O amor dos pais para com os filhos por vezes alcança as raias
da sublimidade. Isto é o que bem atestou um professor chinês, emigrado para o
Brasil, ainda em sua juventude.
Quando Wong tinha somente quinze anos, conforme o costume na
China, os pais lhe escolheram a noiva e o casaram. Logo chegou a primeira
filha. E a segunda.
Ainda bebês, as duas meninas foram deixadas com a mãe, pois
que o pai foi estudar em terras distantes. Retornando à China, porque estivesse
em andamento a Segunda GuerraMundial, ele passou a trabalhar para os americanos.
Falando fluentemente o inglês, foi precioso instrumento para
eles, enquanto ele próprio amealhou grande fortuna.
Nesse ínterim, conheceu outra jovem por quem se apaixonou
perdidamente e, desejando consorciar-se com essa, foi pedir à esposa que o
liberasse de seus compromissos.
Naquela época, era suficiente que a esposa assinasse um
documento, concedendo ao marido a liberdade, para que o homem se considerasse
divorciado.
A primeira esposa, ao saber da real paixão do marido,
concedeu-lhe o que ele pedia, ficando responsável pelas duas crianças pequenas
e a mãe dele.
Para sustentar-se e a elas, trabalhou o quanto pôde, sem
jamais dizer qualquer palavra de azedume para a sogra, a quem cuidou até a
morte. Muito menos fez às filhas qualquer referência maldosa a respeito do
marido.
Wong, por sua vez, ao irromper a guerra civil chinesa,
começou a ser perseguido, justamente por seu trabalho com os americanos durante
o conflito mundial.
E, depois de alguns percalços, emigrou para o Brasil, com a
nova esposa e a prole: quatro meninas.
As filhas do primeiro casamento, somente por o terem tido
como pai, embora jamais ele as tivesse assistido durante sua infância,
juventude ou madureza, sofreram muito.
Uma delas, juntamente com o marido, foi presa e exilada para
o norte da China, de onde somente pôde retornar mais de onze anos depois.
A outra teve o marido preso por quatro longos anos. Tudo por
serem parentes do professor fugitivo do país.
O tempo passou. Então, as filhas do segundo casamento
procuraram as meio-irmãs do primeiro e passaram a trocar discreta, mas
constante correspondência.
Rolaram os anos. O pai envelheceu e adoeceu. As notícias
chegaram às duas irmãs na China. Reunindo os recursos disponíveis, ambas vieram
ao Brasil.
Sem falar nenhuma palavra a não ser chinês, elas se
aventuraram até aqui. Vieram ver o velho pai, cujo contato tinham perdido,
desde a meninice e de cujos carinhos jamais puderam lembrar, pois não os
tiveram.
Com o afeto de dedicadas filhas, elas o saudaram. E com ele
ficaram nos meses que antecederam à sua morte, atendendo-o em todas as suas
necessidades.
Na sua fala, demonstravam verdadeira devoção filial. Nada que
pudesse trair mágoa, rancor ou ressentimento.
O pai não as atendera na infância, entretanto, elas vieram
atender o pai, em sua velhice.
Nenhuma diferença no atendimento das filhas que receberam
dele atenção e cuidados durante os anos de sua formação e aquelas que ele
deixara na China, ainda crianças.
O velho Wong recebeu de todas total cuidado, até a sua
desencarnação.
Então, sem esperar por abertura de testamento ou decisão do
espólio, as duas irmãs fizeram as malas, abraçaram as meio-irmãs e retornaram
para sua velha e amada China.
* * *
Atender os pais idosos em suas necessidades é dever dos
filhos.
O amor
filial vai muito além disso. É dar aos pais esses pequenos nadas supérfluos e
cuidados amáveis que lhes alimentam o coração envelhecido.
E se a Lei Divina nos diz que devemos amar o próprio inimigo,
a dedicação de filhos para com os pais deve se estender até mesmo para aqueles
que não cumpriram seus deveres.
Isso, as irmãs chinesas fizeram muito bem.
Redação do Momento
Espírita
"A maior caridade que podemos fazer pela
Doutrina Espírita é a sua divulgação." Chico Xavier – Emmanuel.
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