FONTE: MARIANA VERSOLATO, DE SÃO PAULO (www1.folha.uol.com.br).
A maioria dos estudos favoráveis à terapia de reposição hormonal para tratamento da menopausa foi escrita por autores que têm ligações com a indústria de remédios.
Significa que pesquisadores pró-reposição declararam ter recebido pagamentos de laboratórios por palestras ou financiamento de estudos.
É o que revela uma revisão de 50 pesquisas sobre a terapia, publicadas por dez autores entre 2002 e 2006.
O período foi escolhido por causa da publicação do estudo Women Health's Initiative, em 2002, mostrando que a reposição aumenta riscos de câncer da mama e de doenças cardiovasculares.
Oito dos dez autores afirmaram ter recebido pagamentos da indústria. Dos 50 artigos analisados, 32 foram considerados favoráveis à terapia, entre os quais 30 foram escritos por autores com conflitos de interesse.
A análise foi feita por pesquisadores do Georgetown University Medical Center, em Washington, e publicada no "PLoS Medicine".
Segundo uma das autoras, a médica e professora de farmacologia da Georgetown University Adriane Fugh-Berman, tons promocionais em relação a drogas devem ser vistos com desconfiança.
"Promoção, em geral, é inconsistente com ciência. Pode significar uma influência do marketing da indústria sobre o artigo, mas isso é difícil de provar", disse à Folha.
César Fernandes, presidente da comissão de climatério da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetricia, diz que médicos devem ligar o "desconfiômetro" para esses estudos.
"É óbvio que há marketing agressivo das farmacêuticas, elas querem influenciar os médicos", diz Fernandes.
A existência dessas relações e as conclusões da revisão, porém, não desqualificam autores sérios nem colocam a eficácia do tratamento à prova, segundo Fernandes.
"Não estamos falando de pesquisadores irrelevantes. Será que não são os médicos mais consultados pelas empresas por suas contribuições para a literatura?"
Já Berman diz que eles são selecionados para palestras e consultorias porque o que dizem apoia a mensagem da indústria. "A indústria cria um falso consenso na comunidade médica porque vozes racionais são abafadas."
Mauro Haidar, chefe do setor de climatério da Unifesp, diz:"Se pensarmos assim sobre conflitos de interesse, não tem congresso. E há de ter a mesma desconfiança em relação a outras drogas."
SOB MEDIDA.
Alguns dos argumentos presentes nos estudos favoráveis dizem que os testes clínicos não devem guiar tratamentos individuais.
Alguns dos argumentos presentes nos estudos favoráveis dizem que os testes clínicos não devem guiar tratamentos individuais.
É o que pensa Fernandes. "Medicina não é feita no atacado, e sim caso a caso. Não é prêt-à-porter, é alta costura."
Segundo ele, é preciso pesar a história da paciente, gravidade dos sintomas e prós e contras do tratamento.
"Nenhum remédio é bonzinho. Sempre há riscos, mas eles têm que ser informados", diz Fernandes.
Para a autora da pesquisa, a reposição só é útil se os sintomas da menopausa forem muito incômodos.
"Funciona bem para algumas, mas deve ser usado apenas em casos graves, ou os riscos superam benefícios."
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