segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

CONCESSÃO DE EMPRÉSTIMO A EMPREGADO PARA COMPRA DE VEÍCULO A JUROS SUBSIDIADOS...

FONTE: *** ÚLTIMA INSTÂNCIA.
Já houve discussão na Justiça do Trabalho, em uma reclamação trabalhista, sobre a questão da caracterização ou não de salário utilidade de parcela auferida indiretamente pelo empregado, na forma de juros subsidiados de empréstimo concedido para aquisição de automóvel.
Um trabalhador ajuizou reclamação trabalhista pretendendo o cômputo do empréstimo ao salário, para fins de cálculo de férias com 1/3, 13º salário e aviso prévio, sob a alegação de que foi favorecido pelo fato de haver efetuado o pagamento do veículo, pelos valores históricos, em um período de dois anos de alta inflação.
Inicialmente, o Tribunal Regional do Trabalho acolheu o pedido do trabalhador, sob o entendimento de que, apesar de o empréstimo por contrato de mútuo ser oneroso, o empregado foi beneficiado pelo fato de a operação ter sido realizada em bases financeiras subsidiadas pela empregadora.
A empresa interpôs recurso de revista para o Tribunal Superior do Trabalho sustentando que não configura salário in natura a concessão de empréstimos a seus empregados, a juros mais baixos, porque o mútuo é contrato sempre oneroso, mesmo com benefício de taxa menor.
O Tribunal Superior do Trabalho deu razão a empresa e reformou a decisão do Tribunal Regional, sob o fundamento de que as vantagens concedidas a título de financiamento e aquisição de veículos não tem relação com o fornecimento de utilidade ao trabalho, pois a empresa apenas facilitava a compra de veículos por seus empregados, sendo que estes se responsabilizavam pelo pagamento das prestações e quitação final do veículo, não sendo portanto gratuita, circunstância que descaracteriza a natureza jurídica salarial da parcela, conforme se vê da fundamentação do acórdão:
“2 MÉRITO
2.1 - INTEGRAÇÃO DO EMPRÉSTIMO
A discussão está vinculada à caracterização ou não de salário utilidade de parcela auferida indiretamente pelo empregado, na forma de juros subsidiados de empréstimo concedido para aquisição de automóvel. Conforme já referido, as decisões anteriores esposaram a mesma tese jurídica de que, não obstante a onerosidade ínsita ao empréstimo por contrato de mútuo, divisava-se efetivo benefício do empregado diante da operação com bases financeiras subsidiadas pela empregadora. Data venia do entendimento externado naquelas decisões, razão assiste à recorrente ao propugnar sua absolvição quanto à parcela.
Com efeito, dispõe o artigo 458 da CLT:
"Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações 'in natura' que a empresa, por força do contrato ou o costume, fornecer habitualmente ao emprego. (...)"
Comentando aludido dispositivo legal, asseverou ARNALDO SÜSSEKIND:
"O fornecimento de utilidades ao trabalhador, como contraprestação de serviços prestados, caracterizou a forma primitiva da remuneração do
trabalho; mas, com o surgimento de normas de tutela do trabalho, advieram restrições ao seu uso, motivo pelo qual somente é admitido como complemento da parte do salário paga em dinheiro. Todavia, a prestação in natura representa, igualmente, salário, desde que, como salienta a lei brasileira, seja fornecida 'habitualmente ao empregado', 'por força do contrato ou do costume' (art. 458 da CLT)." (In Instituições de Direito do Trabalho, vol. 1, pg. 362, 17ª edição, ed. LTR, São Paulo, 1997).
De sorte que, nem toda utilidade fornecida pelo empregador ostenta necessariamente natureza salarial. Para que componha o salário, faz-se necessário que o empregador forneça a utilidade de modo habitual e gratuitamente.
Ensina AMAURI MASCARO NASCIMENTO:
"Nem sempre as utilidades fornecidas pelo empregador ao empregado têm natureza de salário. É preciso distinguir. São salariais as utilidades fornecidas gratuitamente e continuadamente. Não são salariais as utilidades recebidas pelo empregado onerosamente, isto é, pelas quais ele paga.(...)" (In Iniciação ao Direito do Trabalho, ed. LTr, 11ª edição, pg. 275).
No caso dos autos não se verificaram os requisitos tipificadores do salário-utilidade. As vantagens concedidas a título de financiamento e aquisição de veículos não mostram qualquer relação com o fornecimento de utilidades ao trabalhador, a empresa apenas facilitava a compra de automóveis por seus empregados. Ademais, o reclamante assumiu a responsabilidade pelo pagamento das prestações e quitação final do veículo, portanto, nunca foi gratuita, circunstância que descaracteriza a natureza jurídica salarial da parcela.
O fato de ter descontados mensalmente de seus salários os valores relativos ao financiamento, já retira do benefício o caráter de gratuidade, necessário para o reconhecimento do pagamento in natura. E a alegada diferença entre os juros atribuídos ao seu empréstimo para aqueles operados no mercado, não implica necessariamente em ônus para a empresa, de forma que não lhe cabe qualquer direito a este título.
Assim, não ostentando natureza salarial, imprópria sua incorporação ao salário.
Pelo exposto, dou provimento ao recurso, para absolver a reclamada do condenação ao pagamento das diferenças de férias com 1/3, 13º salário e aviso prévio pela integração das diferenças de juros do empréstimo no salário”
Referido acórdão recebeu a seguinte ementa:
EMENTA: SALÁRIO IN NATURA – OPERAÇÃO DE EMPRÉSTIMO POR CONTRATO DE MÚTUO PARA AQUISIÇÃO DE VEÍCULO – JUROS SUBSIDIADOS. ONEROSIDADE. A natureza salarial da utilidade pressupõe fornecimento habitual e gratuito pelo empregador. De sorte que, não se constitui salário in natura a vantagem concedida pela empresa, consistente no financiamento subsidiado para a compra de veículo pelos empregados a título oneroso. Exegese do art. 458 da CLT (...)” (TST-RR-584.793/1999.3 – TST – 4ª Turma – Ministro Vieira de Mello Filho - Relator DJ de 15.09.2006)
Concordamos com o entendimento adotado pela 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, porque para que uma prestação in natura (bens ou serviços) configure salário utilidade é necessário que seja fornecida de modo habitual e gratuito. Além disso, a utilidade não pode ser necessária à prestação dos serviços.

*** Aparecida Tokumi Hashimoto, especialista em direito do trabalho, é sócia do escritório Granadeiro Guimarães Advogados.

2 comentários:

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