FONTE: Chris Bueno (noticias.uol.com.br).
O cocô pode ser
considerado um assunto engraçado, desagradável ou tabu, mas na verdade ele
deveria ser levado mais a sério. O aspecto das fezes – sua cor, forma e
consistência – pode refletir a qualidade da alimentação, indicar falta de
vitaminas e proteínas, e até mesmo alertar para a presença de alguma doença.
Por isso, prestar atenção nas fezes pode ser tão útil quanto checar a
temperatura corporal ou a pressão sanguínea.
"Considerando
que saúde não é apenas a ausência de doenças, mas sim a contínua sensação de
bem-estar, podemos afirmar que saúde intestinal é fundamental para a saúde de
todos os outros órgãos", aponta Fernando Gomes Romeiro, professor de
Gastroenterologia do Departamento de Clínica Médica na Faculdade de Medicina da
Unesp (Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho). Isso fica
evidente quando há algum problema no intestino: pessoas com o intestino doente
geralmente apresentam mudanças, inclusive de humor e de personalidade. Isso
acontece porque é no intestino que temos a maior concentração de neurônios fora
do sistema nervoso central –o que explica a dificuldade em manter qualquer
sensação de bem-estar sem a saúde intestinal.
Por ser um assunto
que a maioria das pessoas não se sente muito à vontade para discutir, não é
raro que o problema cresça até ficar mais grave. "Se não conversamos sobre
isso com quem gostamos, fica mais difícil falar com quem não conhecemos, então
é comum que as pessoas sofram sozinhas com o problema", diz o
gastroenterologista Fernando Romeiro. O preconceito ou a vergonha acabam se
somando ao desconhecimento da extensão de consequências que um intestino
afetado pode causar. "Problemas intestinais podem afetar pele, cabelos,
unhas, sangue, fígado, estômago e praticamente qualquer outro órgão", diz
Romeiro. "Por isso o diálogo sobre esse assunto sempre deve ser
estimulado."
Processo importante.
As fezes nada mais
são do que resíduos de alimentos não digeridos, bactérias da flora intestinal e
produtos da descamação do nosso intestino que se renova diariamente. O processo
começa quando o alimento entra na boca: a mastigação, a saliva, a contração dos
músculos gastrointestinais, as bactérias, o ácido clorídrico, as enzimas
digestivas, a bile e outras secreções agem em conjunto num complexo processo
que transforma a comida em uma massa chamada quimo. Os nutrientes são
absorvidos ao longo do tubo digestivo, enquanto as partes não aproveitadas
seguem em frente até o intestino grosso, onde se misturam com água e formam o
bolo fecal, ou seja, o cocô.
Se o processo seguir
tranquilamente até o final, é uma visita saudável ao banheiro. "Um
intestino saudável, com bom funcionamento, é reflexo de bom funcionamento do
aparelho digestivo como um todo, com a eliminação adequada dos resíduos sem
problemas de acúmulo", explica Bruno Zilberstein, professor de cirurgia do
aparelho digestivo do Departamento de Gastroenterologia da Faculdade de
Medicina da USP (Universidade de São Paulo). "É o que chamamos de
equilíbrio orgânico adequado".
Só em casa.
O contrário,
infelizmente, também é verdade. Ficar um bom tempo sem ir ao banheiro causa uma
série de problemas bem desagradáveis, como dor abdominal, sensação de inchaço,
irritabilidade, indisposição e alterações no apetite e no humor. Quem tem
intestino preso ou prisão de ventre sabe bem como é. A constipação (ou
obstipação) intestinal –nome médico para o problema – acontece quando a pessoa
evacua menos de duas vezes por semana ou quando o esforço para evacuar é grande
demais e pouco produtivo.
As causas mais comuns
costumam ser uma dieta pobre em fibras, pequena ingestão de líquidos,
sedentarismo e consumo excessivo de proteína animal e de alimentos
industrializados. O fator comportamental também entra na conta. Muitas pessoas
não conseguem usar o banheiro em locais públicos –muitas vezes porque se sentem
desconfortáveis e constrangidas para fazer isso fora do ambiente acolhedor do
lar. Os médicos avisam que é um péssimo hábito. Em primeiro lugar, quanto mais
tempo os resíduos alimentares permanecem no intestino, mais secos e duros eles
ficam --o que os torna mais difíceis de expelir. Segundo: com o tempo, o
intestino acaba se acostumando e diminuindo a frequência de "visitas"
ao banheiro. Portanto, aquela história de "eu não consigo ir ao banheiro
fora de casa" pode acabar criando um problema bem complicado.
Outros fatores
emocionais, como estresse, depressão e ansiedade também são capazes de
interferir nos hábitos intestinais.
Quanto mais, melhor?
