O pai de dois meninos,
um de três e outro de quatro anos, foi condenado a três meses de prisão na
França por alimentá-los com refrigerante. A notícia, repercutida pela AFP nesta
quinta-feira (25), levantou dúvidas sobre os possíveis malefícios do consumo
exagerado da bebida, principalmente por crianças.
No caso dos meninos
franceses, o mais velho teve sete dentes arrancados em consequência do
excesso de açúcar.
O mais novo praticamente não fala. Ambos estão sob os cuidados de
famílias de acolhimento, que iniciaram uma alimentação com carne e verduras.
Apesar de espantoso, o
caso é um espelho exagerado da situação alimentar de muitas crianças
brasileiras, de acordo com Denise Hernandez, nutricionista e presidente do
CRN3 (Conselho Regional de Nutricionistas).
Um estudo realizado
pela Pesquisa Nacional em Saúde e divulgado em 2015 pelo IBGE, por exemplo,
revelou que quase um terço das crianças (32,3%) com menos de dois anos toma
refrigerante ou suco artificial.
E esse é um dos motivos
para o aumento da obesidade infantil, que entre 1975 e 2016 saltou de 0,93%
para 12,7% entre os meninos; e de 1,01% para 9,37% entre as meninas; segundo
pesquisa publicada no periódico The Lancet.
Mas os malefícios das
bebidas açucaradas vão além do ganho de peso e o consumo excessivo do produto
pode trazer outros problemas em longo prazo.
Hipertensão, cirrose e
câncer.
O açúcar em excesso e o
sódio dessas bebidas parecem prejudicar o tônus das veias sanguíneas e
desequilibrar os níveis de sal no organismo, causando alterações na pressão.
Um estudo
conduzido pela Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, e
publicado em 2010 no periódico Circulation revelou que, se os
bebedores assíduos de refrigerante tomassem uma lata a menos ao dia, poderiam
diminuir a pressão sistólica em 1.8 mmHg em 18 meses.
Além disso, assim como
o que ocorreu com o garoto francês, os açúcares e os ácidos presentes na
composição dos refrigerantes podem corroer o esmalte dos dentes, levando à
sensibilidade e podendo ainda causar gengivite e cáries.
A gordura no fígado,
que pode evoluir para cirrose, também está na lista de malefícios.
Isso porque o açúcar ingerido é armazenado pelo fígado e, depois, liberado na
corrente sanguínea em forma de ácidos graxos, que nada mais são do que células
de gordura. Nosso corpo absorve os ácidos graxos em vários órgãos, como o próprio
fígado e os vasos sanguíneos. Tem mais: pesquisas indicam que o consumo
diário destas bebidas pode aumentar em até 20% o risco para infartos.
Sobre o câncer,
a principal ligação é indireta, pois a obesidade, que costuma acompanhar o
consumo frequente das bebidas açucaradas, está associada a pelo menos 13 tipos
de tumores. Mas há também uma relação direta, pois uma das consequências da
ingestão elevada de açúcar é um processo inflamatório constante nas células que
facilitaria o desenvolvimento dos cânceres.
Solução está em casa.
No caso dos irmãos que
eram alimentados quase exclusivamente com refrigerante, confirmou-se que o pai
não sabe ler, escrever ou contar e não percebia a gravidade da situação.
"A França é um dos países que tem menos obesidade. Mas esse senhor não
tinha conhecimento. No Brasil não é diferente. Os pais não sabem que faz mal
e, pela facilidade, dão aos filhos, que amam açúcar", diz Hernandez.
Para contornar o
problema, a nutricionista ressalta que é necessário educar os pais
urgentemente. "Desde que foi lançado o guia alimentar, nosso lema é comer
comida de verdade, priorizar o consumo de frutas, legumes e verduras, sucos de
frutas naturais, sem adição de açúcar." Segundo ela, alimentar-se de
forma saudável é mais fácil do que as pessoas pensam. Mas, para isso, esse
conhecimento deve ser espalhado.
No país, porém, o
consumo de bebidas açucaradas está relacionado não só a uma disparidade de
preços entre alimentos saudáveis (mais caros) e industrializados (mais
baratos), como também por uma questão de status.
"Isso vem da
mídia, que dá a impressão de que consumir esses produtos são como uma afirmação
social. Mas, apesar de serem saborosos, são ricos em conservantes, gordura e
açúcares. As pessoas não têm a real dimensão do quão nocivos eles são."
Não é fácil, mas é
importante falar que essas bebidas fazem muito mal. "Que pai não quer ver
o filho saudável? Uma criança obesa tem dificuldade de caminhar, de fazer
atividade, fora colesterol, triglicérides. Quando você mexe na emoção e
sensibiliza um pai, torna-se mais fácil. Essa conscientização existe, mas
numa camada rica da sociedade. Precisamos universalizá-la", conclui a
nutricionista.
*** Fontes: Denise
de Augustinis Noronha Hernandez, nutricionista e presidente da atual gestão do
Conselho Regional de Nutricionistas da 3ª Região SP-MS.
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