FONTE: TRIBUNA DA BAHIA.
Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sauza é
tradutora.
Por
motivos de saúde, estou tendo que me abster de duas coisas que adoro: chocolate
e sorvete. Sei lá se vale a pena, na minha idade, me privar do que mais gosto.
Para viver mais um tantinho? Na verdade, o que me leva a obedecer meu médico e
grande amigo é respeitar meu filho e não dar a ele mais trabalho do que
normalmente os idosos já dão aos seus.
Mas
juntar a esse sacrifício a dor de ver o Brasil caminhar a passos largos para um
buraco sem fundo? Saber que as crianças que amo não terão o país de nossos sonhos,
um país limpo e decente, mas o país dos enrascados nas teias da corrupção?
Não,
não estou biruta. Não estou misturando as estações. Estou usando toda a minha
sinceridade para tentar convencer quem me lê que estamos jogando fora, sem
pejo, a maior bênção que Deus podia nos dar, a nós que talvez não a
merecêssemos, por desprezar toda a luta que foi chegar até aqui, tudo pelo que
passamos, tudo que sofremos.
Como
assim? Simples: se não lutarmos contra o abuso de poder que o Congresso quer
nos impor do modo mais abjeto. Que modo é esse? Votando justamente a Lei de
Abuso de Poder!
Não é,
como o nome pode sugerir, o abuso do poder do guarda da esquina contra o
moleque que fura um pneu. Ou que agride o sujeito que assalta um passante. Ou o
que destrata o infeliz que foi violento com sua amante ou seu irmão.
Não,
essa lei hedionda que está para ser votada na CCJ do Congresso Nacional quer
acabar com o poder da Operação Lava Jato, quer impedir os procuradores do
Ministério Público de levar a cabo as investigações sem as quais jamais nos
livraremos dos corruptos, dos malfeitores, dos safados.
A
começar pelo nome que confunde o povo. Abuso de Poder. O nome confunde pois o
projeto a ser votado no início de abril o que faz é ampliar o poder de quem não
merece ocupar uma cadeira no Congresso. Dá mais poder aos que não merecem
representar nosso povo, aos que ignoram o muito que o Ministério Público e a
Polícia Federal têm feito pelo Brasil.
A
Operação Carne Fraca entusiasmou os que fogem da Operação Lava Jato como o diabo
da Cruz. Houve erro ou precipitação em sua divulgação? Talvez tenha havido. Mas
queriam o quê? Que à vista do horror que é saber que os fiscais permitiam a
venda de carne podre a PF ficasse calada, preocupada com o golpe nas finanças
do Brasil e ignorando o que era servido nas mesas de nossas famílias?
Esse
projeto de Lei o que pretende é acabar com a Operação Lava Jato se, para nossa
infelicidade, conseguir vencer as barreiras que ainda há de enfrentar.
Querem, os próprios beneficiados, anistiar os que se
valeram do Caixa 2, que é crime, por mais que queiram “cobrir com o manto
diáfano da fantasia a nudez crua da verdade” (Eça de Queiroz).
Se não morrer na praia, como seria o ideal, o projeto deveria ser rebatizado: Lei do Abuso de Cinismo.
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