FONTE: Estadão Conteúdo, TRIBUNA DA BAHIA.
Para as duas médicas, o baixo índice de mulheres
na área é resultado de fatores como o preconceito de colegas na faculdade e no
mercado de trabalho.
Em seus 30
anos de carreira, a médica Beatriz Helena de Paula Cabral nunca enfrentou
discriminação por parte de pacientes, mas teve de conviver com a desconfiança
dos colegas homens. Até hoje vê alunas de Medicina serem desencorajadas a
seguir a mesma especialidade que ela e induzidas a pensar que o sucesso
feminino no campo é quase impossível. Dificuldades semelhantes são vividas pela
também médica Isabel Cristina Albuquerque Feitosa, de 42 anos. Em uma área
majoritariamente masculina, a cobrança sobre o desempenho profissional delas é
muito maior, dizem.
Beatriz
e Isabel fazem parte do grupo das 26 únicas urologistas mulheres que atuam no
Estado de São Paulo. De acordo com dados do Conselho Regional de Medicina
(Cremesp), essa é a especialidade com a maior predominância masculina. Dos
1.306 urologistas em atividade no Estado, 98% são homens.
"Ainda
somos poucas, mas esse número deve aumentar. Quando terminei a residência,
éramos apenas 1% dos urologistas. Isso se manteve por 20 anos, mas está
começando a mudar, até porque há cada vez mais mulheres se formando em
Medicina", opina Beatriz.
Isabel
também tem visto o interesse das mulheres pela urologia aumentar.
"Terminei a residência na Santa Casa de São Paulo há 14 anos e, depois
disso, não teve mais nenhuma mulher como residente em Urologia, mas acho que
daqui a quatro ou cinco anos veremos um aumento, porque vejo mais estudantes
interessadas", prevê.
Para as
duas médicas, o baixo índice de mulheres na área é resultado de fatores como o
preconceito de colegas na faculdade e no mercado de trabalho e a falta de
figuras femininas na área que incentivem outras mulheres. "O que me
facilitou no começo da carreira foi que meu pai era urologista, senão eu nem
teria conseguido emprego. A urologista sofre muito mais preconceito dos colegas
médicos do que de pacientes", afirma Beatriz.
Ela e
Isabel contam que, ao contrário do que muitos imaginam, a clientela das
urologistas é grande. Segundo as médicas, alguns homens até preferem ser
atendidos por profissionais do sexo oposto. "Existe uma parcela de
pacientes do sexo masculino que não quer ser examinada por outro homem,
principalmente no exame de toque, e procura uma profissional mulher", diz
Beatriz.
Isabel
tem a mesma percepção. "Tem homens que não gostariam de ser tocados por
outro homem ou que acreditam que a mulher possa fazer o exame de forma mais
delicada", diz.
Outro extremo.
Se a
Urologia é a especialidade com o maior porcentual de homens, a dermatologia é a
que tem o maior índice de mulheres (77%). "Quando me formei, essa também
era uma especialidade com predomínio de homens. Com o aumento de mulheres
médicas, elas começaram a ser mais presentes em algumas especialidades",
comenta o dermatologista Luiz Guilherme Martins Castro, de 56 anos, do centro
de oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz. Ele afirma que como a mulher
costuma estar mais sobrecarregada com as demais funções cotidianas, como a
maternidade, muitas optam por especialidades consideradas mais tranquilas, sem
muitos plantões e com atendimento majoritário em consultório, como a
Dermatologia.
Não é
só na Dermatologia que a participação das mulheres cresce. Os dados do Cremesp
apontam para a chamada "feminização" da profissão. Dos 123 mil
médicos em atividade no Estado hoje, 55% são homens, mas elas já são maioria
(54%) entre os profissionais de até 35 anos. "Entre os formandos dos
últimos anos, há mais mulheres do que homens. Isso é um fenômeno visto em
outros países também, mas, ao contrário do que acontece lá fora, as médicas
brasileiras têm a mesma jornada de trabalho que os homens, mas ganham
menos", diz Mario Scheffer, professor da Faculdade de Medicina da USP e
coordenador do estudo Demografia Médica no Brasil.
Presidente
do Cremesp, Mauro Aranha afirma que o órgão já estuda normas e resoluções que combatam
a desigualdade de gênero na profissão. "Estamos finalizando uma pesquisa e
vamos chamar um grupo de médicas para ouvir quais são as principais demandas
delas no ambiente de trabalho."
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