terça-feira, 9 de julho de 2013

CONTAS, UM RIO QUE AGONZA...

Então me mostrou o rio da água da vida, brilhante como cristal, que sai do trono de Deus e do Cordeiro.
Lendo essa citação bíblica relatada no livro de apocalipse no capitulo 22 versículo 01 a seguir, eu mergulho, em uma saudosa lembrança, do rio que conheci no tempo da minha infância, chamado de rio de contas. Esse majestoso imponente belo e útil rio nasce na chapada diamantina no estado da Bahia, e deságua no oceano no município de Itacaré, também no estado da Bahia. Como também morador da região ribeirinha desse rio, sou testemunha fidedigna da pedra preciosa que já foi ele em tempos passado. Nos meses que antecediam o verão, por volta do mês de outubro em diante, castigado pelo longo período de estiagem que assolava a cabeceira do mesmo, ele tornava-se literalmente seco, ao ponto de ser transponível de um lado para o outro, sem a necessidade de tirar os calçados, era nessa ocasião, que surgia uma das mais belas paisagens desse rio, seus bancos de areia. 

Esses imensos e intermináveis bancos de areia em formas de dunas eram de uma brancura incomparável, constituídos por uma areia riquíssima em partículas brilhante de calcário, que contracenado com o sol escaldante daqueles dias, produzia um brilho azulado, que fascinava até os mais exigentes olhos humanos. Essas dunas, que mais pareciam um manto sagrado, sobre toda extensão do leito do rio, às vezes chegava medir até setenta centímetros de altura, que em muitas vezes até dificultava caminhar sobre elas, pois as pernas do caminhante adentravam sobre elas até a altura dos joelhos.

Nesses períodos de estiagens, é que as suas águas tornavam-se muito mais cristalinas, pura e saborosa, onde os banhos da molecada nos fins da tarde eram verdadeiras festas insubstituíveis. Assolada pela seca do sertão, em toda extensão do leito do rio nesse período, eram necessário a abertura de cacimbas, para obter uma água de boa qualidade, para suprir as necessidades da população ribeirinha, que dependia das águas do rio para sobreviverem, até a chegada de uma nova cheia, aonde junto com as águas viriam também, a promessa de meses de abundante fartura. Por volta do meado de dezembro ao inicio de janeiro, no auge da estiagem, nossa família acostumava assentar-se no alpendre da nossa casa, em noites encaloradas para fugir do calor abafado e ouvir dos presentes, as mais fascinante historias folclóricas. De vez em quando, o meu pai olhando para a imensidão do sertão, em meio à escuridão da noite, murmurava com voz entusiástica e vocabulário rudimentar, dizendo: Não vai custar de ter enchente, e nós já acostumados com aquelas previsões, entendíamos logo, que ele falava baseado nos fortes relâmpagos que clareava o céu na cabeceira do rio, e que embora muito distantes, poderia ser vistos na escuridão da noite.

Os dias passavam, e o leito do rio ficava cada vez mais seco, e quando a situação era quase insuportável pela falta d’água, e que as cacimbas já quase não produziam água, é que os areões se tornavam mais suntuosos e formosos capazes até, de atrair visitantes, para desfrutar de suas maravilhas naturais, onde o lazer saudável e atraente era garantido. Em meio a esse cenário de céu azul e falta d’água, éramos informados pelos tropeiros, que desciam das zonas de monte branco e porto alegre, trazendo no lombo de suas tropas, os produtos produzidos naquelas regiões, como carvão, mel de abelhas, coco licuri, Aves silvestres, ovos de galinha, couro de cabras, porcos, artesanatos de palhas, como chapéus, vassouras e esteiras. 

A notícia de que uma grande cabeça d’água estava a caminho, pois havia chovido muito na cabeceira do rio, confirmando as previsões do nosso pai, produzia uma grande euforia na população ribeirinha, principalmente para as crianças, que como rebanho de bodes sedentos, descia o corredor do rio, para acompanhar a chegada da tão esperada cabeça da d’água, e essa por sua vez por demorar de chegar, por volta e meia nós nos arriscávamos em adentrar no leito do rio para ver se as águas estavam chagando, o que deixava nossas mães enlouquecidas, ais quais eufóricas também se encontravam ali. E com os olhos fixos no rio, leito acima, víamos ela surgir como uma grande serpente que fugia de um predador, assim a aparecia, a tão sonhada e esperada cabeça d’água. Era um espetáculo difícil de não ser observado, como uma grande cobra que fazia caracóis sobre a areia quente do deserto, assim eram as águas produzidas pelas chuvas em forma de enchente. A força da natureza de forma impetuosa chegava inundando todo o leito do rio. 

