A associação entre o
consumo de café e o risco de hipertensão é investigada em pesquisa da Faculdade
de Saúde Pública (FSP) da USP. Com base na análise dos hábitos de consumo da
bebida, dados sociodemográficos, de estilo de vida, exames de sangue e medição
de pressão arterial de um grupo de 8.780 funcionários públicos, o estudo
concluiu que a ingestão moderada de café (uma a três xícaras por dia) pode reduzir
em 20% o risco de hipertensão. Os resultados do estudo são detalhados em artigo da publicação científica “Clinical Nutrition”,
no último dia 7 de junho.
A pesquisa usou dados
do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA Brasil), feito com 15.105
funcionários de seis instituições públicas brasileiras de ensino superior e
pesquisa. “Através de um questionário padronizado foram obtidos dados
sociodemográficos, como idade, sexo, cor da pele, renda familiar per capita,
nível educacional”, relata Andreia Miranda, pós-doutoranda da FSP que realizou
o presente estudo. “Além disso, também foram obtidos dados de estilo de vida,
entre os quais prática de atividade física, hábito de fumar, ingestão de bebida
alcoólica, bem como o histórico médico-familiar, uso de medicação, além de
medição do peso e altura e avaliação do consumo alimentar por meio de um
questionário específico.”
Durante a pesquisa foi
realizada a coleta de sangue para análises bioquímicas e também foi aferida a
pressão arterial dos participantes por um enfermeiro previamente treinado.
“Para o presente estudo, foram excluídos da amostra os indivíduos com
diagnóstico de hipertensão no início da pesquisa, aqueles que apresentavam
histórico prévio de doença cardiovascular (infarto do miocárdio, acidente
vascular cerebral e cirurgia cardíaca), além dos que não tinham informação
sobre o consumo de café”, explica a pesquisadora. “Dessa forma, foram
analisados 8.780 participantes, com seguimento médio de quatro anos.”
Método estatístico.
O consumo de café foi
obtido por meio de um questionário de frequência alimentar, sendo agrupado em
quatro categorias: quem nunca ou quase nunca tomava café, quem bebia menos de
uma xícara por dia, de uma a três xícaras por dia e mais de três xícaras por
dia. “Foi definido que o tamanho das doses de café é de 50 mililitros (50 ml),
o que corresponde a uma xícara pequena”, relata Andreia. “A presença de
hipertensão foi definida com o valor de pressão acima de 140 por 90 milímetros
de mercúrio (mmHg), o uso de medicação anti-hipertensiva ou ambos.”
Para analisar a relação
entre o consumo de café e o risco de hipertensão foi utilizado um método
estatístico, conhecido como regressão de Poisson, que permitiu calcular o risco
relativo e o respectivo intervalo de confiança. “O modelo final foi ajustado de
acordo com outras variáveis descritas na literatura que poderiam influenciar no
resultado, tais como idade, sexo, cor da pele, nível educacional, renda,
tabagismo, consumo de álcool, prática de atividade física, índice de massa
corporal (IMC), consumo de frutas e vegetais, ingestão de sódio, potássio e
gordura saturada, açúcar de adição, uso de suplementos, e níveis séricos de
glicose, colesterol total e triglicerídeos”, aponta a pesquisadora.
“Em estudos prévios, já
é bem documentado que o tabagismo é um fator de risco, fortemente associado com
a ingestão de café e que pode exercer influência no desenvolvimento de doença
cardiovascular, em especial na hipertensão”, prossegue Andreia. “Por esse
motivo, na pesquisa foi avaliado o efeito da interação do café com o
tabagismo.”
Efeito do tabagismo.
A pesquisa apurou que o
consumo médio de café é de 150 ml por dia, o equivalente a três xícaras. “A
maioria dos participantes relatou consumir a bebida com cafeína, filtrada/coada
e com adição de açúcar, o que corresponde ao hábito tradicional de consumo de
café pelos brasileiros. Durante os quatro anos de acompanhamento, um total de
1.285 participantes desenvolveu hipertensão”, destaca Andreia. “Dessa forma,
foi possível observar uma associação significativa inversa entre o consumo
moderado de café e a incidência de hipertensão. Ou seja, comparativamente às
pessoas que nunca ou quase nunca tomavam café, o risco de hipertensão foi
aproximadamente 20% menor naqueles que ingeriam de uma a três xícaras por dia”.
“Estudos recentes mostram que o efeito benéfico do consumo moderado de café é
atribuído aos polifenóis, compostos bioativos que são encontrados em abundância
nessa bebida.”
Como foi verificada uma
interação significativa entre o hábito de fumar e a ingestão de café, novas
análises estatísticas foram realizadas. “Verificou-se então uma diminuição do
risco de hipertensão somente em pessoas que nunca fumaram e tomavam de uma a
três xícaras por dia”, afirma a pesquisadora.
Benefício.
Entre os fumantes e não
fumantes, bem como na maior categoria do consumo de café, ou seja, quem tomava
mais de três xícaras por dia, não se verificou associação significativa no risco
de desenvolver hipertensão. “Esses achados não permitem afirmar que haja um
risco nessa população ou se trata de uma dose prejudicial para a saúde”, diz
Andreia. “Em resumo, os resultados mostram o efeito benéfico da ingestão de uma
a três xícaras de café por dia e a importância de moderar o consumo dessa
bebida para a prevenção da hipertensão.”
A pesquisa teve o apoio
da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e contou com a
colaboração dos professores Alessandra Goulart, Isabela Benseñor e Paulo
Lotufo, do Centro de Pesquisa Clínica e Epidemiológica do Hospital
Universitário (HU) da USP e da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e da
professora Dirce Marchioni, da FSP. Os resultados da pesquisa são apresentados
no artigo “Coffee consumption and risk of hypertension: A prospective analysis
in the cohort study”, publicado no “Clinical Nutrition Journal”.
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