FONTE: Cármen Guaresemin, do UOL, em São Paulo (noticias.uol.com.br).
Uma pessoa toma um
simples comprimido à base de paracetamol para aliviar uma dor de cabeça. Outra
ingere gotinhas de um remédio homeopático antes de dormir. No dia
seguinte, ambas fazem exames laboratoriais e omitem essas informações, por
esquecimento ou mesmo por considerá-las irrelevantes. Quais as chances de os
resultados dos exames, nos dois casos, saírem alterados? Muito altas, segundo
especialistas.
Claudio Pereira,
diretor de análises clínicas do Delboni Auriemo Medicina Diagnóstica, diz que
mais da metade dos equívocos e erros nos resultados acontecem na fase dos
exames.
"Existe, sabida
e seguramente, interferência dos medicamentos nos resultados. Em seu livro
"Effects of Drugs on Clinical Laboratory Tests" [Efeitos das Drogas
em Testes Clínicos de Laboratório, em tradução livre] o médico norte-americano
Donald Young descreve mais de 40 mil exemplos de influência entre medicamentos
e exames laboratoriais", conta.
Pereira também lembra que pessoas que fazem exames costumam ter algum tipo de
enfermidade e, consequentemente, utilizam remédios com mais frequência.
"Outros autores que também estudaram o tema dizem que 12% das pessoas
tomam uma ou mais drogas que podem interferir no resultado."
Celso Granato, assessor médico em Infectologia e Patologia Clínica do Fleury
Medicina e Saúde, afirma que a Associação Americana de Química Clínica pontua
3.500 siglas no quesito efeito de drogas sobre testes laboratoriais químicos.
Ele questiona: "O resultado de um exame para checar como está o colesterol
pode ser influenciado pelo consumo de uma aspirina? Depende da metodologia,
pois existem várias, mas o provável é que sim".
Granato admite que essa preocupação é procedente e cita o exemplo de uma pessoa
que fez um teste de marcador tumoral (substância encontrada no sangue, urina ou
tecidos biológicos que pode estar em quantidade elevada no câncer), e o
resultado estava alterado. "O médico ficou preocupado, pois o tumor
poderia ter voltado. Depois de passarmos um pente fino nas drogas que o
paciente tomava, chegamos ao omeprazol, medicamento usado para gastrite.
Descobrimos que ele altera os resultados. Cavucamos na literatura médica até
descobrir", relata Granato.
Veja algumas das drogas
que mais interferem em exames.
Grupo
de exames
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Exame
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Medicamentos
/ outras drogas
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Hormonais
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FSH e LH
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Corticosteroides
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TSH
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Corticosteroides,
propranolol, amiodarona, metoclopramida, outros
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Prolactina
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Amitriptilina,
metoclopramida, haloperidol, outros
|
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Testosterona
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Diazepam,
digoxina, outros
|
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T4
livre
|
Propranolol,
amiodarona, fenitoína, carbamazepina, outros
|
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Renina
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Furosemida,
nifedipina, outros
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Testes bioquímicos
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Bilirrubinas
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Acetaminofen, amiodarona, carbamazepina, outros
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Glicose
no sangue
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Furosemida,
hidroclorotiazida, metronidazole, outros
|
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Glicose
na urina
|
Vitamina
C
|
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Triglicerídeos
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Propanolol,
bebídas alcoolícas
|
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Fosfatase
alcalina
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Cefalexina,
eritromicina, fenitoína, outros
|
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Potássio
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Captopril,
corticosteroides, furosemida, outros
|
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Fonte:
Delboni Auriemo Medicina Diagnóstica
|
Uso
contínuo.
Marcos Machado, especialista em análises clínicas e diretor do CRF-SP (Conselho
Regional de Farmácia de São Paulo) comenta que algumas medicações de uso
contínuo, tomadas por diabéticos e cardíacos, também podem interferir no
resultado de exames.
"Porém, essas pessoas não podem parar de tomá-los. Então, é importante
informar os nomes dessas drogas quando for atendido antes do exame",
frisa.
Ele também explica que o correto seria, por exemplo, o endocrinologista saber
se seu paciente diabético toma repositor hormonal por causa da tireoide.
Pois um exame de TSH – que mede a quantidade de hormônio estimulante da
tireoide - pode dar um número baixo.
"Um simples ácido acetilsalicílico comprado na farmácia, sem receita, e
tomado na véspera de um exame pode dar diferença no resultado. Um diabético que
tomar um AAS pode ter diminuída sua dose de glicose no sangue e sentir-se mal.
O médico vê o resultado e pensa em mudar a dose", alerta Machado.
AVC e infartos.
Para ilustrar o perigo, Machado dá outro exemplo: quem teve um AVC, trombose ou
infarto precisa tomar remédio para controlar a coagulação durante toda a vida.
Se tomar paracetamol, pode complicar tudo. O médico até avisa que não pode, mas
o paciente esquece.
"Peguei casos de
pacientes que misturaram os medicamentos e, consequentemente, o resultado não
foi bom, mesmo ele tomando a dose de medicação correta. Daí, o médico mudou a
dose. Isso é perigoso, pois pode até fazer com que a pessoa morra",
lembra.
O mesmo vale para alguns antidepressivos e ansiolíticos que podem alterar
resultados hormonais. O médico pode acabar trocando a medicação quando
ela estava correta.
Machado ensina o melhor procedimento no caso de quem toma antibióticos, por
exemplo: "A pessoa com uma infecção urinária toma o remédio por sete dias
e repete o exame dois dias após terminar o tratamento. Está errado. É preciso
um intervalo de dez dias para refazer um exame de cultura."
Celso Granato ainda ressalta que os homens que precisam fazer o exame de PSA,
para saber como está a próstata, não podem andar de bicicleta (inclusive as
fixas, de academia), pois esse movimento fará uma massagem na região e pode
levar a um resultado alterado. "Nas instruções passadas pelos atendentes
no agendamento pode estar a abstinência ao sexo, mas não andar de bicicleta
também é recomendado".
Detalhes.
Todos os entrevistados dão os mesmos conselhos: quando for fazer um exame, leve
uma lista com os nomes, de preferência dos princípios ativos, de todos os
medicamentos que tiver ingerido até três dias antes. Não se esqueça também de
incluir na lista ervas, chás, laxantes, homeopáticos, fitoterápicos,
suplementos vitamínicos e, claro, álcool. Aliás, o correto, é nem ingerir
bebida alcoólica às vésperas da realização de exames.
Além disso, siga todas as recomendações do laboratório e, mais importante,
sempre fale tudo, detalhadamente, para seu médico, pois, por mais
insignificante que uma informação possa parecer, ela pode fazer toda a
diferença no diagnóstico.
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