FONTE: Paula Moura, Colaboração para o UOL (noticias.uol.com.br).
Em situações
extremas, o estresse pode atingir um nível maior do que o corpo é capaz de suportar
e a ansiedade virar um trauma. Acidentes, assaltos, bullying, abuso sexual e
até mesmo pressão por tempo prolongado no trabalho ou no ano pré-vestibular
podem desencadear sintomas de trauma.
Os sintomas vão da
hipervigilância –tipo de ansiedade--, flash-backs de imagens ou pensamentos no
meio do dia, mudanças abruptas de humor e vergonha de si mesmo, entre outros. E
o quadro pode continuar por meses ou anos, com ataques de pânico,
"brancos" de memória, dificuldade para se comprometer, fadiga
crônica, depressão, problemas digestivos, dores crônicas, entre muitos outros.
Uma das linhas de
tratamento de trauma responsabiliza a falta de reação corporal à criação de
traumas, é a Somatic Experiencing (SE), criada pelo médico Peter Levine há
cerca de 45 anos.
Levine descobriu que
o sistema nervoso autônomo dos animais, diante de uma ameaça, vai disparar
respostas de luta ou fuga ou congelamento, aquela que for colocar o animal em
segurança o mais rápido possível. "Assim como os animais, nosso corpo
reage da mesma forma instintiva, mas ficamos traumatizados quando não deixamos
essas respostas se completarem", diz Angela Mestriner, terapeuta
especializada em SE.
De acordo com essa
abordagem, se durante um assalto ficamos congelados, e quando o perigo for
embora nós não deixarmos nosso corpo fazer a necessária descarga (por exemplo
tremer, chorar, sentir as emoções que surgirem), essas reações vão ficar presas
no nosso sistema nervoso e é quando o trauma se instala.
E por que não
extravasamos?
Para Angela, muitas
vezes não deixamos essas reações instintivas do corpo acontecerem por acharmos
que tem algo de errado com a gente ou ainda por vergonha. "Acabamos por
questionar essas reações ao invés de senti-las e permiti-las".
Tudo depende de como
meu corpo reagiu ou entendeu aquele evento. Quanto menos consigo reagir, mais
traumatizado eu fico, entro no lugar de impotência e incapacidade."
Angela
Mestriner, especialista em SE
Ela cita uma pesquisa
feita em um acidente de ônibus nos EUA. "As crianças que conseguiram ajudar
as outras não ficaram traumatizadas e as que ficaram paralisadas sem conseguir
reagir ficaram".
Permissão para deixar
que o corpo expresse aquilo que precisa após o evento traumático, portanto, é
uma das coisas necessárias para que não adquirir Transtorno de Estresse Pós
Traumático (TEPT), de acordo com a SE.
Além disso, o corpo
precisa se sentir seguro de que a ameaça terminou para poder se acalmar. Por
exemplo, ter certeza de que o ladrão não está mais perto. É importante também
ter consciência de que apesar de o tempo de ativar o corpo para a resposta ao
perigo é rápido, acalmar leva mais tempo.
Álvaro Genro,
psicólogo da Associação Brasileira do Trauma, explica que a SE trabalha com o
sistema nervoso autônomo, onde ficam registradas as emoções e as reações
instintivas, inclusive o trauma. Os registros traumáticos podem ser acessados
pelas sensações corporais. "Há pessoas que estão distanciadas dessa
autopercepção, mas não é impossível pouco a pouco ir trabalhando para que se
possa resgatar isso", ressalta.
"O mais
importante é a pessoa perceber que ela tem respostas corporais e que elas podem
conduzir a uma reciclagem da energia de um sofrimento num momento que ficou
congelada", diz. Segundo Genro, essa reciclagem traz energia de vida, na
capacidade de gostar, estar de bem com a vida, de estar num estado de bem-estar
mesmo numa dificuldade maior.
Movimento dos olhos.
Outras correntes da
psicologia também focam no tratamento acessando o cérebro reptiliano, como o
caso da Terapia EMDR, da sigla em inglês relativa a Eye Movement
Desensitization and Reprocessing (Dessensibilização e Reprocessamento por meio
dos Movimentos Oculares). Nessa abordagem, criada pela psicóloga americana
Francine Shapiro em 1987, os movimentos oculares são usados para processar as
lembranças traumáticas.
"Quando ocorre o
trauma, o sistema límbico fica hiperativado porque a amígdala fica
hiperativada", explica Roseane Ferreira, terapeuta de EMDR e gerente da
Trauma Clinic do Brasil. "O cérebro não consegue processar de forma adaptativa
o evento traumático, deixando a perturbação como se estivesse congelada,
empobrecendo a qualidade de vida do indivíduo".
Para a EMDR, o
registro do trauma fica armazenado nas redes de memórias em forma de
pensamentos, imagens, registros auditivos e sensações corporais. A terapia
simula o movimento que ocorre durante o sono REM, que tem a função de processar
experiências ocorridas ao longo do dia através da rápida movimentação bilateral
dos olhos. "O cérebro vai dessensibilizando os canais neurológicos de
forma cada vez mais adaptativa, dissolvendo a carga negativa ligada ao
trauma", diz a psicóloga.
Movimentos do corpo
também são trabalhados pelo Brainspotting, método que identifica fontes de dor
e trauma através dos pontos em que os olhos congelam e tremem, e a EFT
(Emotional Freedom Technique), cujo objetivo é desbloquear a energia estagnada
seguindo os meridianos da Medicina Tradicional Chinesa.
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