FONTE: Agência
Brasil, CORREIO DA BAHIA.
Um levantamento
feito pelo Instituto Sou da Paz revelou que as vítimas de chacinas são ainda
mais jovens que as de homicídios praticados no estado de forma geral.
Por volta das 23h do dia 18 de abril deste ano, três
pessoas armadas entraram na sede da torcida organizada do Corinthians (Pavilhão
9), na zona oeste da capital, logo após um churrasco. Doze torcedores ainda
estavam no local. Quatro deles conseguiram fugir, mas os demais foram obrigados
a se ajoelhar e a deitar no chão. Todos foram executados. Sete morreram no
local. A oitava vítima chegou a ser socorrida, mas morreu no hospital.
Todas as vítimas dessa chacina tinham entre 19 e 38 anos.
Em entrevista à Agência Brasil, o parente de um dos torcedores assassinados,
que pediu para não ser identificado por medo de retaliação, disse que o jovem
era estudante e trabalhador.
“Não tinha nenhum tipo de vício. A única coisa que ele
gostava de fazer era torcer para um time de futebol”, disse. O jovem
assassinado também não tinha passagem pela polícia. “E mesmo que eles [as
vítimas] não estivessem trabalhando ou que estivessem fazendo bico. A coisa é o
seguinte: por que está desempregado tem que morrer? Por que já passou pela
polícia tem que morrer? E esses 19 que foram mortos lá em Osasco e que nem
passagem tinham?”, questionou.
A maioria das vítimas das chacinas ocorridas em São Paulo
é jovem e mora na periferia, segundo representantes do Conselho Estadual de
Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) e da Defensoria Pública de São
Paulo ouvidos pela Agência Brasil. Na chacina de Carapicuíba, por exemplo,
ocorrida no dia 19 de setembro, três dos quatro mortos tinham menos de 18 anos:
dois deles tinham 16 e um, 17 anos. Já nas chacinas de Osasco e de Barueri, do
dia 13 de agosto, as vítimas tinham entre 15 e 41 anos.
“Existe um estereótipo. Geralmente [as vítimas] são
pobres, de cor negra e jovens. E tem também estereótipo de linguagem e de
comportamento coletivo. Isso tem chamado muito a atenção: a padronização da vítima”,
disse Rildo Marques, presidente do Condepe.
Segundo a defensora pública Daniela Skromov de Albuquerque, as vítimas ou os parentes das vítimas são pessoas “traumatizadas com as ações do Estado”.“São pessoas já massacradas pela vida periférica que levam. E mais massacradas ainda pelo poder letal. É completamente enlouquecedor você passar uma vida ouvindo que a polícia serve para proteger, brinca de polícia e bandido, paga os impostos e, de repente, o imposto que você paga financiou a bala que matou o seu filho. Ou as balas, porque são várias”, disse Daniela.
Segundo a defensora pública Daniela Skromov de Albuquerque, as vítimas ou os parentes das vítimas são pessoas “traumatizadas com as ações do Estado”.“São pessoas já massacradas pela vida periférica que levam. E mais massacradas ainda pelo poder letal. É completamente enlouquecedor você passar uma vida ouvindo que a polícia serve para proteger, brinca de polícia e bandido, paga os impostos e, de repente, o imposto que você paga financiou a bala que matou o seu filho. Ou as balas, porque são várias”, disse Daniela.
Débora Maria da Silva, que perdeu o filho na onda
violenta de maio de 2006 no estado e ajudou a fundar o movimento Mães de Maio,
diz que as vítimas das chacinas ou da violência policial são pessoas como seu
filho: “pobre, preto e periférico”. A questão da pobreza, segundo ela, tem um
grande peso na “seleção” feita pelos executores. “Há brancos dos olhos azuis
assassinados, mas eles não têm um CPF com conta bancária robusta. Matam aqueles
que não tem acesso à Justiça”, disse.
Um levantamento feito pelo Instituto Sou da Paz com base
em dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação junto à Secretaria de
Segurança Pública revelou que as vítimas de chacinas são ainda mais jovens que
as de homicídios praticados no estado de forma geral. “Entre as vítimas em
chacinas temos quase 28% delas na faixa entre 15 e 19 anos e, comparado com
homicídio normal, esse número não chega a 8%”, disse Bruno Langeani,
coordenador do instituto.
Ainda segundo o levantamento, a maioria das vítimas é do
sexo masculino. “Olhando geograficamente, vemos que, infelizmente, grande parte
das chacinas acontece nas periferias da capital e também há uma concentração na
Grande São Paulo”, acrescentou.
O perfil das vítimas já havia sido constatado por um
levantamento feito pela Defensoria Pública em 2012, ano em que foram
registrados numerosos casos de chacinas devido a retaliações entre o Primeiro
Comando da Capital (PCC) e policiais. Entre maio e dezembro daquele ano,
período analisado pela Defensoria com base em matérias publicadas pela
imprensa, ocorreram 610 mortes possivelmente relacionadas com o que eles
chamaram de “onda de violência”. Desse total, 86% das vítimas eram do sexo
masculino e grande parte delas tinha entre 20 e 40 anos de idade.
“É o mesmo perfil das pessoas que são paradas pela
polícia na rua. É um perfil idêntico. É jovem, normalmente mulato, da
periferia, que tem atitudes que determinados policiais consideram como
suspeito. Não necessariamente é”, disse Guaracy Mingardi, ex-subsecretário
nacional de segurança pública e integrante do Fórum Brasileiro de Segurança
Pública.
Para o parente de um dos jovens mortos no Pavilhão 9,
ainda há muito o que esclarecer sobre a chacina na sede da torcida do
Corinthians.
“A polícia até agora não diz os motivos. O que eu acho?
Não tenho o que achar. A única coisa que eu ouvi, que a polícia disse para mim,
é que meu parente estava no local errado na hora errada. Tá, mas quem fez isso?
Por que fizeram isso? Não sei por qual motivo eles fizeram isso. Por que eles
são torcedores? Por que são pobres, pretos? Tem muita coisa nesse inquérito que
não foi dita", desabafou.
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