É só jogar na internet
a palavra "pompoarismo", que surgem matérias e vídeos com tutoriais
sobre essa técnica milenar tailandesa, com a qual mulheres são capazes de
segurar bolinhas com a musculatura vaginal e, se treinarem muito, de expulsar
objetos (e até o pênis do parceiro) com a força entre as pernas.
A prática é associada
ao poder feminino e, como todo mundo quer ser empoderada, é assunto de cursos e
palestras entre mulheres. Geralmente, os movimentos indicados são simples. Os
mais comuns entre as palestrantes são o de "segurar o xixi e o cocô"
ou "agir como se estivesse prendendo um pum".
"Prende
o xixi: contrair e relaxar".
Profissionais da
fisioterapia pélvica, entretanto, acendem um alerta exatamente para a autonomia
da malhação
do assoalho pélvico ensinada por aí. "A mulher pode
fazer muito o 'contrair e soltar' e isso pode fazer com que o tônus muscular da
região aumente. Mas a musculatura precisar ser macia — se não, ela pode até
desencadear episódios de dor no ato sexual", explica a fisioterapeuta
pélvica Júlia Antunes Teixeira.
Cartilhas do
pompoarismo ou resumos do "contrair e relaxar", sem avaliação
individualizada para cada mulher, assim, são uma cilada, explica a professora
adjunta do Departamento de Fisioterapia da Universidade Federal da Bahia (UFBA)
e doutora em Ciências da Saúde, Adriana Saraiva.
"É preciso
personalizar a quantidade de repetições, tempo de relaxamento e tipos de
contrações, além de analisar a evolução das posições para a mulher conforme as
semanas vão passando", pontua.
Por
que pode ser perigoso?
De acordo com as
especialistas, a preocupação não tem a ver com desmerecer a prática do
pompoarismo. Além de ser uma tradição cultural tailandesa, ela pode ser uma via
para a mulher prestar atenção em seu próprio corpo — descobrir
a vagina e a vulva, e entender que a
região genital de cada pessoa pode ser diferente
— o que "já é bom", comenta Adriana.
Outro ponto positivo na
relação "pompoarismo e autonomia corporal": ao longo dos anos, a
atividade deixou de ser incentivada para gerar apenas mais prazer masculino,
por deixar a penetração
mais apertada, e se tornou uma forma de a mulher se
sentir mais livre
com sua sexualidade, ao descobrir (e investir em) suas
vontades.
Acontece que a mulher
que trabalha duro para mexer os músculos vaginais está sob o risco de gerar uma
disfunção no assoalho pélvico; ou seja, a que não tem nenhum problema
intestinal, urinário ou sexual, pode desenvolver ao fazer as repetições
aleatoriamente.
"Pode não
acontecer nada com ela, não sentir nenhuma melhora durante a penetração ou de
saúde. Ou gerar uma tensão muscular. Quando isso acontece, é como um torcicolo.
Trava tudo. Resultado: ela pode ter dor no sexo, constipação, entre outras
consequências", avalia a fisioterapeuta Adriana. Prolapso da bexiga, a
popular bexiga caída, também entra nessa lista.
Quem
passa o treino.
Traduzindo: seguir
ensinamentos do pompoarismo sem avaliação é como ir fazer exercício na academia
sem a ajuda do instrutor e sem conhecer os aparelhos (que, no caso, é o próprio
corpo feminino).
Os fisioterapeutas,
assim, são os responsáveis por passar o treininho, que leva em conta seis
componentes: reflexo, controle, coordenação, força, resistência e tônus. O
profissional também ajuda a mulher a entender como contrair o assoalho pélvico
— tudo isso após uma avaliação da paciente.
"Sem isso, quem
tem incontinência urinária [o que pode ser comum entre mulheres grávidas ou
depois do parto], por exemplo, e não tem consciência da
musculatura, não vai saber ativá-la e fazer o movimento de 'segurar o xixi'
quando ouvir o comando em um vídeo de pompoarismo", comenta Júlia.
Vale saber que, para a
fisioterapia pélvica, a ginástica íntima ou o treinamento dos músculos do
assoalho pélvico — nome formal cravado pelo ginecologista Arnold Kegel, na
década de 40, para a prática — tem uma proposta funcional.
"São levados em
conta a capacidade de contrair a musculatura por um comando recebido pelo cérebro
(reflexo), se a mulher consegue fazer o 'contrair e relaxar' (controle), se faz
isso sem apertar bumbum, perna ou barriga juntos (coordenação), qual é a tensão
do músculo relaxado (tônus), qual é a força dessa contração (a força, medida
por palpação vaginal pelo profissional) e por quanto tempo ela consegue manter
esses movimentos (resistência)", explica Júlia.
"A ginástica
íntima se aplica exatamente como a de os outros músculos. Uma mulher flácida
tem musculatura mole, a [musa fitness] Gracyanne Barbosa tem o tônus do corpo
aumentado, tem mais firmeza", comenta.
Sexual
x funcional.
Júlia explica que isso
não significa que dar "uma apertadinha" enquanto tem penetração
durante a transa possa ser prejudicial à saúde da mulher. "A mulher pode
até fazer esse movimento para impressionar no ato sexual, mas, para são duas
propostas diferentes, o funcional e o sexual. Ela precisa ver se isso vai fazer
bem à saúde da mulher".
Adriana pondera ainda
que a ginástica íntima tem público ainda mais amplo. "Com o treinamento de
Kegel, ele trouxe evidências científicas de que isso melhorava a incontinência
urinária. A fisioterapia se apropriou desse treinamento muscular para tratar
disfunções e não serve só para mulher, para situações como dor na transa e
vaginismo; homens e crianças também podem fazer, para tratar bexiga caída,
incontinência fecal, constipação fecal".
O
que posso fazer sozinha em casa?
Pensar e identificar a
força muscular — sozinha em casa — não é contraindicado. Pode ajudar inclusive
na prevenção de problemas de saúde.
Siga a orientação de
Júlia. "A mulher pode começar a ter consciência corporal dessa forma:
deitada, de forma relaxada, feche os olhos pra se concentrar mais e faça a
força de segurar o xixi e cocô, sem apertar demais. Só para fechar a vagina e
soltar. Assim, você perceba a musculatura toda", explica a fisioterapeuta.
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