sábado, 19 de outubro de 2013

A CESSÃO DO CRÉDITO – O QUE É? A PRESCRIÇÃO DA DIVIDA COMEÇA A CONTAR NOVAMENTE?...

Por Leonardo Cidreira de Farias ***

Na semana passada comentamos sobre a ilegalidade da cobrança de dívidas prescritas, hoje falaremos sobre uma prática muito comum atualmente que é a cessão de crédito entre as instituições financeiras.

Hoje em dia existem empresas que “compram” os créditos que outras empresas tem, principalmente os que estão próximo de prescreverem, para terem o direito de cobrá-los.

E o que elas ganham com isso? Por estarem próximos da prescrição, elas compram estes títulos por valores abaixo do valor real.

Vejam um exemplo prático: um banco qualquer tem um título de crédito de R$ 10.000 (dez mil reais) vencido em 19/10/2009, contando de hoje, falta um ano para este título prescrever.

Como o banco já contabilizou esse valor como prejuízo em 2009 (ano do vencimento), qualquer valor que ele receber agora em 2013 será contabilizado como lucro, portanto ele cede o crédito (“vende”), digamos, por R$ 4.000,00 (quatro mil reais).

A empresa que “comprou” vai continuar a cobrança do valor original, acrescentar juros, honorários de cobrança e tentar obter o maior lucro possível, pois “pagou” R$ 4.000,00 (quatro mil reais) no título vencido.

Assim vem acontecendo no dia-a-dia, as empresas cedendo crédito de forma completamente ilegal, pois determina o Código Civil:
Art. 290. A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.
E onde está a ilegalidade? Justamente na parte destacada no texto acima. As empresas praticam a cessão de crédito sem antes notificar o devedor. Prática ilegal e abusiva.

A cessão de crédito tem que ser notificada previamente, antes de sua concretização.

O poder Judiciário vem decidindo que a dívida cedida é inexigível (não pode ser cobrada) se não foi previamente notificada, vejam essa decisão do Estado de Santa Catarina:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. "A cessão de crédito não vale em relação ao devedor, senão quando a ele notificada. Precedentes desta turma". (STJ, AGRG no RESP 1171617 / PR. Rel. Min. Nancy andrighi. Julgado em 22/02/2011). Montante devido. (TJ-SC; AC 2009.053587-8; São José; Quinta Câmara de Direito Comercial; Rel. Des. Guilherme Nunes Born; Julg. 13/12/2012; DJSC 08/01/2013; Pág. 204) CC, art. 290 CC, art. 940
Ou seja, se o devedor não for notificado previamente da cessão de crédito, a empresa que “comprou” o crédito não pode cobrá-lo se o fizer pode, inclusive, se caracterizar cobrança abusiva. É assim que entende o Judiciário na Bahia, vejam:
DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO INOMINADO. AÇÃO REPARATÓRIA POR DANOS MORAIS. ALEGAÇÃO DE CONTRATO NÃO CELEBRADO. NEGATIVAÇÃO ABUSIVA. Cessão de crédito entre suposta credora e a acionada, com base no art. 286, do Código Civil. Ausência de notificação prévia do negócio entabulado entre as empresas e de comprovação da origem da dívida. Comercialização de ativos realizada em "bloco", sem identificação pessoal dos consumidores em débito. Inteligência do art. 43, caput, do CDC. Inobservância do princípio da informação e de seus deveres anexos. Princípio da vulnerabilidade do consumidor previsto no art. 4º, I, do CDC. Anulação do débito e indenização por danos morais in re ipsa. Condenação em patamar adequado. (TJ-BA; Rec. 0001011-18.2011.805.0211-1; Segunda Turma Recursal; Relª Juíza Nicia Olga Andrade de Souza Dantas; DJBA 29/03/2012) CC, art. 286 CDC, art. 43
“Traduzindo” essa decisão: um cidadão qualquer (ou cidadã) foi cobrado por uma empresa que “comprou” seu débito de outra empresa, sem antes notificá-lo. Não satisfeito com a cobrança, processou a empresa que comprou seu crédito (a que cedeu, “vendeu” também deve ser processada) e teve o direito de ser indenizado reconhecido, inclusive por danos morais.

Também é preciso destacar que o prazo prescricional da dívida não recomeçará com a cessão de crédito.

Sendo a cessão de crédito feita como determina a Lei, com prévia notificação ao devedor, o prazo prescricional continua sendo o da dívida original, não surge uma nova dívida, não se recomeça a contagem da prescrição.

No exemplo dado no início desse texto, a dívida cedida hoje continua tendo como início de contagem da prescrição (prazo para cobrança da dívida) o dia do vencimento dela (19/10/2009), ou seja, prescreverá em 19/10/2013.

Também é obrigação da empresa que “compra” o débito, avisar previamente o devedor que inserirá seu nome em empresas de proteção ao crédito.

Portanto, se você receber uma “cartinha de cobrança” de alguma empresa com a qual você nunca negociou (geralmente se dão o nome de Fundo de Investimento “alguma coisa”) procure imediatamente um Advogado de sua confiança, o PROCON de sua cidade ou o Juizado Especial do Consumidor para analisar a sua situação.

Na próxima semana falaremos um pouco sobre Direito do Trabalho com o tema “Vale-transporte”. Até lá!

Obrigado por sua atenção, muita paz e um excelente final de semana a todos!

Leonardo Cidreira de Farias é Advogado (OAB/BA 30.452) atua na área de Direito do consumidor, Direito do trabalho e Direito do profissional de saúde.

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*** OBS.: MATÉRIA ENCAMINHADA POR E-MAIL PELO AMIGO E COLABORADOR LÉO FARIAS, A QUEM AGRADEÇO A GENTILEZA E COLABORAÇÃO COM ESTE ESPAÇO.

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