Após revisar dados de
162 ensaios clínicos, pesquisadores brasileiros concluíram que a melatonina – substância popularmente conhecida
como o hormônio do sono – pode proteger o
coração contra arritmias, doença arterial coronariana, hipertensão e outros
distúrbios cardiovasculares.
As conclusões foram
divulgadas no International Journal of
Molecular Sciences. O trabalho teve apoio da Fapesp e
a participação de cientistas das universidades de São Paulo (USP) e Anhembi
Morumbi.
“A ação do hormônio
sobre a pressão arterial e a frequência
cardíaca se dá tanto nos vasos e no coração,
como em outras estruturas do sistema nervoso central. Estudos mostraram o
efeito da melatonina até mesmo sobre as mitocôndrias das células, estruturas
importantes na regulação do sistema cardiovascular”, diz José Cipolla-Neto,
professor do Instituto
de Ciências Biomédicas da USP e autor principal
do artigo.
Além de dados de pesquisas
clínicas e ensaios experimentais sobre o papel cardioprotetor da melatonina, os
autores apresentam no artigo uma lista de substâncias capazes de imitar a
função do hormônio. A seleção foi feita com auxílio de ferramentas de
inteligência artificial.
“Listamos substâncias
semelhantes à melatonina e verificamos quais têm potencial ação no sistema
cardiovascular. De um conjunto imenso de moléculas, encontramos 780 com ação
cardiovascular supostamente semelhante à da melatonina”, afirma Cipolla-Neto.
De acordo com o pesquisador, os dados estão abertos e podem guiar o
desenvolvimento de novas drogas para doenças que atingem o coração e os vasos
sanguíneos.
Atuação
do hormônio do sono no diabetes.
Recentemente,
Cipolla-Neto publicou um artigo sobre a ação do hormônio do sono em distúrbios metabólicos.
“Havia uma concepção errada de que a melatonina, em humanos, pudesse ser
diabetogênica”, diz.
De acordo com o
pesquisador, a melatonina tem efeitos distintos no período noturno e no diurno:
“À noite, quando é fisiologicamente secretado, o hormônio de fato reduz a
produção de insulina e induz resistência insulínica, porque nessa fase o
indivíduo está dormindo e, portanto, em jejum”. E esses processos estão ligados
ao diabetes tipo 2. “Por outro
lado, a melatonina que é produzida e atua à noite também determina, durante o
dia, um aumento da sensibilidade insulínica e da secreção de insulina pelo
pâncreas”, completa.
Dessa forma,
Cipolla-Neto afirma que, ao tomar melatonina à noite, é esperado que haja uma
melhora no controle glicêmico. “Isso precisava ser esclarecido”, diz.
Prescrição
criteriosa da melatonina.
Assim como outros
hormônios, o do sono pode ser suplementado em situações específicos. Mas a ação
ampla da substância no organismo – seja
na regulação do sono, no sistema cardiovascular ou na
regulação do metabolismo – reforça a necessidade de que a reposição hormonal
seja cuidadosamente calculada.
“Faço questão de dizer
que melatonina não é uma substância inócua, que possa ser tomada ao bel-prazer.
Ela é um hormônio e a sua administração deveria ser rigorosamente controlada”,
informa Cipolla-Neto.
Para o especialista,
primeiro é preciso saber se há mesmo uma necessidade de reposição hormonal. A partir
daí, o ajuste da dose varia para cada indivíduo. E a administração da droga é
noturna: a melatonina não pode estar circulando na corrente sanguínea durante o
dia. De acordo com o pesquisador, também é preciso observar os hábitos de sono
de cada pessoa.
Estudos
clínicos.
O grupo de
pesquisadores pretende iniciar uma pesquisa, em parceria com o Grupo de Apoio ao
Adolescente e à Criança com Câncer (Graac), com pacientes
que por algum motivo não têm a glândula pineal – responsável pela produção de
melatonina.
Em uma primeira fase, o
objetivo do estudo será acompanhar os efeitos terapêuticos da reposição da
substância nesses pacientes sem a glândula pineal. “A ideia é descrever uma
síndrome do paciente sem a glândula pineal do ponto de vista metabólico,
cardiovascular, neurológico e psicológico”, explica Cipolla-Neto. A partir daí,
será possível investigar o potencial da melatonina na prevenção de males
cardíacos, entre outros.
Em paralelo, os
cientistas pretendem avaliar os filhos de mulheres que trabalharam no turno da
noite durante a gestação. “Vamos fazer estudo metabólico e de desenvolvimento
neuropsicomotor dessas crianças”, diz.
Nenhum comentário:
Postar um comentário