FONTE: RAFAEL GARCIA, DE SÃO PAULO (www1.folha.uol.com.br).
As bactérias
multirresistentes a antibióticos deixaram de ser problemas regionais para
tornarem-se uma crise global. Para solucioná-la é preciso incluir no debate o
setor agropecuário e a indústria farmacêutica, diz Carmem Lúcia Pessoa-Silva,
chefe do programa que cuida da área na OMS (Organização Mundial da Saúde).
Um relatório divulgado
pela entidade anteontem afirma que o problema é tão grave que ameaça levar a
medicina a uma era "pós-antibiótico", na qual "infecções comuns
e pequenos ferimentos podem matar". O documento lista as sete bactérias
multirresistentes que mais preocupam os sanitaristas e culpa o uso indiscriminado
desses remédios pelo fenômeno.
O emprego de
antibiótico sem necessidade faz com que bactérias desenvolvam resistência a
essas drogas em escala de poucos anos, por meio de seleção natural.
"Fizemos uma
análise minuciosa de toda a literatura médica existente e demonstramos que o
risco de morte para muitas das bactérias resistentes é pelo menos duas vezes
maior quando comparado com uma bactéria susceptível a antibióticos", diz
Pessoa-Silva. "O tratamento que resta são combinações tóxicas de drogas
caras, e ainda assim o risco de morte continua elevado."
IMPACTO ECONÔMICO.
O aumento do custo de terapias, segundo a OMS, representa só um quarto do impacto econômico do problema. O resto se dá por meio da incapacitação de vítimas para trabalhar. O Fórum Econômico Mundial estima que infecções resistentes podem reduzir o PIB de um país em até 1,6%.
O aumento do custo de terapias, segundo a OMS, representa só um quarto do impacto econômico do problema. O resto se dá por meio da incapacitação de vítimas para trabalhar. O Fórum Econômico Mundial estima que infecções resistentes podem reduzir o PIB de um país em até 1,6%.
Para a OMS, o abuso dos
antibióticos em humanos pode ser reduzido com melhores políticas de
diagnóstico, que previnam o uso da droga quando ela não é necessária.
Sanitaristas também
precisam intensificar programas de prevenção. Se uma droga é usada com menor
frequência, infecções resistentes demoram mais a aparecer, e laboratórios
ganham mais tempo para desenvolver uma nova molécula que a substitua.
Para cessar o uso
indiscriminado de antibióticos em animais, porém, será preciso levar o debate
para fora do meio médico, e trazer a agropecuária para a negociação.

"A OMS já está
discutindo isso com a FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e
Agricultura)", diz Pessoa-Silva. "O uso de antibiótico em animais,
principalmente o uso não terapêutico, para crescimento, precisa ser evitado.
Existe um uso maciço hoje na ração e na água de animais de corte e também na
piscicultura."
Segundo a epidemiologista,
um dos problemas do uso para engorda é que ele é feito em baixas doses, e isso
cria o ambiente ideal para o desenvolvimento de novas bactérias resistentes.
Outro problema que
compromete o tratamento de infecções causadas por novas bactérias é o
desinteresse da indústria farmacêutica em produzir drogas para uso conta
problemas agudos, como infecções, que têm menos potencial rentável do que
doenças crônicas, diz a OMS.
O próprio surgimento de
bactérias resistentes desencoraja laboratórios a investirem em pesquisa e
desenvolvimento para novos tipos antibióticos, que podem se tornar obsoletos
antes de dar retorno financeiro.
"Além disso, quando se produz um antibiótico eficaz, o ideal é preservá-lo, e não fazer marketing para que ele seja usado maciçamente, pois quanto mais intensamente ele é usado, mais rápido vamos perdê-lo", diz Pessoa-Silva. "O antibiótico, então, não pode mais ser visto como um bem comercial. Tem de ser visto como um bem público."
A OMS tem contatado
executivos da indústria farmacêutica para discutir soluções, diz.
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