FONTE: Patrícia Colombo, Do UOL, em São Paulo (http://estilo.uol.com.br).
A atriz paulistana Tatiana Godoi, 42 anos, se
considera uma mulher livre, comunicativa e baladeira. Se conhece um homem
interessante em uma festa e pinta um clima, ela não vê problemas em ir para a
cama com o novo parceiro na mesma noite. No entanto, para que isso pudesse
acontecer, a atriz dependia de algumas caipirinhas e cervejas a mais.
"Nunca transei pelas primeiras vezes com alguém sem que tivesse bebido. Se
estivesse sóbria, ficava tímida, nervosa e rolava um bloqueio", conta.
O "bloqueio" a que Tatiana se refere é
mais comum do que se imagina. Muitas pessoas têm dificuldade em lidar com a
entrega e a intimidade que o sexo exige e, para lidar com o problema,
desenvolvem uma relação entre beber e transar. Os motivos são dos mais
variados: insegurança, criação conservadora, um trauma do passado, medo de
falhar na hora H. E aí, mediante tantas questões, só mesmo aquela aparente
"autoconfiança" que o álcool traz para que o tesão fale mais alto.
"Quando
é recorrente e em excesso é perigoso"
Tatiana conta que a bebida sempre fez parte das preliminares em sua vida
sexual. Foi assim desde os 18 anos, quando perdeu a virgindade. "Minha
primeira vez não foi nada romântica. Eu estava nervosa, bebi bastante e, um
tempo depois, descobri que o cara tinha namorada", recorda. "Depois dessa
decepção, passei a beber mais antes de transar com alguém. Fazia isso para me
soltar, porque eu me cobrava demais. Tinha que ser boa de cama para conquistar
o cara".
"Para muitas pessoas, esse momento de estar
frente a frente com o parceiro é um momento de prova, de estar sendo avaliado
pelo outro", explica o terapeuta sexual Amaury Mendes Júnior, professor do
Ambulatório de Sexologia da UFRJ. "Não há problemas em beber um pouquinho
para aliviar a ansiedade e a insegurança. Mas quando é recorrente e em excesso,
é perigoso".
Bebida ajuda a se soltar, mas limita o prazer.
O terapeuta explica que o sexo casual acaba
aumentando a necessidade do consumo da bebida para transar. "Existem três
fases do sexo. Primeiro vem o desejo, que é mais subjetivo e tem a ver com a
imaginação; depois a da excitação, que é mais física, falando no envolvimento
entre os dois indivíduos; e o orgasmo", argumenta. "As pessoas ficam
tão ansiosas com a coisa da performance para serem prestigiadas que elas querem
ter a excitação sem ter o desejo. Não há a produção erótica. Daí, ela precisa
estar alcoolizada para chegar de cara e ter uma relação sem ter um preparativo.
É um fenômeno social. Elas saem à noite para que aconteça alguma coisa."
A bebida, segundo o terapeuta, ajuda a pessoa a se
"soltar na cama", mas também limita o prazer. "É como se a
pessoa precisasse estar anestesiada. Se você se encontra assim no momento da
transa, está limitado na questão sensorial, não usufruindo das sensações que o
sexo pode proporcionar".
"Aprendi a ter uma conduta mais sadia em
relação ao sexo".
A
jornalista Fernanda*, 34 anos, conta que perdeu
a virgindade aos 14 anos e, desde então, nunca ligou muito para a questão da
conexão com o outro na hora do sexo. Bebia para transar e transava porque bebia.
"Chegou um momento na minha vida, lá pelos 18, que comecei a precisar
encher a cara para ficar com alguém. Foi assim por uns 10 anos. Até que fiquei
com uma menina, com quem me envolvi mais profundamente”, diz. "Essa
relação me fez descobrir que, por anos e anos, eu fazia alguma outra coisa que
me nego a chamar de sexo."
Fernanda
não se define como homossexual, pois ainda está tentando compreender sua
situação. Hoje, fica mais com mulheres do que com homens, porém destaca que, em
todos os casos, transa sem precisar beber. “Aprendi a ter uma conduta mais
sadia em relação ao sexo. Se eu tivesse que definir o que eu fazia antes, diria
que era um comportamento bastante destrutivo. Mas eu vi que não adiantava eu
ficar disfarçando vontades com álcool porque eu simplesmente ia deixar de viver
coisas boas, como vivo hoje”, afirma.
Durante o
período, ela conta que não teve nenhum relacionamento mais sério, mas, mesmo
com os rapazes com quem transou mais de uma vez, atrelou a experiência à bebida
em todos os momentos. Há dois anos Fernanda passou a se incomodar com o
comportamento. “Hoje em dia eu evito. Já disse 'não' numa oportunidade em que
eu queria, sim, mas preferi evitar transar bêbada para não recair.”
Nem
caretice, nem moralismo.
Para a
psicoterapeuta Lúcia Rosenberg para romper com esse padrão nocivo de associação
entre sexo e bebida, é preciso conectar-se com seu próprio tesão e até procurar
terapia. Segundo ela, não precisa ser a ajuda específica de um terapeuta sexual
porque, nesses casos, o sexo é apenas uma sequela para problemas mais profundos
como baixa autoestima, autoimagem deturpada, carência ou insegurança.
"O gatilho dessa necessidade de consumir álcool para transar é a falta de intimidade que se tem nesses encontros casuais", afirma a profissional. "O álcool aparece na tentativa de tampar esse buraco da intimidade que não deu tempo de construir. Não se trata de ser careta nem moralista. Às vezes, a necessidade de intimidade é não só com o outro, como também com o seu próprio desejo", explica. "A gente transa porque a gente quer transar e não porque apenas o outro quer. E esse tesão é muito mais poderoso do que qualquer bebida."
"O gatilho dessa necessidade de consumir álcool para transar é a falta de intimidade que se tem nesses encontros casuais", afirma a profissional. "O álcool aparece na tentativa de tampar esse buraco da intimidade que não deu tempo de construir. Não se trata de ser careta nem moralista. Às vezes, a necessidade de intimidade é não só com o outro, como também com o seu próprio desejo", explica. "A gente transa porque a gente quer transar e não porque apenas o outro quer. E esse tesão é muito mais poderoso do que qualquer bebida."
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