
Burgos vê vantagens em fazer esporte a partir dos 40, até
mesmo em nível de competição. “Eu tinha muito mais estabilidade de cabeça. E o
principal objetivo é desfrutar. Para mim, tanto fazia se os outros atletas me
ultrapassavam. Eu só queria fazer o melhor possível.” Ela esclarece que para
treinar depois dos 40 anos não há nada mais importante que o descanso, já que
essa é a única forma de se recuperar e chegar às competições em um dos dois
picos de atividade física que podem ser alcançados em um ano. Além disso, as
contusões são mais duras nessa faixa etária, por isso é fundamental treinar com
muito controle, conhecendo as próprias limitações.
Sem querer chegar ao nível competitivo de Ana Burgos, a
tendência é prolongar cada vez mais a vida esportiva. Existem diversos motivos.
O doutor Mikel Izquierdo, diretor do departamento de Ciências da Saúde da
Universidade de Navarra, explica: “A prática regular de exercício físico é uma
forma saudável, barata e segura de prevenção e tratamento de muitas das doenças
ligadas ao sedentarismo”. Vários estudos nos últimos 30 anos demonstraram que
os adultos que estão em boas condições físicas ou são fisicamente ativos correm
menor risco, a curto e a médio prazo, de ter uma doença cardiovascular. “Em um
contexto de envelhecimento da população, a prática de exercício físico é a
intervenção mais eficaz”, aponta Izquierdo. Mas, como em tudo, é preciso ter bom
senso. Embora se diga que os 40 são os novos 30, isso não se aplica ao físico.
Em
primeiro lugar, um ‘checkup’.
O médico Ignacio Echeverría, cardiologista do Centro de
Alto Rendimento do Hospital Mesa del Castillo, recomenda que qualquer pessoa
com mais de 40 que vá iniciar uma atividade física se submeta antes a uma
avaliação médica. “É preciso garantir que o coração esteja saudável, já que
exercícios de alta intensidade podem favorecer o surgimento de arritmias ou
anginas de peito. Além disso, se há alguma alteração que passa despercebida,
pode ocorrer, em casos extremos, uma morte súbita.” Embora assinale que esses
casos são pouco frequentes, ele explica que a prevenção inclui a realização de
um eletrocardiograma e de um exame físico completo. Caso sejam detectadas
anomalias, deve ser feito um exame mais profundo.
Escute
seu corpo.
“Pode-se fazer esporte todo dia, embora se aconselhe que
um adulto tenha um ou dois dias de descanso”, afirma o doutor José Calabuig,
diretor do serviço de cardiologia intervencionista e professor de Medicina do
Esporte na Universidade de Navarra. “Mas o problema é a intensidade, o
sofrimento. Quando vemos alguém praticando esporte com o rosto contorcido é
porque essa pessoa não está escutando seu corpo.” Outro ponto-chave é que a
atividade não seja muito exigente. “Em um determinado momento podemos fazer um
exercício intenso, como subir de bicicleta durante 10 minutos um trecho de
montanha, mas forçar mais será contraproducente.” Segundo um estudo recente
publicado na Dinamarca, aqueles que praticam um esporte intenso em idade
avançada podem até ter uma expectativa de vida menor que os sedentários.
Portanto, prudência.
Também é fundamental escutar o coração, já que a partir
dos 40, principalmente nos homens, aumenta o risco de lesões. “Os sinais
básicos de que o coração está passando mal são algum tipo de desconforto no
peito cuja intensidade aumenta com o esforço, uma sensação de fadiga
desproporcional quando uma atividade que podíamos fazer uma semana antes se
torna cansativa, a sensação de perda do conhecimento ou alterações do ritmo
cardíaco”, alerta Echeverría. Em geral, se ao acabar a sessão de treinamento
temos a sensação de que não poderíamos repeti-la, é um sinal de que exigimos
demais do corpo e precisamos reduzir a intensidade.
Aos
poucos e com bom senso.