De cor barrenta, barulhenta e misturada com bagaço, ia carregando impiedosamente tudo que achava pela frente, ao tempo em que recebia os aplausos de todos os seres viventes da terra, existentes naquelas margens, inclusive dos homens, mulheres e crianças. Alguns minutos depois os bancos de areia sumiam de cena, ao passo que o leito do rio tornava-se caudaloso exuberante e assustador, produzindo uma transformação radical naquela paisagem. Em meio aquele fascinante, belo e assustador cenário, vários fenômenos costumeiros começavam acontecer, como por exemplo, a queda dos barrancos, que em muitas vezes arrastava animais e gente, para dentro das águas, os remansos e as maletas com seus ruídos estranhos, principalmente a noite, até pareciam gemidos, o que dava lugar a varias crendices e lendas populares. 

Com o leito do rio todo tomado pelas as águas, surgia um personagem folclórico, lendário e bem conhecido dos ribeirinhos, que eram os canoeiros, que com suas canoas primitivas feitas de grandes troncos de madeiras, enfeitiçavam o olhar dos ribeirinhos ao descerem rio a baixo, e para os nossos olhos aquelas canoas, eram como se fossem grandes embarcações. Tal como os tropeiros, eles também transportavam os seus produtos. Passado a força das cheias com as águas calmas e limpas, entrava em cena outro personagem muito familiar, que eram os pescadores, que com as suas redes de arrasto, tarrafas, cofos, e utensílios de pescaria, pescavam e armavam em lugares fundos do rio os ninhos de peixes, em quanto por vez ou outra, fazia alguma graça para as lavadeiras que  facilmente eram encontradas no leito do rio, lavando seus pratos, lavando suas roupas, tomando banho ou buscando água. Voltando aos ninhos de peixes, esses ninhos, eram uns amontoados de garranchos colocados nos leito do rio, junto às margens, principalmente nos lugares fundos, onde ali por um longo período, eram colocados alimentos, como mandioca, milho e resto de comida, para atrair e cevar os peixes.

Durante os meses de maio a setembro, a polução ribeirinha, retirava do rio os peixes através de anzóis, água de boa qualidade para o gasto, tomavam banho e colhiam os produtos cultivados nas hortas ao longo do leito do rio, ao passo em que simultaneamente a diversão da molecada era garantida, enquanto suas mães lavavam roupas e pratos na abundante água. Os dias passavam as águas baixavam, e chagava a hora de desmanchar os ninhos de peixes. 

A vizinhança ribeirinha se unia em mutirão, de forma primitiva, e entravam rio adentro em volta dos ninhos dos peixes, fazendo verdadeiro barulho, com as pernas os braços cantado, gritando, e batendo nas águas com braços e varas, empurrando os peixes para dentro do ninho, depois cercava o mesmo com redes e tarrafas e retiravam os garranchos das águas, destruindo o referido ninho, tudo isso regado de muitas brincadeiras e diversão, principalmente por parte da criançada que de vez em quando levava uns cascudos dos mais velhos por causa de suas traquinagens, em seguida começava a pescaria, onde os peixes encurralados se tornavam pressas fáceis. A quantidade e variedades de peixes como traíras, piaus, berés, piabas e outros, retirados das águas em clima de festa, traduzia a generosidade desse rio. 

Novamente os meses do ano avançavam, as águas na cabeceira do rio começava minguar, o rio secava, as cacimbas eram novamente cavadas, os areões voltavam aparecer, e a vida continuava, e novamente as esperanças se voltavam para a chegada de outra cabeça d’água.

O progresso chegou, esqueceram o rio, a construção civil consumiu as areias dos areões, poluíram as águas e mataram o rio. Mas ainda é possível fazer um remendo no estrago que o progresso causou nele. Construindo duas avenidas beira rio, de um lado e do outro de suas margens, e criar um espelho d’água. Criando dessa forma uma área de lazer artificial, e melhorando o clima em nossa cidade. Ou nos consolar com a certeza de que na nova Jerusalém, a cidade santa, morada eterna dos lavados e remidos pelo sangue de Jesus, existe outro rio, cujas águas são límpidas e brilhantes como cristal.

OBS.: MATÉRIA ENCAMINHADA POR E-MAIL, PELO AMIGO E COLABORADOR Missionário Edmilson Carvalho ITERC Instituto Teológico Rio das Contas (iterc1@hotmail.com), A QUEM AGRADEÇO A GENTILEZA E COLABORAÇÃO COM ESTE ESPAÇO.

Acesse:  ITERC Instituto Teológico Rio das Contas

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