FONTE: , Bruno Alfano, https://extra.globo.com/
RIO - Está cada vez mais difícil dormir bem no Brasil. De acordo com a Associação Brasileira do Sono (ABS), 73 milhões de brasileiros sofrem de insônia. Isso é quase metade da população adulta no país. E a pandemia só atrapalhou: entre abril e maio, quando começavam as medidas mais rígidas de isolamento, a palavra “insônia” foi a mais procurada no Google.
A psicóloga especialista em sono Laura Castro,
pesquisadora da Unifesp e da Universidade de Harvard, afirma que as pessoas
devem ficar atentas quando têm dificuldade para dormir durante vários dias por
semana.
— O negócio é que as pessoas acumuladas de coisas no dia
a dia, tendem a ir empurrando com a barriga, ou não tem tempo de reorganizar a
rotina, aí recorrem a medicações, que “entre aspas” desligam o cérebro e fazem
dormir... mas as medicações vão perdendo o efeito depois de um tempo — afirma
Castro.
Ao O GLOBO, a especialista em sono fala sobre uso de
remédios, menopausa e o aplicativo que desenvolveu, o Vigilantes do Sono, com
uma série de medidas e mudanças de comportamentos que precisam ser tomadas para
quem tem dificuldade de dormir conseguir resolver os problemas noturnos.
Quando uma pessoa deve
desconfiar de que já precisa de ajuda para tratar a insônia?
A síndrome de insônia que consideramos clinicamente
relevante é aquela que acontece vários dias por semana, que se prolonga por
mais de um mês, e que traz insatisfação e impacto para o funcionamento de modo
geral. Se já está durando há 3 meses, já consideramos uma condição cronificada.
O negócio é que as pessoas acumuladas de coisas no dia a dia, tendem a ir
empurrando com a barriga, ou não tem tempo de reorganizar a rotina, aí recorrem
a medicações, que “desligam o cérebro” e fazem dormir... mas as medicações vão
perdendo o efeito depois de um tempo e aí o problema começa a se agravar mesmo
para muitos casos. São os depoimentos que mais ouvimos. Várias trocas de
medicações, várias tentativas de tratamento iniciadas e uma descrença de que
exista uma solução. O que os estudos científicos nos mostram é que quanto antes
for abordada a insônia melhor, justamente para que ela não vire um círculo
vicioso. E o tratamento de escolha, de primeira linha, é baseado na mudança de
comportamentos e na reestruturação cognitiva, as principais diretrizes médicas
definem que programas como o do Vigilantes do Sono, baseado na terapia cognitivo-comportamental,
são a melhor opção antes de qualquer medicação, mas claro que há casos em que a
medicação é necessária.
Como o Vigilantes do Sono (VS)
ajuda no combate à insônia?
O VS é um programa digital baseado na terapia cognitivo
comportamental, considerada a solução mais efetiva para insônia, pois resolve a
raiz do problema. O que acontece com as pessoas para quem a insônia vira uma
síndrome, é um sistema de retro-alimentação, como num círculo vicioso. Muitos
fatores interagem, como em um motor com várias engrenagens, que uma depende da
outra. Há fatores genéticos que predispõem à mais reatividade ao estresse, há
uma história de aprendizado em relação ao sono, há situações atuais da vida que
tiram o sono, sejam situações muito boas, que trazem ansiedade, como situações
ruins que exigem mais pensamento, que fazem acúmulo de preocupações, além de
outras condições médicas que ameaçam ou limitam a vida e que por isso também
impactam o sono, por exemplo de pessoas que sofrem com dores crônicas, ou quando
recebem um diagnóstico de câncer. O programa do VS resolve o problema porque
ensina as pessoas a entenderem de fato a engrenagem envolvida e fazendo com que
sua insônia persista ou se torne crônica. As peças na engrenagem variam de
pessoa para pessoa, e por isso que o tratamento da insônia é tão difícil,
porque o médico ou profissional de saúde precisa ter experiência clínica para
saber como gerenciar todas as peças da engrenagem, e às vezes mesmo sabendo,
boa parte da solução depende do paciente aprender a engrenagem por si só, e que
aplique as estratégias de forma sistematizada, e é isso que faz o programa do
VS funcionar para quem persiste nele, a sistematização, o passo a passo, a
troca de experiências com outras pessoas que estão passando pelo mesmo problema,
e a possibilidade de ter um médico ou profissional de saúde telemonitorando a
evolução no programa.
