FONTE: Karina Toledo - Agência Fapesp, TRIBUNA DA BAHIA.
Especialistas em cardiologia estimam que até
80% das mulheres podem se tornar hipertensas após a menopausa. Para prevenir o
problema, a prática de exercícios físicos precisa ser incluída na rotina por
volta dos 40 anos de idade, muito antes da última menstruação acontecer.
O alerta foi feito pela pesquisadora da
Universidade Estadual Paulista (Unesp) Angelina Zanesco, que coordena uma
pesquisa cujo objetivo é desvendar os mecanismos biológicos responsáveis pelo
aumento da pressão arterial feminina nessa faixa etária.
Os primeiros resultados do estudo, que
tem apoio da FAPESP, foram apresentados durante a 28ª Reunião Anual da
Federação de Sociedades de Biologia experimental (FeSBE), realizada entre os
dias 21 e 24 de agosto em Caxambu, Minas Gerais.
“Muitas mulheres começam a se preocupar com
a atividade física somente após os 50 anos, quando a barriga começa a crescer.
Mas nossos resultados mostram que, para evitar o desenvolvimento da doença, a
intervenção precisa ser feita antes que ocorram as mudanças metabólicas e
hormonais da menopausa”, afirmou Zanesco.
Para chegar a tal conclusão, a
equipe do Laboratório de Fisiologia Cardiovascular e Atividade Física da Unesp
em Rio Claro (SP) avaliou em dois grupos de mulheres – pré e pós menopausa – o funcionamento do chamado sistema renina-angiotensina, um conjunto de
peptídeos, enzimas e receptores envolvidos no controle da pressão arterial.
“O sistema renina-angiotensina é responsável
por elevar a pressão arterial, principalmente por meio da constrição dos vasos
sanguíneos, e isso tem uma importância fisiológica. No caso de um acidente com
hemorragia ou de uma infecção generalizada, por exemplo, esse sistema impede
que a pressão arterial caia demais e o indivíduo desmaie. Mas quando o
mecanismo é ativado sem necessidade, acaba levando à hipertensão”, explicou
Zanesco.
Os pesquisadores coletaram amostras de
sangue de 42 mulheres com mais de 40 anos que ainda não estavam na menopausa e
de outras 32 que já estavam havia pelo menos 12 meses sem menstruar.
“Para ter certeza de que a voluntária estava
de fato na menopausa, medimos os níveis dos hormônios LH (hormônio
luteinizante) e FSH (hormônio folículo estimulante), que são marcadores da
falência ovariana”, explicou Zanesco.
Em seguida, mediram nos dois grupos os
níveis plasmáticos da enzima conversora de angiotensina e de diversos
peptídeos, como angiotensina 1, angiotensina II e a angiotensina 1-7. Os
resultados mostraram que, de maneira geral, o sistema renina-angiotensina
estava até 80% mais ativo no grupo de mulheres pós-menopausa quando comparados
às mulheres na perimenopausa.
“Quando comparamos apenas as mulheres
normotensas, pré e pós menopausa, não vemos grandes diferenças. Mas, quando
comparamos as hipertensas, o aumento na atividade do sistema
renina-angiotensina chega a 150%. Esses dados mostram que, se a mulher esperar
a menopausa para mudar seu estilo de vida, pode ser um pouco tarde e esse
sistema já estará ativado para causar uma patologia”, avaliou Zanesco.
Benefícios.
Desde meados da década de 1990, diversos
estudos têm mostrado os benefícios de exercícios aeróbicos no controle da
pressão arterial. O efeito também foi comprovado no experimento feito com 40
mulheres – 29 normotensas e 21 hipertensas – no Laboratório de Fisiologia
Cardiovascular e Atividade Física da Unesp.
Após dois meses de treinamento na
esteira, que incluía três sessões de 40 minutos por semana, em ritmo moderado,
houve redução da gordura
abdominal de aproximadamente três centímetros. Além disso, a
pressão arterial das normotensas caiu 4 milímetros de mercúrio e a das
hipertensas, 7 milímetros de mercúrio.
“Seria o equivalente a descer de uma pressão
de 13.2 para 12.5, por exemplo. É uma redução importante para um período tão
curto e o suficiente para reduzir em 40% o risco de infarto do miocárdio e
acidente vascular cerebral”, afirmou Zanesco.
No momento, os pesquisadores tentam
descobrir por meio de quais mecanismos biológicos a atividade física ajuda a
regular a pressão. A primeira suspeita, que não se confirmou, estava
relacionada à redução nos níveis de cortisol e de testosterona.
“Sabemos que o cortisol, o hormônio do
estresse, é produzido e liberado pelo tecido adiposo visceral. Achávamos que
reduzindo a gordura da barriga haveria redução no nível de cortisol, mas não
foi o que observamos”, contou Zanesco.
Os níveis plasmáticos de testosterona – que
já foi relacionada em estudos anteriores ao aumento da pressão arterial na
menopausa – também ficaram inalterados após o período de treinamento físico.
“Agora vamos iniciar uma nova leva de
experimentos e medir outros biomarcadores, como óxido nítrico e GMP (guanosina
monofosfato) cíclico, que são agentes vasodilatadores”, contou.
Outra hipótese a ser investigada é a de que
a atividade física estimula a liberação de enzimas antioxidantes, como
superóxido dismutase (SOD) e catalase (CAT), o que promoveria a redução do
estresse oxidativo e ajudaria a reduzir a pressão arterial.
Por último, serão avaliados mediadores
inflamatórios – como a proteína C reativa, produzida pelo fígado, e
interleucinas produzidas pelo tecido adiposo visceral –, que podem ser a gênese
do problema.
“Se conseguirmos entender os mecanismos da
hipertensão nessa faixa etária poderemos encontrar meios para prevenir mais
eficazmente o problema. Além de melhorar a saúde da população, isso reduziria
muito os gastos do sistema de saúde”, avaliou Zanesco.
Segundo dados da Sociedade Brasileira de
Cardiologia (SBC), a hipertensão é responsável por 40% dos infartos, 80% dos
derrames e 25% dos casos de insuficiência renal terminal.
De acordo com a Diretriz Brasileira sobre
Prevenção de Doenças Cardiovasculares em Mulheres Climatéricas e a Influência
da Terapia de Reposição Hormonal (TRH) da SBC e da Associação Brasileira do
Climatério (Sobrac), até os 55 anos há um maior percentual de homens com
hipertensão.
Dos 55 aos 74 anos, o percentual de mulheres
é discretamente maior. Acima dos 75 anos, o predomínio no sexo feminino é
significativamente superior. Os especialistas que formularam a diretriz estimam
que cerca de 80% das mulheres, eventualmente, desenvolverão hipertensão na fase
de menopausa.
De acordo com o levantamento Vigitel 2011
(Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito
Telefônico), do Ministério da Saúde, a hipertensão arterial atinge 22,7% da
população adulta brasileira. A frequência da doença avança com o passar dos
anos. Se entre 18 e 24 anos apenas 5,4% da população relatou ter sido
diagnosticada hipertensa, aos 55 anos a proporção é 10 vezes maior, atingindo
mais da metade da população (50,5%) estudada. A partir dos 65 anos, a mesma
condição é observada em 59,7% dos brasileiros. Diferentemente dos dados
apontados pela diretriz da SBC e da Sobrac, o Vigitel indica que a maior
frequência de diagnóstico em mulheres ocorre em todas as faixas etárias.