o jogo”, completa o especialista. Lembrando que qualquer contato
íntimo, deve ser com camisinha.
Descoberta por acaso.
Foi
assim com Carlos* (26) e Renato* (24), que se conheceram pelo Facebook, por
meio de amigos em comum. A paquera evoluiu para encontros que se
tornaram cada vez mais constantes.
Após
seis meses juntos, os dois decidiram realizar o exame em uma unidade de
saúde. “A relação estava caminhando para algo mais sério e achamos
importante termos nossas sorologias em dia antes de prosseguirmos.
Sempre usamos camisinha e isso evitou que eu me contaminasse” – conta
Renato.
Carlos
então descobriu ser portador do HIV. “Foi terrível. Ele ficou arrasado e
me contou aos prantos. Ele não conseguia acreditar. Eu fiquei
completamente sem reação”. Renato ainda conta que tentou animar Carlos,
mas ele se fechou e preferiu se afastar do companheiro.
“Ele
ficou muito confuso e não sabia o que fazer. Ficamos separados por 3
meses. Nos falávamos sempre, sofremos muito, mas ele estava sempre muito frio,
triste, achava que a vida dele tinha terminado.”
Depois
de freqüentar um grupo de apoio e de ouvir a história de outras pessoas,
aos poucos, Carlos aceitou a sua condição. “Insisti para nos encontrarmos,
apesar da resistência dele, ele topou. Conversamos muito e decidimos
reatar o namoro. Gostava dele e queria muito tentar. Se eu deixasse a chance
passar, ficaria eternamente em dúvida”, completa Renato.
Sem sexo por um tempo.
É
exatamente a vontade de ficar junto que impulsiona o casal no momento de crise.
“O fato de ambos quererem continuar a história já é metade do caminho. O
restante é reconstruir a relação aos poucos, com muito diálogo e
sinceridade”, declara Leonardo.
Carlos
e Renato estão juntos há quase 3 anos. “Tivemos momentos difíceis.
Ele ficou sem querer fazer sexo comigo durante 4 meses depois que
voltamos. Aos poucos, ele percebeu que a vida poderia voltar ao normal e que
ele apenas deveria manter o tratamento”, conta Renato.
"Recomeçar
sempre é possível, mas é preciso que os envolvidos estejam
realmente disponíveis para lidar com a nova dinâmica da relação e superar
as dificuldades que encontrarão ao logo da vida", finaliza o
psicólogo.
Uma rotina normal.
Outro
ponto de preocupação entre os casais sorodiscordantes é a questão sexual.
Afinal, o vírus acaba afetando diretamente a vida na cama. “É importante
se prevenir. Mantendo a carga viral controlada, tomando a medicação
corretamente e usando camisinha, os riscos de contaminação são
praticamente nulos”, explica Paula.
Para
a médica, é importante o controle da chamada carga viral, um índice que
indica a quantidade de partículas do vírus presente no sangue do
infectado. Há casos em que a medicação é tão eficaz que a carga viral é
praticamente indetectável no exame. "Quanto menor a carga viral,
melhor a qualidade de vida do paciente e menor a chance de transmissão ou
problemas causados pelos vírus”, declara a profissional.
Por
isso, o portador do vírus deve manter uma vida saudável, alimentar-se bem e
praticar exercícios físicos. Os remédios disponíveis evoluíram muito e
hoje causam poucos efeitos colaterais. “A intenção é que a pessoa tenha
uma vida saudável e produtiva, tomando menos medicamentos e tendo menos
efeitos colaterais”, explica a médica.
Filhos.
Os
tratamentos para HIV evoluíram tanto que é possível até mesmo ter
filhos biológicos. Existem tratamentos tanto para homens quanto para
mulheres que desejam engravidar, que reduzem drasticamente a possibilidade
do feto ser contaminado. Para isso, é preciso um acompanhamento médico
rigoroso e tomar as devidas precauções para evitar contaminação.
“É
preciso que as pessoas entendam que o HIV é um vírus controlado. No entanto,
ele não tem cura. Por isso, é tão importante o uso da camisinha e a
realização de exames sorológicos constantes”, afirma a infectologista.
Segundo a médica, quanto mais cedo é feito o diagnóstico, mais simples é o
tratamento e melhor é a resposta do paciente à medicação.
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