Pessoas que dormiam bem e, de
repente, sem motivo aparente em relação a estresse, passam a ter insônia podem
ter algum problema orgânico que justifique o problema?
Sim, problemas orgânicos podem desencadear insônia,
principalmente alterações hormonais, não à toa a insônia é bastante mais
frequente em mulheres do que em homens, pois as mulheres têm variações
hormonais mensalmente, fora a avalanche de flutuações hormonais que vem com a
maternidade e depois com a menopausa. Acontece que para além das oscilações
hormonais biologicamente já esperadas, nossos hábitos modulam muito nosso
controle hormonal. O horário em que fazemos nossas refeições impacta diretamente
a maioria dos hormônios e pode com o tempo ter um efeito sobre a engrenagem que
falei. Não apenas os horários, mas o que comemos também interfere, muda a
população de bactérias que vive em nosso intestino, e todos esses mecanismos de
controle são também ajustados durante o sono.
Quem tem insônia por conta da
menopausa tem solução? Isso passa? É temporário?
Tem solução! Às vezes a solução começa com uma
ressignificação sobre as expectativas em relação ao sono. O sono muda com o
envelhecimento, e é difícil se habituar com a ideia de que aquele sono da
juventude, talvez já não mais existirá, mas há uma série de estratégias e ações
possíveis que amenizam as fases de transição e de mudança do sono ao longo da
vida. O difícil é ter um sistema efetivo e que ajude na escolha do passo a
passo e das melhores estratégias e alternativas em cada caso. O Vigilantes do
Sono nasce com essa missão, de sistematizar estratégias e alternativas de um
modo efetivo, o que tenho chamado de digitalização inteligente do conteúdo
psicoeducativo. O programa entrega pílulas de conhecimento da terapia-cognitivo
comportamental e aprende junto com as pessoas que usam o programa quais
funcionam melhor em cada caso, e então as convida a compartilharem suas
experiências. Na comunidade do Vigilantes, tem já várias trocas de experiências
entre mulheres que estão no climatério, vivenciando o início da transição, e
outra que estão já na pós-menopausa, muitas ainda lidando com o que a menopausa
modificou na vida.
Insones relatam, às vezes, que
quanto mais cansada está, mais dificuldade tem para dormir. Qual a relação? O
cansaço não deveria induzir o sono?
Sim, esse é um comportamento muito fácil de observar em
crianças, quanto mais cansadas, mais agitadas ficam. Quanto mais horas ficamos
em vigília, acordados, mais vão se acumulando resíduos de metabolismo das
células e que precisam ser limpos e descartados durante o sono. Esse acúmulo de
substâncias interfere em níveis hormonais e conforme vamos dormindo pouco, ou
ficando muito tempo em vigília, ou alguns dias se passam em que estamos
dormindo menos do que precisamos, os resíduos vão se acumulando e levando a um
estado de hiperalerta. Tem gente que já tem uma predisposição genética para
entrar no estado de hiperalerta mais rápido... mas em quem tem insônia ou dorme
pouco, esse estado vem com o tempo e é justamente o óleo que acelera a rotação
da engrenagem e do círculo vicioso que falei. Não é rápido para desfazer essa
circuitaria, tirar cada peça, limpar o óleo e ir quebrando o círculo vicioso. O
VS do sono traz justamente uma estrutura e estratégia, dando direcionamento no
manejo da insônia, tanto para usuários finais, num modelo self-help, como para
médicos e profissionais de saúde. Que podem usar a plataforma e o portal do VS
para sistematizar a orientação terapêutica, acompanhando a evolução de seus
pacientes, como também para aprender mais sobre sono e o que funciona.
Quem toma remédios para
ansiedade/insônia durante muitos anos precisa se conformar em ser escrava dos
remédios?
