"Eu realmente
aprendi a lidar com a dor", responde Ana Carolina Oliveira, de 33 anos,
com naturalidade, já na primeira pergunta sobre os 10 anos sem a filha Isabella
Nardoni. Ao jornal O Estado de S. Paulo, a mãe da menina diz que superou a
tragédia e refez a vida. Está casada, tem outro filho de 1 ano e (quase) 10
meses, Miguel, e faz planos de engravidar de novo. "A memória dela, para
mim, é eterna. Tenho saudade, é claro, mas hoje não é uma ferida tão
aberta."
O assassinato de
Isabella, em 29 de março de 2008, atraiu holofotes do Brasil inteiro e até
houve pedido para a Justiça transmitir ao vivo o julgamento. Parte da
repercussão se explica: o júri entendeu que os autores do crime foram o pai,
Alexandre Nardoni, e a madrasta, Anna Carolina Jatobá, condenados a 30 e 26
anos de cadeia, respectivamente. Os dois alegam inocência, e a defesa recorre
no Supremo Tribunal Federal (STF).
"Quem cometeu era
quem deveria protegê-la", afirma a mãe, que prefere mudar de assunto a
falar do casal. Concorda com a Justiça e acredita que os dois são culpados.
"Uma pessoa que comete um crime desses deveria ficar presa o resto da vida
dela", diz. "Deles, tenho dó."
Em duas horas de
conversa, Ana Carolina mostra ser extrovertida. É mais fácil vê-la fazer piada
do que chorar. Emocionou-se uma vez, ao contar que Isabella, estirada no
jardim, ainda estava viva quando ela chegou ao Edifício London, o prédio dos
Nardoni. "Acredito que me esperou para se despedir."
Família.
Isabella sorri em dois
porta-retratos na estante da sala. Na parte de baixo do móvel, estão um Fusca,
uma Kombi e mais carrinhos de brinquedo do irmão, Miguel, que não teve chance
de conhecê-la. Outra foto da garota decora a geladeira. "Isa, te amaremos
eternamente", diz a mensagem escrita nela. O apartamento fica a cerca de 1
km do London. "Meu marido trabalha ao lado do prédio", comenta Ana
Carolina, sem dar importância à coincidência.
Evitar dramalhão é um
traço recorrente do perfil de Ana Carolina que, nesses dez anos, chegou a ser
alvo de críticas por desconhecidos que a julgavam "fria". "A Isa
não gostava de me ver triste. Eu preciso seguir", ela dizia na época. Já
os amigos a descrevem como uma mulher "forte" e que tem
"dimensão da tragédia", mas optou por não se entregar. "Não
preciso aparecer chorando na TV para mostrar que sofri", afirma hoje.
No luto, ela ficou sem
comer, ganhou olheiras e evitou entrar no quarto que dividia com Isabella na
casa dos pais. Fez terapia por anos. Uma década depois, segue no mesmo emprego
de bancária. Também recebeu proposta para escrever um livro e, certa vez, negou
autógrafo a uma garota. "Não sou celebridade", justifica. "É
mais comum pedirem para dar um abraço. Aí, eu sempre dou."
O avô materno visita o
túmulo de Isabella todo domingo. A mãe, por sua vez, não costuma ir ao
cemitério "A memória dela é muito além de uma campa", diz Ana
Carolina, que é espírita, doutrina que crê em reencarnação e não sacraliza o
corpo. "Para um caso como o meu, é onde se encontra mais respostas."
Filhos.
Conheceu o marido
Vinicius Francomano, de 31 anos, às vésperas de ir estudar seis meses na
Califórnia, nos Estados Unidos. Eles se casaram em 2014: Miguel nasceu dois
anos depois. "Não houve menção a Isabella até o momento final, do beijo
dos noivos", conta o reverendo Aldo Quintão, que celebrou a cerimônia na
Catedral Anglicana de São Paulo. Nessa hora, tocou "Noites
Traiçoeiras", do Padre Marcelo Rossi, em homenagem à menina: "O mundo
pode até fazer você chorar/mas Deus te quer sorrindo".
"Tenho lembranças
boas, e não de sofrimento", afirma Ana Carolina, que guarda roupas,
calçados e brinquedos de Isabella. Entre eles, há um coelhinho de pelúcia com o
qual ficou abraçada no velório da filha. "Por coincidência, Miguel estava
brincado com ele outro dia."
As crianças, porém, não
são tão parecidas assim. Isabella era corintiana. Miguel, palmeirense. Ela,
quietinha, preferia ficar em casa e assistir a "Monstros S.A." ou
"Procurando Nemo", seus filmes favoritos. Ele, agitado (já foi parar
duas vezes na diretoria da creche), gosta mesmo de passear. "Sempre quis
ter três filhos. Quero engravidar, no máximo, até o ano que vem, mas ainda
preciso combinar com meu marido", ela ri.
Isabella morreu, aos 5,
no ano que seria alfabetizada. Tinha o sonho de aprender a ler. Miguel está na
fase de falar sem parar, imitando até propaganda. Outro dia, deixou todo mundo
de boca aberta quando a campainha tocou. "Ó, pancainha", disse,
trocando as sílabas. Isabella falava exatamente assim.
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