quinta-feira, 20 de agosto de 2009

BARBEIRO FAZ 100 ANOS E SE TORNA MAIS URBANO...


FONTE: Noemi Flores (TRIBUNA DA BAHIA).

Há 100 anos o médico Carlos Chagas descobria a doença que leva seu sobrenome, transmitida pelo protozoário Trypanosoma cruzi, cujos principais vetores são os insetos da Ordem Hemiptera, Família Reduviidae, conhecidos popularmente por barbeiros, e que provoca problemas cardiológicos na pessoa infectada. Mas o cientista jamais poderia imaginar é que cada vez mais este inseto, tipicamente rural, está se urbanizando, pois estudos do Centro de Pesquisa Gonçao Muniz-Fiocruz-Ba (CPqGM) comprovam isto.
E também que haveria a cura da doença através do transplante de célula-tronco, cirurgia inédita no Brasil, realizada em 2003 na Bahia, descoberta pelo médico Ricardo Ribeiro, do Centro de pesquisa Gonçalo Muniz-Fiocruz-Ba e do Hospital São Rafael. Sobre a doença Ribeiro afirma que 70% das pessoas infectadas não vão morrer disto porque nunca vão apresentar os sintomas do mal. No entanto, os 30% restantes vão apresentar problemas cardiológicos que “podem ser controlados, mas infelizmente, por a maioria destas pessoas serem de classes menos privilegiadas, sem seguro de saúde, o SUS não fornece a medicação gratuita para estes pacientes”, lamentou.
O cientista disse ainda que é triste se constatar que o problema da doença é mais social porque quando o paciente é tratado, ele deve tomar mais de um remédio, que fica em torno de R$ 100 de gastos mensais e as pessoas não têm como adquirir o remédio e tornam a voltar ao hospital já com sintomas mais graves.
Diante destes fatores, o médico adiantou que, juntamente com a direção do Hospital São Rafael, “estamos criando um ambulatório no hospital só para atendimento de pacientes do SUS. Com a distribuição de medicamento”. Além disto, o cientista adiantou que está lutando para que o Ministério da Saúde considere a gravidade da Doença de Chagas e passe a fornecer gratuitamente a medicação através do SUS como o faz com outras doenças
Os sintomas da doenças, de acordo com o médico, insuficiência cardíaca, falta de ar quando se realizam pequenos e médios esforços, “batedeira” no coração que vão progressivamente piorando. No entanto, o cientista aconselha as pessoas tão logo sintam sintomas, devem procurar um médico, mas que não há motivo para sustos porque “cada caso é um caso e hoje dispomos de tratamento para a doença”, concluiu.
Estudos da Fiocruz mostram várias formas de transmissão.
O Programa Multi-institucional Interdisciplinar para o Estudo da Doença de Chagas em Salvador, desenvolvido recentemente pelos cientistas da Fiocruz-Ba, coordenado por Mitermayer Galvão dos Reis, diretor da Fiocruz, tendo como vice-coordenadora Sônia Gomes Andrade, executor Gilmar Ribeiro Jr., aponta que atualmente são conhecidos cerca de 120 triatomíneos capazes de transmitir o protozoário T. cruzi ao homem, seja pela via tradicional como por vias alternativas. Muitas destas vias vêm tendo papel importante na manutenção de novos casos em locais onde não há o vetor, em especial as transfusões de sangue.
Outra via que tem chamado a atenção é a via oral de transmissão, através de alimentos contaminados por fezes infectadas destes vetores.
Mostra ainda que recentemente na cidade do Salvador os relatos do encontro do Triatoma tibiamaculata em ocupações urbanas não param de crescer, fato preocupante quando se analisa o nível de infecção destes, que chega a ser de 70% nos passíveis de exame. Desta forma, estudos buscando o hábito e habitat destes vetores seria de fundamental importância para o entendimento dos processos que poderiam estar causando a aproximação destes insetos ao ambiente peridomiciliar. Sendo assim, é de fundamental importância também compreender as relações entre os reservatórios e parasitas, e em termos práticos, determinar os recursos alimentares dos triatomíneos é estar um passo à frente no possível processo de domiciliação destes vetores.
No relátorio destes estudos, consta que os vetores foram coletados em residências de diversas localidades da cidade do Salvador associadas com mata. “A grande maioria destes insetos têm sido identificados como T. tibiamaculata, grande parte infectados por Trypanosomas. O mesmo vem ocorrendo em complexos residenciais, de onde diversos moradores têm trazido exemplares do T. tibiamaculata coletados em suas residências. Atualmente, grande número de pessoas reside nas circunvizinhanças ou em invasões de áreas com possíveis riscos de ocorrência de triatomíneos na cidade.
Destruição do ecossistema aproxima mosquito.
É o que ocorre nas vizinhanças da Avenida Paralela, principalmente na área do Parque Metropolitano de Pituaçu (PMP), onde está havendo crescente urbanização, com a presença de empreendimentos habitacionais, luxuosas mansões e moradias precárias de invasão, que adentram os ecótopos naturais, aproximando assim os habitantes dos vetores silvestres do T. cruzi.”
Infelizmente este programa realizado pela Fiocruz atesta um dado que não é novidade para ninguém, “a destruição desses ecossistemas em estágio secundário (muitas vezes primário) de sucessão ecológica tem causado a escassez e o desaparecimento das fontes sanguíneas naturais dos triatomíneos silvestres. Estudos atuais indicam que os vertebrados são os animais mais afetados pela antropização, dados estes, também relacionados a aves. Em conseqüência ocorre a invasão das habitações humanas ou de seu peridomicílio por esses vetores em busca de alimentação sanguínea, expondo a população humana ao risco de contrair a doença de Chagas”.
Na conclusão do trabalho, os cientistas manifestam preocupação “acreditamos na necessidade da criação de um grupo multidisciplinar, interinstitucional capaz de realizar estudos de caracterização das cepas de T. cruzi isoladas de triatomíneos encontrados em complexos residenciais vizinhos aos remanescentes de Mata Atlântica da Avenida Paralela e adjacências, Salvador, Bahia, bem como avaliar o grau de infecção por tripanosomatídeos nestes vetores e as suas interações ecológicas, o que nos dará subsídios para enfrentar eventuais surtos ou mesmo a re-emergências da Doença de Chagas nesta cidade”.

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