Desde 2008, a
população de ex-fumantes superou a de fumantes no Brasil. Em virtude das
ações de controle do tabagismo, já são mais de 25 milhões de brasileiros que
sentem os benefícios de ter abandonado o cigarro.
A estatística foi apresentada na Pesquisa Especial de Tabagismo – PETab:
relatório Brasil, do Instituto Nacional de Câncer (Inca).
Já segundo a Pesquisa Nacional de Saúde 2013, realizada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e a Fundação Oswaldo Cruz, restam
21 milhões de fumantes no país. Como o profissional de saúde pode contribuir
para que eles passem para o outro lado dessa estatística?
Para se tornar um
aliado no combate ao fumo, o profissional precisa, primeiramente, compreender o
tabagismo como dependência,
uma questão que vai além da escolha.
Os próximos passos são:
1.
Reconhecer o grau de dependência da nicotina e o estado de
saúde do paciente.
2.
Avaliar o nível de motivação para abandonar o cigarro.
3.
Em seguida, definir a abordagem e o tratamento.
É necessário oferecer
ao tabagista uma possibilidade real, concreta a curto prazo e com todo o apoio
necessário para parar de fumar. Ele deve se sentir acolhido, não julgado.
Quando o fumante ainda
não está motivado a abandonar o vício, conhecer os riscos de doenças
relacionadas ao tabaco pode ser um fator estimulante. Metade dos fumantes vão
morrer por alguma doença relacionada ao tabaco, segundo o World Cancer Report
2008, relatório elaborado pela Organização
Mundial da Saúde.
A razão dessa
estimativa é que as substâncias presentes principalmente no cigarro
industrializado (mas também no charuto, cachimbo, rapé, narguilé ou cigarro
eletrônico) estão associadas a mais de 70 enfermidades. Entre elas, infarto,
derrame, tuberculose, diabetes,
catarata, artrite, desordens do sistema imunológico, problemas reprodutivos em
homens e mulheres, além de diversos tipos de câncer.
De acordo com
estatísticas do Inca, 90% dos casos de câncer de pulmão têm origem no
tabagismo. É um dos tipos mais agressivos e com maior letalidade: somente
14% dos homens e 18% das mulheres vivem por mais de cinco anos após o início do
tratamento, segundo dados recentes da Fundação do Câncer. Quanto mais tempo se
é fumante e mais cigarros se consome, maiores são os riscos.
Enfrentando
a dependência de frente.
Ainda que decidido a
abandonar o cigarro, o fumante vai esbarrar nos obstáculos da dependência
física e psicológica e do condicionamento. Para determinar a intensidade do
problema, o método mais amplamente utilizado é o Teste de Dependência de
Nicotina de Fagerström, composto de perguntas simples e uma escala de pontuação
que varia de acordo com as alternativas de resposta. O diagnóstico varia de
dependência “muito baixa” a “muito elevada”. Esse resultado é enriquecido pelo
histórico do indivíduo, como a idade em que começou a fumar, se há outros
tabagistas na família e se já tentou largar o cigarro anteriormente.
A dependência física é
causada pela nicotina, que atua diretamente no cérebro. Os efeitos sobre os
sistemas dopaminérgicos, responsáveis pela sensação de prazer, são semelhantes
aos de drogas como heroína e cocaína.
A falta da nicotina
provoca a síndrome da abstinência, cujos sintomas refletem, na verdade, o
ajuste do organismo à ausência da substância. Ou seja, nada mais do que a
recuperação do corpo para seu estado natural e saudável.
Já a dependência
psicológica está ligada ao espaço que o cigarro ocupa na vida do fumante. É
comum colocá-lo na posição de um amigo, a quem se recorre para lidar com
emoções extremas, criando-se assim um vínculo emocional.
No entanto, o aspecto
mais arraigado e, por isso, talvez o mais difícil de combater seja o
condicionamento. São as questões comportamentais e as conexões que o fumante
estabeleceu entre determinadas tarefas rotineiras, como tomar café ou dirigir,
e o cigarro. Romper esses hábitos é fundamental para manter a abstinência.
De acordo com o Programa Nacional de Controle do Tabagismo do Inca,
a abordagem que demonstrou maior eficácia no tratamento é a
cognitivo-comportamental (ACC). O paciente busca entender a origem do vício,
como ele se estabelece e se desenvolve para, então, reequilibrar as emoções e
aprimorar o comportamento.
O Programa orienta os
profissionais a incorporar, em sua rotina de atendimento, como consultas e
sessões de terapia, uma abordagem breve, mas suficiente para o indivíduo
abandonar o cigarro definitivamente.
O estudo Demografia
Médica no Brasil de 2015, conduzido por pesquisadores da Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo (USP), revela a seguinte estimativa: se metade dos
médicos e enfermeiros do nosso país abordassem um tabagista todos os meses,
eles ajudariam mais de 3 milhões de pessoas por ano a tentar parar de fumar.
Durante a jornada de
abandono do tabagismo, os profissionais de saúde irão confrontar uma série de
crenças, sentimentos complexos e estigmas sociais relacionados ao ato de fumar
e ao cigarro. A desconstrução de preconceitos e a abertura ao aprendizado são
fundamentais para que, juntos, profissional e paciente desenvolvam estratégias
individualizadas para combater o vício e minimizar os efeitos colaterais do
processo.
***Alfredo
Monteiro Scaff é mestre em Saúde Coletiva e
Epidemiologia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Atualmente, é
médico epidemiologista da Fundação do Câncer, sediada no Rio
de Janeiro, organização privada, filantrópica e sem fins lucrativos que, há 26
anos, atua na prevenção e controle do câncer no Brasil.
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