FONTE:, Mariana Alvim - @marianaalvim - Da BBC News Brasil em São Paulo, https://noticias.uol.com.br
O mundo está vivendo um
surto preocupante de sarampo, e o Brasil faz parte do grupo dos 10 países que
são os maiores responsáveis por essa guinada de 2017 para 2018.
O alerta vem do Unicef:
segundo a instituição, globalmente, 98 países registraram mais casos da doença
em 2018 do que em 2017. Os 10 países com situação mais crítica são responsáveis
por 74% deste aumento (além do Brasil, são eles: Ucrânia; Filipinas; Iêmen;
Venezuela; Sérvia; Madagascar; Sudão; Tailandia; e França).
O Brasil vinha de uma
sequência de zero casos em 2015, 2016 e 2017 - em 2016, inclusive, ganhou um
certificado da OMS (Organização Mundial da Saúde) de eliminação do sarampo.
Mas,
então, veio 2018: 10.262 casos.
Inversamente
proporcional a este aumento acelerado foi a diminuição da cobertura vacinal da
população. Com base em dados do Programa Nacional de Imunizações (PNI), o
Unicef aponta que, a partir de 2015, caiu a cada ano o percentual da população
imunizada com a tríplice viral (para prevenir o sarampo, a caxumba e rubéola).
O percentual dos brasileiros vacinados com ela saiu de 96% em 2015 para 95,4%
em 2016 e 85,2% em 2017.
A OMS recomenda, em
geral, que imunizações cubram ao menos 95% da população. Portanto, 2017 aparece
abaixo desse limiar.
Motivos
para queda na vacinação.
Piora no acesso da
população à saúde? Avanço de movimentos antivacina? Problemas na divulgação de
campanhas de vacinação? A BBC News Brasil perguntou os motivos para a
diminuição da imunização no país a Cristina Albuquerque, chefe da área de Saúde
e HIV do Unicef no Brasil.
"Essa é uma
pergunta que os brasileiros vão ter que responder. Sabemos que deve ser
multicausal. Temos hipóteses, mas precisamos de evidências", explicou,
destacando que, com exceção da vacina BCG, normalmente aplicada em
recém-nascidos ainda nas maternidades, todas as outras categorias de imunização
têm visto queda no país.
"A questão dos
movimentos antivacina foi algo que se apresentou nos países desenvolvidos.
Aqui, não posso descartar, mas acredito que não seria o principal. (O conjunto
de motivos) Pode passar pelo desfinanciamento do SUS (Sistema Único de Saúde)
em geral, com a crise nos Estados e municípios, já que o PNI em si não foi
desfinanciado. Pode ter a ver também com mudanças sociais, culturais e
econômicas no mundo, como as dificuldades das famílias em imunizarem as
crianças em horário comercial".
"Até o êxito do
nosso programa de imunização, um dos mais reconhecidos do mundo, pode ter dado
segurança demais e levado à diminuição".
Em nota à BBC News
Brasil, o Ministério da Saúde apontou que "o reaparecimento do sarampo no
mundo é um fenômeno global que atinge três (Europa, Ásia e América) das cinco
grandes regiões mundiais de monitoramento da OMS".
A pasta destacou também
que o governo federal incluiu a vacinação e a vigilância como prioridades para
os 100 primeiros dias da gestão, fomentando a intensificação de um bloqueio
vacinal que já havia sido reforçado em fevereiro de 2018, quando o país
reconheceu a "gravidade da situação".
Ainda segundo o
ministério, os casos notificados e confirmados de sarampo no país estão em
curva decrescente, mas estão mantidas ações de investigação e controle.
Crianças
correm mais riscos.
O Unicef destaca
especificamente o risco deste surto para as crianças - em alguns lugares do
mundo, o sarampo é uma das principais causas de mortes entre os mais pequenos.
"O impacto do
sarampo para a criança é maior: elas nascem com a imunidade ainda muito
deficiente, e isso acontece até mais ou menos os 5 anos. Tem a ver com a
maturidade do sistema imunológico", diz Albuquerque.
O sarampo é causado por
um vírus e leva a um quadro infeccioso grave. A doença é muito contagiosa -
mais do que ebola, tuberculose e influenza, por exemplo - e transmitida pela
fala, tosse ou espirro. Seus sintomas incluem febre alta, dor de cabeça,
manchas vermelhas e brancas, tosse, coriza e conjuntivite. Segundo o Ministério
da Saúde, não existe tratamento específico para a doença, mas costumam ser
dados aos pacientes doses de vitamina A, hidratação e suporte nutricional.
Por isso, a vacinação é
tão essencial. Ainda não há dados específicos sobre o número de casos da doença
entre crianças e adultos, mas, para a representante do Unicef, seria
"lógico" assumir que foram os pequenos as maiores vítimas do avanço
da doença no Brasil.
"Se até 2015
estávamos com a cobertura boa, os adultos estavam imunizados. Podemos deduzir
que os novos casos que vieram depois foram, na maioria, em crianças",
explica.
No mundo, conflitos
civis, como no Iêmen, foram um dos motivos por trás do surto - e isto também
bateu à porta do Brasil. O Unicef e o governo brasileiro reconhecem que a crise
na Venezuela motivou o deslocamento de pessoas infectadas, transmitindo a
doença nas áreas brasileiras próximas da fronteira. Segundo o ministério da
Saúde, o quadro é mais grave nos Estados do Amazonas, Roraima e Pará.
Para o Unicef, porém,
se o Brasil tivesse mantido um nível seguro de cobertura vacinal, os efeitos
destes fluxos não seriam um problema.
"A vacina existe,
é barata (para ser produzida) e é de graça (para a população). Tem que
vacinar", resume Cristina Albuquerque.
De acordo com o
Ministério da Saúde, dados preliminares para 2018 mostram que 49% dos
municípios brasileiros não conseguiram atingir a meta de cobertura vacinal de
sarampo: "Os dados são ainda mais preocupantes nos Estados com surto: no
Pará 83,3% dos municípios não atingiram a meta; Roraima foram 73,3% e Amazonas,
a metade, 50%".
A tríplice viral está
disponível na rede pública e pode ser aplicada durante todo o ano.
Todas as pessoas com
idade entre 12 meses e 49 anos devem ser vacinadas - com exceção de gestantes e
aqueles com imunidade afetada. Confira nesta matéria da BBC News Brasil
respostas para outras dúvidas sobre a doença.
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