O
tema é prosaico, eu sei, mas quem não conhece o alívio, quase prazer, de deixar
sua bexiga se esvaziar quando ela já está mais do que esticada? A razão é que
segurar o xixi dá trabalho para o cérebro, além de deixar a gente ansioso e sem
conseguir pensar em outra coisa.
Urinar é algo que o cérebro
consegue fazer sem precisar de controle atento. Conforme a bexiga se enche de
urina, a informação sobre o seu estado de distensão é repassada pelos nervos
para a medula espinhal e dali para o centro de controle da micção na ponte do
cérebro. Assim que a bexiga fica cheia demais, esse centro inicia
automaticamente seu esvaziamento.
Mas fazer xixi a qualquer momento,
simplesmente porque a bexiga ficou cheia, não é considerado civilizado. Humanos
e cachorros aprendem rapidamente que xixi tem hora e lugar graças à
possibilidade de reconhecer a sensação da bexiga cheia e exercer controle
cognitivo sobre o centro pontino da micção.
Se a bexiga ficar cheia demais, não
tem jeito: os mecanismos de segurança falam mais alto e lá se vai a urina.
Mas,
até lá, o centro pontino da micção fica sob o controle do córtex pré-frontal,
que só permite a micção quando, além de necessária, ela for socialmente
aceitável e puder acontecer em lugar seguro.
O córtex pré-frontal, por sua vez,
exerce seu controle informado pelo córtex da ínsula, que representa, entre
outras sensações fisiológicas, a sensação da bexiga se enchendo. A ínsula
também repassa essa informação para o córtex cingulado, que monitora a situação
e dá o alerta para outras regiões do cérebro quando a coisa começa a ficar
crítica. Daí em diante, tudo em que se consegue pensar é no banheiro mais
próximo, enquanto o córtex pré-frontal segura as pontas, literalmente, mantendo
o centro pontino inibido.
Já no banheiro, e com bênção
pré-frontal, o centro pontino troca a atividade simpática, que mantém a bexiga
distendida e o esfíncter contraído, por ativação parassimpática, que contrai a
bexiga e relaxa o esfíncter, permitindo a passagem da urina.
Por isso fazer xixi é tão bom: além de ser um estado de ativação
parassimpática, que relaxa o corpo, ainda alivia seu córtex cingulado e o
pré-frontal, que estavam dando duro para mantê-lo tenso, no controle e em busca
de um banheiro. Daí o alívio mental de poder soltar o xixi. É como poder contar
um segredo e parar de sofrer a respeito. Aaaaah..
*** Suzana Herculano-Houzel,
carioca, é neurocientista treinada nos Estados Unidos, França e Alemanha, e
professora da UFRJ. Escreve às terças, a cada duas semanas, na versão impressa
de "Equilíbrio".
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