Para Echeverría, é fundamental saber por onde começar. Se
a pessoa é sedentária, é importante começar de forma gradual, primeiro com uma
intensidade baixa, como caminhar com passos rápidos durante uns 10 minutos,
pelo menos cinco dias por semana. “Com isso, já favorecemos a condição física,
baixamos os níveis de colesterol e podemos controlar melhor os níveis de
glicemia.” Depois, a pessoa pode ir aumentando a intensidade, mas vendo sempre
se a tolera bem, se tem uma sensação agradável.
Calabuig opina que depois dos 40, como meta, pode-se
praticar esporte até quatro ou cinco dias por semana. E nos dá alguma opções,
não cumulativas: “Ou andar de bicicleta por duas horas, ou caminhar por duas
horas, ou correr por uma hora, ou nadar durante 45 minutos”. Ele adverte contra
a tendência atual ao que poderíamos chamar de esporte em excesso – “uma doença,
vamos de um extremo a outro”. E ressalta: “O exercício é saúde, mas com
cabeça”. Para seu colega Echeverría, é uma imprudência que na moda atual de
maratonas, meias-maratonas e outras práticas se permita que todo mundo
participe, sem uma avaliação médica básica.
Exercite
a força.
“A partir dos 20 ou 30 anos, a força diminui de forma
notável. Se não se faz exercício, até os 75 ou 85 anos ela pode diminuir tanto
que a pessoa custará para se levantar da cama ou da poltrona. Por isso é
importante fazer exercícios de força”, explica Izquierdo. Mais um vez, o bom
senso é o mais importante dos sentidos. “Algumas pessoas entram na academia e
levantam 50, 70 quilos, e isso não é conveniente, já que acaba sendo
contraproducente: podemos romper um músculo, além de fazer a pressão arterial
aumentar muito”, avisa Calabuig.
O correto é levantar pouco peso com muita repetição. Um
exemplo: pegar um saco de dois quilos de arroz em casa, levantá-lo com o braço
esticado e repetir esse movimento durante 15 minutos. “Embora pareça um
exercício inútil, com a regularidade podemos conseguir um bíceps e um antebraço
mais musculosos”, comenta Calabuig. Com esses exercícios de força se obtém uma
boa massa muscular que vai envolver as articulações junto com o tecido
cartilaginoso. “Se uma pessoa de 75 anos que exercita a força cai no chão,
quase me atrevo a dizer que ‘bate e volta’”, brinca.
As costas são uma das partes do corpo que mais sofrem. À
medida que vamos completando anos, tendemos a nos curvar para a frente, já que
a musculatura da parte frontal do corpo é mais forte. Embora haja aparelhos nas
academias que permitem fortalecer as costas, também podemos fazer isso em casa.
Calabuig fala de um exercício muito simples, mas eficaz. Consiste em encostar o
corpo o máximo possível à parede, tocando-a com os calcanhares, a parte
posterior do joelho, as nádegas... todas as costas, com os ombros para trás, a
cabeça reta, os braços abertos, os cotovelos e o dorso das mãos também
encostados. “Com apenas cinco minutos por dia, conseguimos o objetivo de
endireitar as costas. E além disso fortalecemos a musculatura dorsal, já que
estiramos músculos que têm tendência a se contrair.” Também se pode fazer esse
exercício no chão, sobre um colchonete.
Acima
de tudo, desfrute.
Quando Ana Burgos parou de competir, não foi por se
sentir mal fisicamente, mas porque deixou de desfrutar a competição. “Foi esse
estresse que fez com que eu me afastasse. Eu não tinha vontade de voltar a
colocar um número nas costas, via a meta cada vez mais longe.” Durante seu
último ano de competições, consultou psicólogos para tentar recuperar a força
mental. Não queria estar ali. Agora, já aposentada, continua treinando. Quatro
ou cinco sessões semanais de corrida. Natação. E também academia. Abandonou a
bicicleta. Agora monta a cavalo. “Anunciei que me aposentava para voltar a
aproveitar”, conclui. É como diz Calabuig: “O mais importante é se divertir com
o esporte, não se matar com ele”.
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