O sinal amarelo acendeu
para a analista de mídias digitais Rosana H.*,
37 anos, quando a filha de 11 anos se preparava para a festinha de aniversário
de uma amiga. A menina retirava vestidos e mais vestidos do armário e não se
sentia satisfeita com nenhum. A mãe questionou: "Por que você não vai com
o florido? Você gosta tanto dele". A resposta: "Ele marca muito a
minha barriga."
Rosana, então, ponderou
que a barriga da menina não era saliente e que, mesmo se fosse, isso não a
impediria de ficar bonita e confortável. No fim das contas, a garota optou pelo
modelo mais escuro e largo que tinha no guarda-roupa. O episódio fez com que
Rosana, de maneira sutil, passasse a perguntar sobre as conversas que a filha
tinha com as amiguinhas e a reparar nas recusas constantes de coisas que antes
ela adorava, como sorvete.
Para a advogada Joana C*, 41 anos, o baque aconteceu em plena porta da
escola, quando a filha de 9 anos correu para os seus braços chorando porque era
"gorda", precisava fazer dieta e não pretendia jantar nunca mais,
porque "comer engordava". "Em princípio, achei que algum
coleguinha havia feito comentários pejorativos, porque ela é mesmo mais
cheinha. Mas ouvi que ela tinha comparado o próprio corpo com o das amigas e
notou que precisava ser como as outras. Isso doeu muito", revela Joana.
Influenciadoras
digitais e pressão social.
Situações como as
vividas por essas duas mães são recorrentes e têm acontecido com meninas cada
vez mais novas. Embora haja todo um movimento de autoaceitação entre mulheres
adultas, o fato é que os padrões de beleza ainda pregam que a silhueta esguia é
a ideal. E, hoje em dia, por causa do acesso à Internet e da valorização do
estilo de vida das influenciadoras digitais, as crianças são expostas mais cedo
à pressão social da aparência e da sua relação com o sucesso. E, com isso,
assuntos como dietas e calorias vêm ocupando o espaço em conversas de garotas
que não deveriam se preocupar com outras coisas a não ser brincar, estudar e viver
bons momentos com a turma e a família.
Como ajudar.
Tanto Rosana quanto
Joana buscaram a ajuda de especialistas e conseguiram que as dificuldades
iniciais das respectivas filhas não tomassem uma proporção maior e se
transformassem em transtornos alimentares, como bulimia e anorexia. Confira, a
seguir, alguns cuidados que mães e pais devem tomar se os filhos --sim, porque
há meninos com esse tipo de aflição, também -- começarem a se preocupar
excessivamente com a aparência e o peso:
- O primeiro passo, sem dúvida
alguma, é buscar a orientação de um pediatra. Esse profissional pode
diagnosticar se há ou não um sobrepeso e recomendar uma alimentação
adequada. Em alguns casos o tratamento é multidisciplinar, com o
acompanhamento de nutricionista e psicólogo.
- Qualquer dieta sem acompanhamento
tem riscos. Em se tratando de crianças, os prejuízos podem ser ainda
maiores, porque elas não têm maturidade para decidir o que é ou não
saudável.
- Incentive a criança a praticar
esportes ou a fazer atividades que combatam o sedentarismo. As horas
passadas na escola e o tempo gasto diante de telas (TV, celular, tablet)
fazem com que o corpo tenha menor gasto energético. Não espere a
adolescência bater à porta para mudar os maus hábitos, pois nessa fase
eles são mais arraigados e, portanto, mais difíceis de abandonar.
- É preciso estar atenta a mudanças
de atitude e em relação à alimentação da criança (evitação e recusa de
certos alimentos), além de alterações de peso e comportamento social.
Também é importante acompanhar de perto as redes sociais e os conteúdos
virtuais que a filha acompanha.
Filhas imitam as mães.
As mães precisam estar
atentas às próprias referências, pois ela é a primeira referência da filha. Uma
mãe que dá importância considerável à "aparência perfeita" e à opinião
alheia pode estar contribuindo, mesmo sem querer, para um comportamento
disfuncional da filha. O ideal é valorizar as habilidades, a características
positivas e mesmo, fisicamente, aquilo que a filha possui de bacana. Ao ser
valorizada, a criança fortalece seu auto-conceito e aprende a conviver com seus
defeitos também. Outro ponto fundamental é não projetar frustrações estéticas
na filha, policiando a criança ao extremo ou, ao contrário, forçando-a a se
alimentar excessivamente porque a mãe não "pode" comer.
Quanto antes um
distúrbio alimentar for identificado, mais rápida e eficiente a cura. A parte
emocional é trabalhada precocemente e, com isso, alguns conflitos podem acabar.
Porém, é bom lembrar: pessoas com tendência a distúrbios de imagem e baixa
autoestima são mais vulneráveis e necessitam muitas vezes de acompanhamento
mais de perto ao longo da vida. As preocupações podem ressurgir em outros
momentos, inclusive na forma de depressão, por isso é essencial ficar de olhos
bem abertos com frequência.
*Os
sobrenomes foram suprimidos a pedido das entrevistadas, para preservar a
identidade das crianças.
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