De jeito nenhum! É importante uma avaliação, pois cada
caso é um caso. Tem pessoas que precisam da ajuda de remédios para conseguir
começar um processo de mudança de comportamentos e de reestruturação cognitiva.
Quando você está muito tempo sem dormir direito, é mais difícil de fazer
qualquer coisa, ter disposição para começar alguma coisa é o grande desafio
para muita gente. O remédio pode facilitar e muito esse processo... o negócio é
que na insônia, assim como na ansiedade generalizada, ou mesmo na depressão, se
você só toma remédio, o problema raiz muitas vezes continua lá. Tem gente que
botando o sono e o pensamento em ordem com a ajuda dos remédios, já consegue
resolver outras questões e sanar as causas... mas não é a realidade para a
maioria das pessoas. A maioria das pessoas que sofrem com ansiedade e insônia
precisam de uma terapia que foque em ressignificar cognições sobre o sono e
sobre situações da vida que desencadeiam mais ansiedade ou tristeza. A
revolução digital nos traz um novo cenário em que podemos ampliar grandemente o
acesso das pessoas e essas formas de terapia, como é o caso do VS.
O que fazer quando as dicas de
higiene de sono não funcionam com a pessoa. São casos raros ou as dicas não
funcionam para todos?
As dicas de higiene do sono fazem parte do programa do
VS, por exemplo, mas elas são justamente “dicas”. O que resolve de fato a
insônia não é apenas seguir todas as regras de higiene do sono, ainda que
higienizar a rotina do sono seja fundamental, não é isso apenas que resolve uma
insônia. Eu falei da sistematização, pois é um sistema de rearranjo da rotina e
da relação com a cama que mais tem potencial para resolver a insônia, e é o que
faz a robozinha Sônia do VS. Ela ajuda a decidir o que é melhor, claro que a
partir das peculiaridades de cada um. O VS propõe uma personalização da terapia
e do conteúdo digital, com base na rotina de cada um.
Quais os maiores prejuízos que
a insônia pode causar?
A insônia aumenta a chance de alguém desenvolver
depressão. A insônia prejudica a criatividade e o funcionamento mental. Com o
tempo ficamos mais pessimistas, vemos menos soluções para os problemas e vamos
entrando na circuitaria junto com as alterações biológicas que vão acontecendo:
as alterações hormonais, o aumento da pressão arterial, a redução da capacidade
de controlar os níveis de açúcar no sangue, de produzir anticorpos contra
ataques de vírus e bactérias, etc.
Qual é o limite para aceitar
tomar medicamentos?
Essa é uma pergunta complexa. O limite é individual e
cultural eu diria. Varia a partir da disposição de cada um. Tem pessoas que não
gostam e abominam a ideia de precisar de remédios, tem outras que acham que
tudo bem e tem mais abertura. O cuidado é sempre saber que os remédios têm
limitações, tem efeitos adversos, podem causar dependência física e emocional.
Não se deve tomar remédios sem acompanhamento médico.
A televisão é crucificada na
higiene do sono, mas algumas pessoas só conseguem dormir se ela estiver ligada.
O que fazer?
Para as pessoas que a TV ajuda a dormir, que ótimo, não
há um problema objetivo em usar a TV para dormir. É bom usar o botão soneca,
para ter menos exposição à luminosidade e para economizar na conta de energia
talvez. O problema da TV é para quem tem insônia... quando a TV entra na
engrenagem e vira justamente esse apoio para a mente focar em alguma coisa que
não nos pensamentos. Por isso a reestruturação cognitiva é tão importante. Que
pensamentos são esses que não quero pensar e que preciso da TV para freia-los?
O que fazer? O programa do VS, lá estão sistematizadas todas as orientações, o
passo a passo de como começar a lidar com essa dificuldade tão comum do insone,
parar os pensamentos que atrapalham a entrega para o sono.
Todos dizem que exercício físico
é fundamental, mas como se exercitar sem ter dormido?
começar alguma coisa para quem está na exaustão do não
dormir, é muito difícil. É um processo, um sistema de passo a passo de
estratégias e pequenas mudanças que vão ajudando a organizar o melhor momento
para começar cada coisa. Para isso... o programa do VS pode ajudar e muito!
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