FONTE: Yannik D´Elboux, Colaboração para o UOL, no Rio de Janeiro (http://estilo.uol.com.br).
O sangue menstrual já foi considerado um veneno
poderoso, capaz de murchar flores, enlouquecer os homens e até matar
recém-nascidos. Em alguns locais, como na Índia, muitas mulheres ainda ficam
isoladas durante esse período. Apesar de ser tratado com mais naturalidade nos
países ocidentais, como no Brasil, o assunto não deixa de ser tabu.
É comum usar sacos de papel para esconder os
absorventes comprados na farmácia. Além disso, a menstruação costuma ser uma
conversa reservada apenas às mulheres e que ainda causa nojo em alguns homens.
A ideia de imundície ligada a esse período do
ciclo feminino vem de longa data. “O sangue menstrual sempre esteve presente no
imaginário popular como sujo e perigoso”, explica a historiadora Mary Del
Priore, autora do livro “Histórias e Conversas de Mulher” (Editora Planeta).
Ela cita o exemplo das judias ortodoxas que se purificavam após as regras e as
proposições de Santa Hildegarda, que considerava a menstruação como um castigo
em razão do pecado original.
Séculos atrás, segundo a historiadora, era forte
a crença do poder maléfico da menstruação. Há registro nos processos criminais
do século 18, em São Paulo, do caso de uma mulher, chamada Rita Antonia de
Oliveira, que tentou matar o marido fazendo-o tomar seu sangue menstrual e
vidro moído.
Os médicos também recomendavam às mulheres não
sair de casa durante esse período, além de prescrever laxantes e remédios para
induzir o vômito, a fim de expulsar mais rápido possível o “veneno” mensal. As
menstruadas também não eram bem-vindas na cozinha e, até hoje, há quem acredite
que bolos e maioneses desandam nesses dias.
A menstruação só passou a ser encarada com mais
naturalidade e menos crendices nas últimas décadas, depois da evolução da
indústria dos absorventes e de outros produtos desodorizantes, capazes de reter
melhor o fluxo e eliminar o cheiro do sangue. “Essa é uma transformação muito
recente que vem junto com o processo de desodorização e depilação das partes
íntimas”, fala Mary Del Priore.
Sem
sangue.
Se antes a medicina via a menstruação como um
problema a ser controlado, atualmente é mais comum que os médicos a vejam como
algo corriqueiro e não mais obrigatório. “Há um número cada vez maior de
mulheres que optam por não menstruar”, diz o ginecologista Antonio Paulo
Stockler, do Hospital Universitário Antônio Pedro da UFF (Universidade Federal
Fluminense), também professor auxiliar de Saúde da Mulher da Faculdade de
Medicina da Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro.
Para o médico, pelo menos em seu consultório, o
tema não é mais um grande tabu e a opção em suprimir a menstruação acontece, na
maioria dos casos, para evitar o desconforto físico que algumas mulheres sentem
nesse período. Stockler acredita que não existe problema em parar de menstruar.
“Uma vez que não tem função de limpeza do organismo, a menstruação é um evento
dispensável e suspendê-la é uma prática segura”, afirma.
A ginecologista Carolina Ambrogini, coordenadora
do Projeto Afrodite do Departamento de Ginecologia da Unifesp (Universidade
Federal de São Paulo), também acredita que as mulheres de hoje têm mais
liberdade para falar do assunto. Além disso, com as opções que existem, esse
período do mês deixou de ser um empecilho. “As mulheres não param a vida delas
por causa da menstruação”, fala.
Uso
de coletor.
O uso do coletor menstrual como
alternativa ecológica e econômica aos absorventes tem se popularizado nos
últimos anos. Para quem não conhece, esse é um recipiente de silicone
reutilizável (com duração de cinco a dez anos) na forma de copinho, posicionado
no início do canal vaginal, que coleta o sangue menstrual.
A disseminação desse novo método está fazendo com
que muitas mulheres pensem e discutam mais a respeito desse tema. Para a
universitária Luisa Peixoto, 20, uma das moderadoras do grupo “Coletores
Brasil”, no Facebook, com mais de 40 mil integrantes, o uso do coletor mudou
sua relação com a menstruação. “Não é mais um momento desconfortável, passei a
gostar de todos estágios do meu ciclo. E conheço bem mais o meu próprio corpo”,
conta.
Stockler diz que, com exceção da virgindade, o
coletor não tem contraindicações. O maior obstáculo para a popularização do
método está no modo de usar. “Muitas mulheres preferem evitar a manipulação
genital e não gostam do contato com a menstruação”, explica o ginecologista.
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