FONTE: DONALD G. McNEIL Jr., DO "NEW YORK TIMES" (noticias.uol.com.br).
Em todo o mundo, uma ampla maioria das
vítimas da Aids é de homens. Mas a África há muito tempo tem sido a gritante
exceção: quase 60% são mulheres. E, embora haja muitas teorias para isso,
ninguém conseguiu provar nenhuma.
Numa clínica nesta zona rural da
Província de KwaZulu/Natal, na África do Sul, infectologistas noruegueses
acreditam ter encontrado uma nova explicação.
Se for correta, uma solução de baixo
custo pode prevenir milhares de contaminações por ano.
A equipe acredita que as africanas
sejam mais vulneráveis ao HIV devido a uma doença parasitária crônica e não
diagnosticada: a esquistossomose genital.
A doença é provocada por vermes
parasitas que habitam rios infestados. Ela se caracteriza por feridas no canal
vaginal, as quais podem facilitar a entrada do HIV, o vírus que provoca a Aids.
A médica Eyrun Kjetland, que lidera a
equipe, diz que a doença é mais comum do que a sífilis ou o herpes, que também
podem abrir caminho para o HIV.
Além disso, os ovos e vermes nas
feridas atraem células CD4, o tipo atacado pelo vírus da Aids.
Os vermes podem ser eliminados com uma
droga que custa US$ 0,08 (R$ 0,18) por comprimido. A equipe de Kjetland tenta
determinar se o medicamento irá curar as feridas em mulheres jovens.
Alguns especialistas em Aids questionam
a teoria da esquistossomose, observando que mulheres criadas longe de águas
infestadas também morrem de Aids.
Mas os defensores da teoria argumentam
que, há 20 anos, muitos eram céticos em relação à ideia de que a circuncisão
protegia os homens contra o HIV. Até que em 2006 testes clínicos provaram que a
tese estava correta.
A esquistossomose "é,
possivelmente, o cofator mais importante na epidemia de Aids na África",
disse Peter Hotez, da Escola Nacional de Medicina Tropical, ligada à Faculdade
de Medicina Baylor, em Houston (Texas). "E é uma questão da saúde
feminina."
Líderes das duas agências que financiam
a luta global contra a Aids querem mais provas antes de mudarem suas campanhas
atuais, voltadas para preservativos, medicamentos e circuncisão.
"Precisamos rastrear todas essas
coisas e ver o que é uma causa e o que é apenas ter outra doença ao mesmo
tempo, como câncer do colo do útero", disse Mark Dybul, do Fundo Global de
Combate à Aids, Tuberculose e Malária.
O médico Eric Goosby, que foi
coordenador do Plano Emergencial do Presidente dos EUA para o Alívio à Aids
(Pepfar, na sigla em inglês), concorda que feridas vaginais podem contribuir
para a entrada do vírus.
Mas disse que "muitas mulheres que
têm o HIV não têm esquistossomose, e vice-versa".
Estima-se que 200 milhões de africanos já
tiveram esquistossomose. Embora raramente seja fatal, em crianças o sangramento
pode levar a anemia, atrofia e problemas de aprendizagem.
A doença é causada por minúsculos
vermes que emergem com cabeças pontiagudas, capazes de penetrar na pele de
pessoas que apanham água ou lavam roupas.
Uma vez dentro do organismo, os vermes
se acasalam. Muitos se aninham no trato urinário -urina com sangue é o sintoma
clássico-, mas alguns vão parar na vagina, criando "retalhos
arenosos" de tecido danificado e ovos calcificados dos vermes.
Estudos já mostraram que mulheres com
esses "retalhos" têm o triplo de probabilidade de serem contaminadas
do que as demais.
Salim Abdool Karim, pesquisador
sul-africano da Aids, está cético. Sua equipe acompanha mais de mil mulheres
numa área a 65 km de Otimati, com incidência de HIV igualmente elevada.
"Estudamos detalhadamente os
tratos genitais há 20 anos, fotografando-os sequencialmente", disse ele,
"e não vemos retalhos arenosos". Ao ouvir isso, Kjetland disse que
"eles não estão procurando nos lugares certos".
Lutar contra a esquistossomose na
África exigiria um amplo esforço para a distribuição de comprimidos. De acordo
com Peter Hotez, a doença poderia ser erradicada a um custo de US$ 22,4 milhões
(R$ 49,5 milhões) por ano.
Em "A solução de US$ 0,32 para o
HIV", ele defende a entrega de quatro comprimidos de vermífugo para 70
milhões de crianças todos os anos. O valor é bem menor que a estimativa de US$
38 bilhões (R$ 84 bilhões) em gastos da Pepfar neste ano.
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