O fenômeno se chama
"síndrome látex-fruta" e acontece porque algumas frutas, como mamão,
figo, banana, abacate, kiwi e melão, têm em sua composição proteínas
semelhantes àquelas presentes no látex da Hevea brasiliensis —a famosa
seringueira. "A quimopapaína, por exemplo, encontrada no látex do mamão,
pode provocar essa síndrome. A esse fenômeno chamamos reatividade cruzada. Tem
gente que é alérgica à borracha [látex] e que também tem ou pode desenvolver
alergia ao mamão, ao figo, à banana", explica Gabriela Justamante Händel
Schmitz, que estudou a reatividade cruzada em seu trabalho de doutorado na FCF
(Faculdade de Ciências Farmacêuticas) da USP (Universidade de São Paulo).
De acordo com ela, uma
proteína do látex da seringueira, denominada cisteína protease, tem a sequência
de aminoácidos muito similar à da quimopapaína. "Como elas são similares,
em alguns indivíduos o organismo pode responder com essa reatividade cruzada.
Se sou alérgica à borracha, usada para fazer uma luva, por exemplo, posso ser
ou vir a ser alérgica a mamão —e também ao figo, à banana, ao abacate, ao kiwi,
ao melão. Todos esses frutos têm proteínas similares às encontradas no látex da
Hevea brasiliensis."
A pesquisadora afirma
que as pessoas alérgicas à proteína do látex da Hevea têm IgEs (imunoglobulinas
E) específicas para essa proteína. "Se comem um mamão, que tem uma
proteína similar à proteína da seringueira, a proteína do mamão consegue se
encaixar nas IgEs sintetizadas para a proteína do látex da Hevea, e então o
paciente tem todas as reações alérgicas que teria a artefatos feitos do látex
da seringueira."
Segundo ela, cada vez
se descobrem mais proteínas similares às da seringueira em frutos. "Muitas
crianças têm esse tipo de alergia, e o diagnóstico é difícil. Por isso, estamos
indo atrás de novos alérgenos. Só do mamão há cinco alérgenos descobertos. E
não fazemos ideia de quantos mais podem existir."
A cientista conta que
muitos pacientes brasileiros têm alergia à mandioca e ao látex, há inclusive um
estudo de um grupo do Hospital das Clínicas sobre isso.
O látex encontrado no
mamão (principalmente na casca) contém uma enzima proteolítica chamada papaína,
que tem funções bactericidas, anti-inflamatórias e bacteriostáticas, além de
ser usada em medicamentos para auxiliar a digestão. "A papaína presente no
látex do mamão é um alérgeno bem descrito dessa fruta, chamado Cari p papain.
Porém, quem tem alergia a mamão pode ser alérgico a outras proteínas dele que
ainda não foram descobertas", afirma a pesquisadora.
Ela explica que a
produção de látex é um mecanismo de defesa da planta contra predadores e
situações de estresse. "O látex do mamão, assim como outras substâncias
produzidas por diversas plantas, tem ação biológica. E, em quase todos os
casos, essas substâncias são sintetizadas pela planta para a sua defesa, o que
significa que são tóxicas para os predadores. Assim, em grandes quantidades,
podem ser tóxicas para nós", resume.
Sobre
o FoRC.
Criado em 2013, o FoRC
é um dos Cepids (Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão) apoiados pela Fapesp
(Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). Reúne equipes
multidisciplinares de diferentes instituições de pesquisa do Estado de São
Paulo: USP, Unicamp, Unesp, Ital (Instituto de Tecnologia de Alimentos) e IMT
(Instituto Mauá de Tecnologia). Suas linhas de pesquisa estão estruturadas em
quatro pilares: Sistemas Biológicos em Alimentos; Alimentos, Nutrição e Saúde;
Qualidade e Segurança de Alimentos e Novas Tecnologias e Inovação. Além de
realizar pesquisas e promover a transferência de tecnologias e novos conhecimentos
para a sociedade, o FoRC também realiza atividades de difusão do conhecimento
científico.
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