Não ir ao banheiro é
ruim, mas ir ao banheiro muitas vezes pode ser ainda pior. A diarreia é sinal
de que os alimentos e seus nutrientes estão se movimentando muito rápido pelo
corpo e não estão passando tempo suficiente no intestino --o que causa aumento
do número de evacuações e a perda de consistência das fezes, que se tornam
aguadas.
A causa mais comum da
diarreia é a gastroenterite viral ou o vírus intestinal. Consumir água ou alimentos
contaminados pode causar evacuações frequentes. Contudo, a diarreia pode ser
sintoma de várias doenças, como úlcera gastrointestinal e alguns tipos de
câncer, por isso é importante procurar assistência médica --especialmente se a
diarreia não melhorar em um ou dois dias e se houver presença de sangue nas
fezes.
Cor é tudo.
Além da frequência de
visitas ao banheiro, a cor, o formato e a textura das fezes também são
importantes indicativos da saúde do intestino –e de todo o corpo.
As fezes normais devem
ter coloração acastanhada e textura moldada e macia. Apesar de haver uma grande
variação de tons conforme a dieta de cada pessoa, alterações muito grandes
nesse padrão podem sinalizar problemas.
Pequenas bolinhas
isoladas podem indicar falta de fibras na alimentação. A presença de sangue,
muco e pus pode ser sinal de um intestino está inflamado. Fezes compridas e
finas são causadas por esforço excessivo, e se o problema persistir por
semanas, pode indicar a presença de um câncer no reto, pois o tumor vai se
expandindo e estreitando a cavidade do cólon. "Em todas essas situações
que saem do padrão normal, é preciso procurar ajuda médica", alerta
Fernando Gomes Romeiro, do Departamento de Clínica Médica na Faculdade de
Medicina da Unesp.
A cor também pode ser
indicativa de que algo não está funcionando bem. "Na maioria das vezes, a
coloração está relacionada com o tipo de alimento, mas às vezes pode ser
consequência de sangramento gástrico ou intestinal, doenças do fígado",
aponta Bruno Zilberstein, da Faculdade de Medicina da USP. "A perda de
gordura nas fezes indica quadros de falta de absorção intestinal e
infecções."
A cor das fezes pode
variar pontualmente, de acordo com a dieta. É o caso da ingestão de beterraba,
que torna as fezes mais avermelhadas ou com um tom castanho mais escuro, por
exemplo. Atenção, porém, para colorações que devem ser sinais de alerta. Se as
fezes estiverem "pálidas", por exemplo, pode ser sinal de que a
vesícula não está funcionando adequadamente, ou de que há presença de cálculos
biliares. Se a cor for castanho-avermelhada, pode ser consequência de
sangramento no trato digestivo inferior, um sintoma associado a câncer de
intestino. Já fezes negras podem indicar sangramento no estômago ou no
intestino delgado, provavelmente causado por uma úlcera.
Cuidando do intestino.
Ter hábitos saudáveis
se reflete diretamente na saúde do intestino. Manter o órgão funcionando
adequadamente todos os dias, além de ser um "alívio", também ajuda na
imunidade, absorção dos nutrientes, produção de vitaminas e manutenção da saúde
de todo corpo.
Para manter a saúde
do intestino, é preciso primeiramente ter uma alimentação balanceada, com
ingestão de muitas fibras e pouca gordura. As fibras absorvem líquido e ajudam
a formar o bolo fecal, que distende a parede do intestino e força a evacuação.
Já as gorduras são mais difíceis de serem digeridas, exigindo muito do tubo
digestivo.
A água também é
essencial no processo. "Como o intestino grosso é responsável pela
absorção de água, evitando que tenhamos grandes perdas de líquido pelas fezes,
se a pessoa toma pouca água o intestino tem que tirar o máximo possível das
fezes e elas podem ficar duras, levando a outros problemas", explica o
gastroenterologista Fernando Romeiro.
Existem hábitos que
fazem toda a diferença, como não fumar (o cigarro é associado a várias doenças
inflamatórias intestinais), comer devagar (a digestão começa na boca, e quanto
mais tempo o alimento ficar na boca, mais é digerido e melhor a absorção de
nutrientes no intestino) e também praticar exercícios físicos.
Os exercícios físicos
aumentam os movimentos peristálticos, por liberar hormônios que ativam o
processo e ajudam na movimentação do bolo alimentar pelo sistema digestivo.
"A atividade física, mesmo que de pouca intensidade, auxilia a propagação
das fezes dentro do intestino. Do contrário, se ficarmos muito tempo parados, o
intestino pode ter mais dificuldade pra fazer todo o trabalho sozinho",
diz Romeiro.
Tomando esses
cuidados, é possível garantir o bom funcionamento do intestino e evitar muitos
problemas de saúde. O seu organismo agradece.