Inventado na Índia há mais de 400 anos e tradicionalmente
utilizado nos países a leste do Mar Mediterrâneo, o cachimbo de água – mais
conhecido como narguilé – vem se difundindo no Ocidente desde os anos 90,
especialmente entre os jovens. Um dos principais motivos para a popularização é
a crença de que ele é menos prejudicial à saúde do que o cigarro convencional.
Recentemente, porém, especialistas destacaram que além do maior risco de câncer
de pulmão, doenças respiratórias e nas artérias coronárias, comuns a todos os
tipos de tabagismo, o fumo de narguilé pode causar lesões na boca e na
garganta, ocasionando problemas sérios.
Em outubro de 2015, o Journal of the American Dental
Association publicou o artigo "Associação entre o fumo de tabaco em
cachimbos de água e condições de cabeça e pescoço: uma revisão
sistemática", coordenado pela pesquisadora Teja Munshi, da Universidade
Rutgers (EUA). O estudo confirma que o uso de narguilés está associado à maior
incidência de inflamações, periodontite, lesões pré-cancerígenas e câncer de
boca, entre outros problemas. O consumo de tabaco pelo produto também se
relaciona a infecções por Candida ("sapinho"), edema nas cordas
vocais e elevação dos níveis de cromo e níquel no sangue, elementos
carcinogênicos que, a longo prazo, podem provocar distúrbios neurológicos.
Geralmente fumado em grupos nos quais o mesmo cachimbo é
compartilhado por várias mangueiras, o narguilé atrai pelo apelo socializador e
por também queimar tabaco aromatizado. Muitas pessoas julgam o filtro de água
um purificador mais eficiente e creem estar tragando uma fumaça menos nociva.
No entanto, como cada sessão de fumo dura entre 20 e 80 minutos, a Organização
Mundial de Saúde (OMS) afirma que o fumante pode aspirar o equivalente a 100
cigarros durante o período, consumindo até um litro de fumaça por tragada. Além
disso, a água não retém diversos componentes tóxicos do tabaco, nem os metais
produzidos pela queima de carvão.
"Ele tem o benefício de não ter alguns aditivos
químicos [causadores de dependência], mas, em compensação, não tem filtro.
Então acredita-se que uma coisa compense a outra", afirma Carlos Eduardo
Ribeiro da Silva (CROSP 51201), cirurgião bucomaxilofacial e estomatologista do
Instituto do Sorriso de São Paulo (SP). Mesmo o menor risco de dependência em
relação ao cigarro comum pode ser questionado, já que não há regulação do
percentual de nicotina no tabaco utilizado. O periodontista e estomatologista
Luciano Alberto de Castro (CROGO 3323) observa ainda que o assoalho da boca é
uma região muito permeável, e, por isso, os elementos tóxicos do vapor penetram
rapidamente na circulação sanguínea. Não tragar a fumaça – a exemplo do charuto
e do cachimbo convencional – não elimina os malefícios à saúde. "Dentro da
boca, a fumaça age sobre a mucosa oral e pode transformar células saudáveis em
células doentes", explica.
Uso regular pode antecipar o câncer de boca.
Em 2014, um estudo realizado por pesquisadores da
Universidade de Xarja (Emirados Árabes Unidos) e do Ministério da Saúde da
Jordânia observou que, naquele país, os fumantes regulares de narguilé eram
diagnosticados com câncer de boca cinco anos mais cedo do que os fumantes de
cigarro – e cerca de 20 anos antes dos não fumantes. No Brasil, segundo dados
do Instituto Nacional do Câncer (Inca), o câncer de boca está entre os dez
tumores mais comuns tanto em homens quanto em mulheres. As chances de que a
população jovem esteja se predispondo à doença já é uma preocupação do
Ministério da Saúde: de acordo com o órgão, o número de usuários de narguilé no
país saltou de 2,3% em 2008 para 5,5% em 2013, predominando nas regiões Sul e
Sudeste.
O câncer de boca inicialmente se manifesta como uma
ferida esbranquiçada ou avermelhada, que não dói e não cicatriza. "Se a
pessoa têm consciência de que o narguilé pode causar a doença e decide
continuar fumando, ela deve pelo menos fazer o autoexame oral, principalmente
nas laterais da língua", pondera Castro. O hábito é importante porque,
quando a lesão começa a doer, o tumor já está avançado. Ele alerta, ainda, que
o tabagismo prolongado ocasiona problemas nas gengivas e fragiliza o suporte
dentário, podendo levar à perda de dentes.
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