Ainda que todas as mulheres do planeta usassem
corretamente qualquer um dos métodos anticoncepcionais existentes,
cerca de 6 milhões de gestações inesperadas ocorreriam. Essa estimativa da
Organização Mundial da Saúde (OMS) dá uma dimensão da possibilidade de falha
nas estratégias disponíveis para evitar uma gravidez. Sem falar na quantidade
de gente que não pensa em ter filhos e, mesmo assim, não se protege direito
contra uma gravidez indesejada. Cenários como esses ajudam a explicar por que a
chamada pílula do dia seguinte (também conhecida pela sigla PDS) passou a
ser tão procurada nas farmácias - sua venda é feita sem prescrição.
Acontece que, recentemente, uma usuária da PDS escreveu
um relato (que foi
reproduzido em diversos meios de comunicação) no qual conta que teve uma
gravidez fora do útero - chamada de gravidez ectópica - após
tomar o comprimido. E é claro que muitas dúvidas surgiram sobre o método e sua
segurança. Por isso, perguntamos a nossos leitores o que eles gostariam de
saber a respeito do assunto e conversamos com especialistas para esclarecer as
questões - até para entender quais são, de fato, os riscos da pílula do dia
seguinte.
Veja a seguir:
1- Muita gente se refere à pílula do dia
seguinte como uma "bomba de hormônios". Isso é verdade? Ela pode
trazer efeitos colaterais?
"Uma dose da PDS contém o equivalente à metade de
uma cartela de pílulas anticoncepcionais tradicionais, dessas que a mulher usa
todos os dias", esclarece a ginecologista Albertina Duarte Takiuti,
coordenadora do Programa de Saúde do Adolescente da Secretaria de Estado da
Saúde de São Paulo. E, segundo a ginecologista Luciana Potiguara, da Federação
Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, essa enxurrada
hormonal pode trazer efeitos colaterais, sim. "Além de desregular o ciclo
menstrual, é possível que provoque vômitos. Aliás, se isso acontecer nas
primeiras duas horas após a ingestão, a dose deve ser repetida. Outros sintomas
como vertigem, cefaleia e dor nas mamas também podem aparecer", alerta a
médica.
2- Mas, afinal, é válido usar esse
método de contracepção? Se sim, em quais circunstâncias?
"A pílula do dia seguinte é, na verdade, uma
conquista das mulheres", afirma Albertina. "Você ter acesso a um
método de emergência é bacana. O perigo está em fazer dessa emergência um
ritual cotidiano", arremata. A expert ainda faz questão de lembrar que,
mesmo tomando a pílula direitinho (no máximo 72 horas após a relação), ela
ainda falha em 15% dos casos. "A cada 20 mulheres que tomam, três
engravidam", calcula. "A PDS deve ser usada somente em situações de
relação sexual desprotegida próxima do período fértil, de ruptura do
preservativo, de estupro ou de relação sexual sem uso de nenhum método
contraceptivo", completa Luciana.
3- De quanto em quanto tempo é possível
tomá-la?
A pílula é lembrada como aquela "do dia
seguinte", mas, entre os especialistas, ela é mais conhecida como
"pílula de emergência" ou "contracepção de emergência".
Isso quer dizer que ela realmente só deve entrar em cena em um caso de extrema
necessidade. "O ideal é utilizá-la uma vez por ano. Ela é menos segura que
a pílula normal e ingeri-la direto aumenta o risco de gravidez e de confusão no
ciclo menstrual. A mulher passa a não reconhecer o funcionamento do próprio
corpo", esclarece Albertina.
De acordo com uma pesquisa conduzida pela especialista,
apesar desses poréns, tem muita gente abusando do método. "Algumas
adolescentes chegam a tomar a PDS até três vezes no mesmo mês", conta a
médica. Essa prática traz diversas repercussões para a saúde. "Tem os
efeitos psicológicos, como irritação, medo de engravidar, culpa etc. Além
disso, pode bagunçar o ciclo, causar alterações de pele (espinhas), deixar o
cabelo oleoso e contribuir para o acúmulo desnecessário de gordura. A mulher
não precisa passar por isso", conclui.
"A pílula do dia seguinte é uma medicação de
emergência e não foi testada para uso frequente", reforça Eduardo Zlotnik,
ginecologista e obstetra do Hospital Albert Einstein, em São Paulo.
4- É possível que a pílula do dia
seguinte cause (ou contribua para) a ocorrência da gravidez ectópica, ou seja,
fora do útero?
Ao que tudo indica, sim. A explicação para isso é que a
pílula do dia seguinte diminui o movimento natural das trompas. Só que é a
atividade dessa estrutura que faz com que o óvulo fecundado seja enviado ao
útero para se desenvolver. Então, se as trompas não se movimentam, o óvulo pode
ficar parado ali. E é aí que está o perigo. Com o desenvolvimento do feto no
lugar errado, as trompas podem se romper, causando uma hemorragia.
Note que estamos falando em óvulo fecundado. Ou seja, é
crucial ter em mente que a pílula do dia seguinte pode falhar - e que isso não
é tão incomum assim. "Depois de usá-la, é importante esperar pela
menstruação, e também vale fazer o teste de gravidez. Todo cuidado é
pouco", diz Albertina. Se o teste de gravidez der positivo, só é possível
detectar que o óvulo está fora do lugar por ultrassom.
Vale lembrar, no entanto, que a causa mais comum de
gravidez ectópica é alteração da trompa por infecções e inflamações pélvicas.
5- Se a mulher engravidar mesmo depois
de ter tomado a pílula o bebê pode nascer com alguma sequela?
Se o óvulo conseguir se deslocar para o útero e lá se
desenvolver, a princípio não existe nenhum tipo de prejuízo para a criança. A
ginecologista Luciana reforça: "Não há qualquer evidência científica de
que a contracepção de emergência exerça efeito após a fecundação, resultando em
aborto ou anomalias fetais".
6- Tomar a pílula do dia seguinte
enquanto está usando anticoncepcional comum (supondo que a mulher tome de
maneira bem irregular) pode trazer problemas?
Bom, já sabemos que a pílula do dia seguinte equivale à
meia cartela daquela que se toma todo dia. Então, imagina só o caos que se
instala no organismo de quem toma o anticoncepcional desregradamente e ainda,
vez ou outra, utiliza uma "bomba de hormônios" junto. "Isso é
uma confusão que precisa ser evitada. É uma questão de cautela com seu próprio
corpo. A mulher não precisa dessa bagunça hormonal", aponta Albertina. O
ideal mesmo é encontrar estratégias para não precisar da pílula do dia
seguinte.
7- Há contraindicações em relação ao uso desse
contraceptivo de emergência?
Sim. "Em paciente com histórico ou risco conhecido
de trombose", responde Zlotnik, do Einstein. "Na verdade, todas as
contraindicações para a pílula anticoncepcional servem também para a do dia
seguinte", afirma Albertina. E lembre-se: caso passe mal com o uso do
comprimido, é necessário buscar ajuda médica. "Não se trata de terrorismo.
Mas é fundamental ser cuidadosa quando se recorre a esse o método",
conclui a especialista.
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